O presidente Jair Bolsonaro rejeitou uma sugestão
dada ontem por um antigo conselheiro, o ex-presidente Michel Temer (MDB). O
emedebista recomendou ao atual chefe do Executivo que revogue o perdão
concedido ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) para evitar crise entre
os Poderes. O conselho foi em vão.
Na quarta-feira, 20, o parlamentar bolsonarista foi
condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a oito anos e nove meses de
prisão por incitar a violência contra ministros da Corte. O placar foi de dez
votos a um pela punição. Os ministros ainda mandaram a Câmara dos Deputados
cassar o mandato de Daniel Silveira.
Na quinta-feira, 21, Bolsonaro publicou o perdão em
decreto em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) no feriado de
Tiradentes. Ouvido pelo presidente em outras ocasiões, Michel Temer, que é
professor de Direito Constitucional, desta vez publicou uma nota com
orientações ao atual mandatário.
"Como a decisão do STF sobre o processo contra
o deputado Daniel Silveira ainda não transitou em julgado (quando se esgotam
todos os recursos), o ideal, para evitar uma crise institucional entre os
Poderes, é que o presidente da República revogue por ora o decreto e aguarde a
conclusão do julgamento", afirmou Temer.
Segundo o ex-presidente, Bolsonaro poderá, depois de
finalizado o processo contra Silveira, optar pela concessão do perdão. De
acordo com ele, a revogação pacificaria as relações institucionais, além de
permitir ambiente de tranquilidade na sociedade. "Neste entretempo poderá
haver diálogo entre os Poderes. O momento pede cautela, diálogo e espírito
público."
Conselhos
Tantas vezes ouvido por Bolsonaro, Temer também teve
decretos de indulto natalino questionados no STF. Em 2018, Bolsonaro criticou o
indulto natalino de Temer. O caso foi parar na Corte, e a decisão de Temer foi
mantida. Bolsonaro indicou, na ocasião, que não assinaria mais nenhum indulto.
Auxiliares do ex-presidente disseram ao Estadão que
ele não foi consultado por Bolsonaro antes da edição do decreto de "graça
constitucional" e que também não conversaram depois. Em redes sociais, o
presidente publicou reportagem sobre a sugestão de Temer. "Não",
escreveu Bolsonaro, que acrescentou um dedo polegar para cima, o sinal de
'joia'.
Em outros episódios de crise com o Judiciário, Temer
auxiliou Bolsonaro na costura de formas para apaziguar os ânimos. Foi o que
ocorreu depois dos discursos de viés autoritário do presidente no Sete de
Setembro, em 2021, quando Temer ajudou na redação de uma carta pública com
pedidos de desculpas e recuo, assinada por Bolsonaro.
Liberdade
À tarde, em Porto Seguro (BA), durante cerimônia de
522 anos da chegada dos portugueses ao Brasil, Bolsonaro afirmou que o perdão
simboliza a "garantia da nossa liberdade". "Ontem (quinta-feira)
foi um dia importante para nosso País. Não pela pessoa que estava em jogo ou
por quem foi protagonista desse episódio, mas o simbolismo de que temos, mais
que o direito, a garantia da nossa liberdade", disse.
No Rio de Janeiro, pela manhã, Bolsonaro não
comentou o caso ao participar de cerimônia do batismo operacional dos aviões
Gripen, integrados à Força Aérea Brasileira, no Dia da Aviação de Caça.
Supremo evita resposta individual
O decreto do presidente Jair Bolsonaro com perdão ao
deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) virou alvo de contestações no Supremo
Tribunal Federal (STF) e no Congresso nesta sexta, 22. Ministros da Corte
discutem internamente como reagir ao desafio imposto pelo decreto.
Um dos integrantes do STF afirmou em conversa
reservada que é o momento de todos no tribunal "observar a cena" e
evitar, por ora, manifestações individuais. Os magistrados dariam uma resposta
institucional única ao julgar o caso.
