Cláudio Oliveira
Repórter
O processo de desertificação avança sobre o
território potiguar que apresenta 95% da sua área em risco, segundo diagnóstico
da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). O fenômeno é
resultado de fatores climáticos e ações humanas, como desmatamento, uso
inadequado do solo e exploração predatória dos recursos naturais, afetando a
produtividade agrícola, a disponibilidade de água e o modo de vida das
comunidades rurais. O Governo do Estado diz que entre as ações de combate ao
problema estão a Política Estadual de Combate e Prevenção à Desertificação e
obras de segurança hídrica, mas que o cenário de mudanças climáticas torna a
situação preocupante e urgente devido à seca.
Um levantamento recente do Boletim Temático
“Desertificação”, divulgado em junho de 2025 pela Sudene, revela que 22
municípios potiguares estão entre os 100 mais afetados no Nordeste, com índices
severos de degradação classificados nos níveis 4 e 5, considerados críticos.
Esses níveis indicam áreas com longos períodos de solo descoberto, baixo teor
de matéria orgânica e queda acentuada da produtividade.
No RN, os maiores percentuais de desertificação
severa estão em Bom Jesus (84,80%), Passa e Fica (83,04%), Vera Cruz (75,08%),
Brejinho (73,44%) e Senador Elói de Souza (72,81%). No fim da lista potiguar
entre os 100 mais atingidos aparece Serra do Mel (46,62%), ainda assim com
quase metade de sua área afetada. A classificação é liderada por Montadas (PB),
com 95,83% de desertificação severa, enquanto Filadélfia (BA) encerra o grupo
com 46,45%.
Segundo a Sudene, a desertificação não significa a
formação de desertos naturais, mas a transformação de áreas produtivas em
paisagens empobrecidas e biologicamente degradadas. Essa é a mesma definição da
Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (UNCCD). No caso do
Rio Grande do Norte, as regiões mais críticas são o Seridó, o Alto Oeste e o
Sertão Central, onde o uso intensivo do solo, o desmatamento e a baixa
cobertura vegetal tornam o ambiente mais vulnerável. “A seca e a escassez
hídrica na região semiárida se tornaram eventos mais extremos, contribuindo
ainda mais para o agravamento das áreas suscetíveis à desertificação”, alerta
Robson Henrique, coordenador de Meio Ambiente e Saneamento da Semarh-RN.
O impacto da desertificação vai além do meio
ambiente. Afeta diretamente a produção agrícola, a pecuária e a segurança
alimentar, reduzindo a renda das famílias e pressionando os recursos hídricos.
“A degradação dos solos e da biodiversidade leva à redução da qualidade de vida
das populações afetadas e ameaça sistemas produtivos tradicionais”, destaca
Robson Henrique.
Com a redução da cobertura vegetal e a erosão do
solo, a fertilidade natural diminui e a capacidade de reter água é
comprometida, o que torna as áreas rurais mais sensíveis à estiagem. Esse
cenário tem levado à perda de produtividade e ao abandono de áreas agrícolas,
gerando êxodo rural e vulnerabilidade social.
A Sudene reforça que a desertificação é um desafio
socioeconômico: “Mais do que um problema ambiental, ela compromete os esforços
de desenvolvimento sustentável em regiões vulneráveis, aprofunda desigualdades
e intensifica a pobreza rural”, diz o Boletim do órgão.
Faern: problema prejudica a produção
rural
O setor agropecuário também sente os efeitos diretos
da desertificação. Segundo o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária
do RN (Faern), José Vieira, a perda de cobertura vegetal e a erosão dos solos
comprometem as pastagens e a alimentação dos rebanhos, especialmente na
pecuária de pequeno porte. “A escassez de água acelera a degradação das áreas
produtivas e coloca em risco sistemas tradicionais de produção. É preciso ação
coordenada para manter a atividade agropecuária viável e sustentável”, afirma.
Ele diz que o Sistema Faern/Senar tem sido
protagonista na adoção de práticas de manejo sustentável. Por meio da
Assistência Técnica e Gerencial (ATeG), a instituição acompanha 5 mil
produtores em 163 municípios, orientando sobre gestão da água, conservação do
solo e produção de forragem. “Em cinco anos, já foram realizadas 150 mil
visitas técnicas presenciais diretamente nas propriedades, garantindo
resultados como maior eficiência no uso dos recursos naturais, redução de
perdas durante a estiagem e mais segurança produtiva para as famílias do
campo”, pontua Vieira.
Além disso, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
(Senar-RN) implanta viveiros de mudas nativas e forrageiras e capacita
produtores para a recuperação de áreas degradadas. “Nosso objetivo é ampliar o
alcance dessas práticas e integrar o setor produtivo às políticas públicas de
combate à desertificação”, acrescenta o presidente.
