Kayllani Lima Silva
RepórterO Rio Grande do Norte deve ampliar
significativamente sua capacidade de geração de energia solar fotovoltaica
centralizada até 2029. Atualmente, o estado possui 1,4 gigawatts (GW) em
operação, distribuído em 55 usinas, segundo a Agência Nacional de Energia
Elétrica (Aneel). Com a entrada em funcionamento de outros 216 empreendimentos
já outorgados, a capacidade instalada pode chegar a 9,3 GW, de acordo com a
Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado (Sedec/RN). Os novos projetos
representam um potencial de aproximadamente R$ 30 bilhões em investimentos no
setor solar potiguar. O avanço, no entanto, exige reforços na infraestrutura de
conexão para garantir viabilidade e manter o interesse dos investidores.
O secretário-adjunto da Sedec-RN, Hugo Fonseca,
esclarece que a energia solar centralizada representa uma das maiores fontes de
investimentos em energias renováveis no Estado, ultrapassando a eólica onshore.
Isso acontece em virtude de fatores como baixo custo de implantação, celeridade
no andamento dos projetos e equipamentos mais baratos, uma vez que o mercado de
paineis solares está cada vez mais competitivo.
Embora a perspectiva seja positiva para os próximos
anos, o secretário explica que o Estado carece de uma infraestrutura adequada
de conexão. Por conta disso, estão sendo discutidas soluções junto ao Governo
Federal com a proposta de ampliar a rede básica e promover uma maior conexão
das empresas com o sistema. “Se não resolvermos o problema dos cortes de
geração de energia, consequentemente os investidores que já têm essas outorgas
garantidas vão ficar receosos em fazer novos investimentos”, afirma Fonseca.
A infraestrutura de transmissão é fundamental para
que a energia gerada em usinas solares centralizadas chegue de forma eficiente
aos centros de consumo. Essa conexão ocorre por meio de uma subestação na
usina, que eleva a tensão da energia convertida para corrente alternada,
permitindo seu transporte por linhas de transmissão até uma subestação da rede
elétrica, onde a energia é distribuída. Todo o processo exige autorização da
Aneel e coordenação com o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que
define o ponto de conexão à rede e garante a segurança e estabilidade do
sistema elétrico nacional.
A expectativa é que no próximo ano nove obras
voltadas ao RN estejam incluídas no leilão que está sendo estruturado pelo
Ministério do Meio Ambiente (MMA), em parceria com a Empresa de Pesquisa
Energética (EPE). Os serviços incluem desde a efetivação de linhas de
transmissão, conectando-se ao sistema Ceará-RN, até um reforço nas linhas de
subestações, com destaque para a de Açu 3, Açu 2 e Mossoró 2. “Temos ainda
gargalos que precisam ser superados e a gente está correndo atrás,
principalmente no tocante à conexão do sistema elétrico”, enfatiza Hugo
Fonseca.
Para que as obras sejam incluídas no leilão, elas
precisam ser validadas pela EPE, MMA e Aneel. “Nas próximas duas semanas,
estamos montando uma agenda junto com o Ministério para tratar dessas obras que
deverão entrar no pacote que será licenciado provavelmente no próximo leilão”,
aponta Hugo Fonseca.
Enquanto isso, o governo tem investido na análise de
dados que são disponibilizados às empresas e no acompanhamento de cada projeto
em curso no Estado. “Inclusive, há seis estações solarimétricas que pertencem
ao estado e que fazem a análise e a coleta de dados de radiação solar,
verificando quais são as áreas que têm melhor disponibilidade para a exploração
de projetos, principalmente centralizados”, destaca Hugo Fonseca.
Dos 216 empreendimentos outorgados para energia
solar centralizada no Rio Grande do Norte, somente 15 estão em construção,
segundo dados da Aneel. O secretário aponta que isso reflete um processo
natural ligado aos prazos de entrada em operação de cada parque solar. Os que
estão em curso, por exemplo, devem começar a gerar energia entre o final deste
ano e o início de 2026. Por conta disso, as obras começam com cerca de um ano
de antecedência, após as empresas conseguirem todas as autorizações necessárias
para instalação.
“Muitos colocaram prazo para 2029 justamente para
[aguardar] que as obras de infraestrutura de transmissão sejam licitadas e
construídas, abrindo margem no sistema elétrico do estado para que possam se
conectar. Se colocarem prazo para entrar em operação antes que as obras sejam
concluídas, podem arcar com multas, pois não vão estar entregando energia no
prazo que assinaram o contrato. Então, por segurança, colocam um prazo maior,
como 2029 e 2030”, completa Hugo.
Licenciamento ambiental é desafio a ser
superado
Além dos desafios ligados à infraestrutura, a
expansão da energia fotovoltaica passa pelos debates sobre o licenciamento
ambiental. De acordo com Tiago Lucena, supervisor do Núcleo de energia do
Idema, o licenciamento ambiental para projetos de energia solar segue um curso
semelhante ao de outros empreendimentos, sendo mais rigoroso para os de energia
centralizada em virtude dos maiores impactos socioambientais.
