Desmistificar a história da lenda da Viúva Machado,
figura conhecida e folclórica da cidade de Natal no
século passado, e desvendar a trajetória real de Amélia Duarte Machado, o nome
por trás dessa fama.
Esse foi o objetivo da escritora Maria Elza
Bezerra Cirne, que lança nesta quinta-feira (26), às 17h, na Pinacoteca, em
Natal, o livro “Viúva Machado – A grandeza de uma mulher”.
"Todo mundo só conhece Dona Amélia
pela Viúva Machado, a parte maldosa da lenda que inventaram contra ela",
contou a escritora.
A viúva Machado se tornou alvo de boatos em Natal
após a morte do marido, ainda na década de 1930. A lenda sobre o nome - que não
é verdadeira - pairou por anos na cidade de Natal e era usada também para
assustar crianças, afirmando que elas seriam alvo de perseguição da viúva.
Para a escritora Maria Elza Cirne, muito dessa
lenda se deu pelo empoderamento de Amélia Duarte Machado enquanto
comerciante após a morte do marido, em um tempo em que o machismo era
ainda mais presente e as mulheres sofriam uma repressão social maior.
"Ele [o marido] faleceu no Rio de Janeiro, que
era a então capital federal. E ela viveu um grande dilema de ter que tomar uma
decisão se ela, como não tinha filhos, seria a protagonista passaria a ser
comerciante - e naquela época nem se falava ainda em empresária, o termo era
comerciante mesmo", contou.
Casal influente na sociedade potiguar
O livro da escritora é resultado de três anos de
pesquisa, que teve como base uma comissão criada para estudar a vida das
mulheres pioneiras no Rio Grande do Norte.
"Eu resgato a história do do casal, porque na
verdade não é só ela, eles construíram juntos esse império comercial e
imobiliário na cidade, porque ele era de uma visão à frente do tempo. Tanto ele
quanto ela", contou.
Maria Elza contou que Amélia Machado exercia "o
papel do feminino daquela época, de ser dona de casa e tentar ser mãe",
mas que não conseguiu ser mãe biológica. Ela teve 14 perdas na maternidade -
foram 11 abortos e três filhos, ainda novos, que morreram.
Segundo a escritora, a Viúva Machado era de origem
humilde, mas, ao lado do marido, construiu um império na cidade e se tornou
relevante na sociedade potiguar, recebendo no palacete em que morava
personalidades importantes.
O marido morreu, segundo a escritora, em um momento
de grande poderio econômico e de influência do casal.
"Aqui eu faço um paralelo no livro sobre quando
as as aviadoras começaram a atravessar o Atlântico e não tinham instrumentos
adequados. Eu fiz um paralelo com a vida de Dona Amélia. Ela teve que tomar
essa decisão. Isso [a morte do marido] foi em 1934", contou.
"Em 1935 o Estado estava em
ebulição política muito forte. Ela foi realmente uma mulher de coragem para
tomar essa decisão de assumir os negócios do marido".
Inspirações e atuação além do comércio
A escritora conta que neste tempo "o papel da
mulher era bem delimitado para ser dona de casa" e Amélia Machado
"foi uma grande dona de casa, dama da sociedade", mas que a atuação
dela como comerciante para a época - em um movimento visto como à frente do
tempo - também foi inspirada em outras protagonistas femininas anteriores.
"Tem passagem que várias protagonistas
femininas estão lá e eu digo que foram inspiradoras para dona Amélia tomar essa
decisão e ela se torna uma grande comerciante dando continuidade aos negócios
do marido, inclusive durante a Segunda Guerra Mundial, que teve Natal como ponto
estratégico", contou.
A escritora Maria Elza contou ainda que Amélia
Machado foi uma benemérita, além da atuação como comerciante.
"Ela doou terrenos para para o Estado - ou
vendido ou foi desapropriado. Foi uma grande doadora para a Igreja Católica,
ajudou muita gente, e depois ela adotou um filho - que ela vai se realizar aí
como mulher, mãe, quando ela é avó. Porque o filho casou, ficou morando com ela
no palacete e ela se torna avó de quatro netos", contou.
Entrelaço da história de Natal com a
Viúva Machado
Para além do conhecimento popular na cidade da lenda
da Viúva Machado, a escritora também reforça que a história da cidade se
entrelaça com a de Amélia Machado e a do marido.
E essa história também está sendo contada em uma
exposição que ocorre na Pinacoteca e que faz parte do lançamento do livro.
"Eu digo que cada espaço de Natal alguém vai
ter alguma relação com eles. Ma exposição, vocês vão poder ver, tem uma maquete
que mostra a cidade e os espaços urbanos que eles ocuparam", contou.
Para a escritora, o livro é "um resgate
histórico não só da vida dela, mas da história da nossa cidade,
contextualizando o Brasil, o mundo, as conquistas femininas do início do
século".
"A vida dela está no livro. Mas é
uma vida não limitada a vida dela. É a nossa história, a nossa memória que está
aqui".
Nenhum comentário:
Postar um comentário