Ele destaca, no entanto, que a integração entre os
setores ainda é limitada. “Precisamos avançar na articulação com o governo
estadual, municípios e Sudene para garantir que as políticas contemplem as
especificidades do campo. Não há sustentabilidade ambiental sem que as famílias
permaneçam no campo com condições de produzir e gerar renda.”
Governo intensifica ações e cria Fundo
de Desertificação
Diante do avanço da degradação, o Governo do Rio
Grande do Norte informou que vem ampliando as políticas públicas de prevenção e
combate. A Política Estadual de Combate e Prevenção à Desertificação, criada
pela Lei nº 10.154/2017, orienta as ações da Secretaria Estadual de Meio
Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh) e do Conselho Deliberativo de Combate à
Desertificação, o único existente entre os estados do semiárido.
Robson Henrique, coordenador da Semarh, diz que
entre as medidas em curso está a implantação de uma subcoordenadoria de
mudanças climáticas no âmbito da secretaria, em convênio com o Ministério do
Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). Essa estrutura vai atualizar dados
ambientais, realizar monitoramento contínuo e desenvolver capacitações em
manejo sustentável dos recursos naturais.
O Estado também regulamentou neste ano o Fundo
Estadual de Desertificação, o primeiro do Brasil voltado exclusivamente para
financiar projetos de recuperação de áreas degradadas e adaptação às mudanças
climáticas. A meta é captar recursos para financiar ações em parceria com
entidades locais e organizações civis. “Estamos trabalhando para atualizar o
diagnóstico da desertificação e direcionar esforços para as regiões mais
afetadas, articulando políticas de segurança hídrica e apoio à agricultura
familiar”, detalha Robson Henrique.
As ações, segundo a pasta, incluem ainda
investimentos na infraestrutura hídrica, com a conclusão de importantes obras,
como o Complexo Hidrossocial Barragem Oiticica e o Projeto Seridó Norte.
Associada a essa demanda, estão sendo recuperadas 28 barragens em várias
regiões do estado. “Recentemente, também tivemos a conclusão das obras do
Projeto de Integração do São Francisco – PISF no RN, o que proporcionou, neste
ano, a chegada das águas do rio São Francisco pela região Seridó, desaguando no
rio Piranhas na Barragem Oiticica, no município de Jucurutu”, acrescenta o
coordenador.
Apoio técnico
A Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
(Sudene) tem atuado para integrar políticas de mitigação em nível regional. A
autarquia coordena a atualização dos Planos de Ação Estaduais (PAE) de Combate
à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca em dez estados do Nordeste,
incluindo o Rio Grande do Norte.
O coordenador de Desenvolvimento Territorial e Meio
Ambiente da Sudene, Victor Uchôa, defende que o envolvimento de comunidades e
instituições locais é essencial: “A atualização do PAE-RN é estratégica para
transformar diagnósticos em ações efetivas, garantindo que iniciativas como o
Fundo Estadual de Combate à Desertificação tenham continuidade e resultados
duradouros”.
Além da revisão dos planos, a Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) vem apoiando projetos que fortalecem a
convivência com o semiárido, como a produção e distribuição de palma forrageira
resistente à cochonilha e o estímulo à caprinovinocultura, atividades
essenciais para a economia rural de áreas secas. O combate à desertificação
visa também preservar a produção do interior do estado.
Desertificados
Municípios potiguares entre os 100 com maior percentual de desertificação
severa
- 8º
Bom Jesus (84,80%)
- 10º
Passa e Fica (83,04%)
- 18º
Vera Cruz (75,08%)
- 21º
Brejinho (73,44%)
- 22º
Senador Elói de Souza (72,81%)
- 48º
Lagoa d’Anta (62,86%)
- 54º
Passagem (62,28%)
- 63º
Lagoa Nova (58,20%)
- 66º
Lagoa de Pedras (56,50%)
- 68º
Santo Antônio (56,18%)
- 72º
Pureza (54,67%)
- 74º
Lagoa Salgada (53,65%)
- 75
º Severiano Melo (53,25%)
- 80º
Nova Cruz (51,58%)
- 82º
Pau dos Ferros (50,45%)
- 85º
Monte Alegre (49,88%)
- 88º
José da Penha (49,25%)
- 90º
Januário Cicco (48,80%)
- 92º
Major Sales (48,80%)
- 96º
Macaíba (47,30%)
- 97º
São José do Campestre (47,25%)
- 99º
Serra do Mel (46,62%)

Nenhum comentário:
Postar um comentário