Ao todo, os projetos de geração centralizada passam
pelo processo de Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação,
podendo levar cerca de um ano para ser licenciado e iniciar sua implantação. Já
a simplificação de procedimentos acontece para projetos fotovoltaicos de micro
e pequeno porte, conforme enquadramento da atividade.
“Quando os projetos estão localizados em áreas sem
restrições ambientais e possuem até 15 MW de potência total, estão dispensados
da apresentação de Estudos Ambientais mais complexos, sendo apenas necessário o
Memorial Descritivo. Para projetos acima desse limite, é obrigatório o
licenciamento prévio, de instalação e de operação”, explica Tiago Lucena.
Para Willman Oliveira, diretor-presidente da Aper, o
licenciamento ainda é desafiador no Rio Grande do Norte e muitas barreiras são
criadas. “Tudo depende exclusivamente de uma autorização ou de uma regulação
mais segura para as empresas, para que os grandes investidores possam dar
continuidade a essa construção e ampliar a rede de energia centralizada”,
afirma.
Já na avaliação de Hugo Fonseca, o licenciamento no
Estado pode ser considerado moderno e a expectativa é melhorar o cenário para
esses investimentos. Atualmente, explica, está sendo discutida uma proposta de
modernização da LC 272/2014, que estabelece a Política Estadual de Meio
Ambiente do Rio Grande do Norte, realizada junto ao Idema e encaminhada para
avaliação do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Conema).
Um dos principais pontos tratados no projeto é a
permanência da sustentabilidade diante do crescimento do tamanho e da potência
instalada pelas usinas. “Inevitavelmente, por ocuparem mais áreas, porque às
vezes tem que desmatar mais, ocupar mais solo, utilizar mais recursos naturais,
o licenciamento tende a buscar cada vez mais critérios para garantir a
sustentabilidade ambiental desses empreendimentos”, sublinha.
O professor Ricardo Ribeiro repercute uma visão
semelhante. Embora a geração solar reduza a emissão de carbono na atmosfera,
ele observa que a instalação dos paineis pode aumentar a temperatura local
devido à falta de circulação de ar sob a estrutura.
“Na Europa, por exemplo, a instalação dessas plantas segue regras de
espaçamento e altura dos paineis fotovoltaicos para permitir a preservação da
vida abaixo e ao redor da planta solar. É comum encontrar plantas solares
intercaladas com culturas agrícolas, conhecidas como Agro PVs”, finaliza o
docente.
Segurança para novos investimentos
O diretor-presidente da Associação Potiguar de
Energias Renováveis (Aper), Williman Souza de Oliveira, reitera a importância
de melhorar a infraestrutura de transmissão no Estado e construir uma
legislação mais segura para fornecer segurança jurídica aos investidores. “Como
vou montar e fazer investimentos em uma usina centralizada se depois podem
mandar desligar energia no final de semana, porque não tem para onde escoar?”,
questiona. Segundo ele, trata-se de um cenário que cria prejuízos para muitas
usinas.
A pergunta leva a um ponto central levantado pelo
professor Ricardo Ribeiro, do Departamento de Energia Elétrica da UFRN, que
avalia ser essencial a adoção de sistemas de armazenamento de energia pelo
Estado junto à Aneel e o MME. Na visão dele, essa infraestrutura, associada à
expansão do sistema de transmissão, impediria o corte de geração demandado pelo
Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) para evitar condições críticas no
sistema elétrico.
“O período de geração mais eficiente ocorre durante
o dia, o que não corresponde ao consumo, gerando, portanto, excedente de
energia elétrica. Esse excedente pode causar oscilações no sistema elétrico e,
em condições críticas, provocar apagões, como o que ocorreu recentemente na
Espanha e Portugal”, complementa.
Conforme observa Hugo Fonseca, o sistema elétrico,
não apenas do Estado, mas também do país, ainda é muito baseado no modelo dos
anos 70 e 80. “Nos últimos 12 anos, tivemos um crescimento absurdo das energias
intermitentes, principalmente a eólica e solar. No entanto, o sistema elétrico
nacional não estava preparado para receber tanta geração intermitente. Então,
com o passar do tempo, começou a ocorrer essa sobrecarga, principalmente no
sistema do Nordeste brasileiro”, comenta.
No caso do Nordeste, o secretário lembra que por
muito tempo a região foi importadora da energia produzida no Sul e Sudeste,
cenário que mudou com a entrada das fontes renováveis. A partir disso, foi
identificada a necessidade de melhorar a infraestrutura de transmissão do país,
um processo que leva no mínimo 10 anos de planejamento. “Isso porque essas
obras, principalmente em grandes leilões, demoram de três a quatro anos para
serem implementadas. São grandes leilões conectando uma região a outra do
país”, completa.
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