Rede, Cidadania, PDT e PT ajuizaram ações, enquanto
parlamentares de PSDB, MDB, PSOL, PCdoB, também PT e Rede apresentaram Projetos
de Decreto Legislativo (PDLs) para anular o ato de Bolsonaro. Foram nove PDLs -
três no Senado e seis na Câmara. Na Corte, a ministro Rosa Weber foi sorteada
relatora. Procurada, a Advocacia-Geral da União (AGU) afirmou que não irá se
manifestar por não ter sido notificada.
A Rede, em uma das ações, reconheceu que o
presidente tem o direito constitucional de conceder perdão a um condenado pela
Justiça, mas a prerrogativa, sustenta o partido, não pode ser desvirtuada para
fins pessoais.
Já o PDT pediu a suspensão imediata do ato e
argumentou que Bolsonaro atacou a separação dos Poderes. O partido classificou
o decreto como um "ato eminentemente autoritário".
Poeira
Fonte ligada ao gabinete do presidente do STF,
ministro Luiz Fux, garantiu que a presidência não vai se manifestar
publicamente sobre o caso. A resposta do tribunal deve vir, portanto, nos
autos.
Uma parte dos ministros defende que a Corte não
entre na guerra convocada por Bolsonaro. Esta ala tem dito, em conversas com
Rosa Weber, que o perdão não seja suspenso imediatamente. A ideia é ganhar tempo,
com movimentações processuais protocolares, até deixar a poeira baixar. A
melhor saída, segundo ministros ouvidos, é concentrar a questão na
inelegibilidade de Silveira e analisar o mérito do perdão preferencialmente no
fim do ano - após a eleição.
No Senado, os PDLs para derrubar o decreto
presidencial são de Renan Calheiros (MDB-AL), Fabiano Contarato (PT-ES) e
Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sob o argumento da inconstitucionalidade do ato.
Na Câmara, parlamentares de cinco partidos apresentaram seis projetos
O líder do governo na Casa, deputado Ricardo Barros
(Progressistas-PR), afirmou que o perdão de Bolsonaro foi
"corretíssimo". Ao Estadão, ele disse que o objetivo da oposição é
desgastar o presidente com os eleitores indecisos, "por isso questionam
todas as decisões".
Em uma rede social, o ministro-chefe do Gabinete de
Segurança Institucional da Presidência (GSI), general Augusto Heleno, afirmou
que "a atitude do presidente da República, em relação ao STF, tem por
objetivo principal o respeito à Constituição".
Presidente consulta área jurídica e
militares
O presidente Jair Bolsonaro decidiu conceder perdão
ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) antes mesmo de o Supremo Tribunal Federal
(STF) julgar o parlamentar culpado e condená-lo a 8 anos e 9 meses de prisão. A
decisão acabou tendo apoio de auxiliares mais próximos, incluindo o ex-ministro
da Defesa, general Braga Netto (PL), cotado para ser vice na chapa de
Bolsonaro.
Na terça-feira passada, 19, o presidente disse a
dois interlocutores evangélicos, durante almoço no Alvorada, que enfrentaria o
Supremo por meio do "indulto" individual. Pediu que eles mantivessem
sigilo sobre seu plano.
O presidente tomou a decisão, segundo um desses
aliados, após ser informado de que o ministro André Mendonça não iria mais
pedir vista da ação, como era a expectativa no Planalto e o que postergaria o
julgamento.
O ministro e reverendo presbiteriano, que saiu das
fileiras do governo para compor o STF por iniciativa de Bolsonaro e com forte
apoio religioso, se tornou o principal alvo da militância bolsonarista depois
de votar parcialmente a favor da condenação. O presidente também fora informado
da inclinação dos demais ministros a condenar Silveira por ofensas e ameaças à
democracia e aos integrantes da Corte.
No almoço, Bolsonaro justificou da seguinte forma a
decisão de "entrar na briga" com o Supremo no caso, por entender que
o embate era consigo mesmo: "O Congresso está sem força para reagir",
disse o presidente, segundo relato ouvido pelo Estadão. "Acho que vão
condenar e, em caso de condenação, eu vou dar a graça ao Daniel, porque esse
precedente vai se estender contra a liberdade dos parlamentares", teria
dito Bolsonaro, ainda conforme o relato.
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