Duas condições são críticas para o funcionamento
pleno das instituições numa República. Primeiro, elas precisam ser
transparentes. Segundo, devem prestar contas regularmente de suas atividades ao
público. Em ambos os quesitos, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem falhado
sistematicamente. É constrangedor que o Supremo tenha levado tanto tempo para
se manifestar sobre as revelações do GLOBO a respeito do caso mais rumoroso que
chegou à Corte nos últimos tempos, as suspeitas de falcatruas envolvendo o
Banco Master. Mais constrangedor ainda é o processo continuar sob sigilo.
No dia 9 deste mês, a colunista Malu Gaspar, do
GLOBO, revelou que o escritório de Viviane de Moraes, mulher do ministro
Alexandre de Moraes, mantinha contrato com o Master pelo qual receberia R$ 3,6
milhões mensais ao longo de três anos para defender os interesses do banco
junto a uma ampla lista de órgãos públicos, como Cade, Receita Federal ou Banco
Central (BC). A revelação causou estranhamento, mas Moraes e o STF mantiveram
silêncio por duas semanas.
Na última segunda-feira, a colunista do GLOBO
noticiou que Moraes manteve contatos telefônicos e uma reunião presencial com o
presidente do BC, Gabriel Galípolo. De acordo com o relato de seis fontes
diferentes ouvidas por ela, Moraes fazia pressão em favor do Master. O BC levou
24 horas para se manifestar a respeito. Em nota de apenas duas linhas,
confirmou que houve reuniões entre Moraes e Galípolo, mas afirmou que o tema
tratado nelas foram os efeitos da Lei Magnitsky (os Estados Unidos impuseram em
julho sanções a Moraes com base nessa lei; a liquidação do Master ocorreu em 18
de novembro).
O STF também levou 24 horas para se manifestar.
Enviou uma nota sumária a jornalistas, que não publicou em seu site,
confirmando reuniões de Moraes com Galípolo para tratar “exclusivamente” dos
efeitos da Magnitsky. Assim como o BC, não informou a data das reuniões. Apenas
quase 35 horas depois que a notícia veio à tona, enviou uma segunda nota,
negando ter havido contatos telefônicos e informando que houve duas reuniões,
em 14 de agosto e 30 de setembro.
A falta de transparência e a demora nas explicações
deixam dúvidas no ar e dão maior gravidade à crise. A situação é ainda mais
nebulosa, pois o ministro Dias Toffoli, relator do caso do Master no STF, pôs o
processo sob nível altíssimo de sigilo. Isso ocorreu, como revelou o colunista
do GLOBO Lauro Jardim, logo depois que Toffoli viajou a Lima no jato de um
empresário para assistir à final da Libertadores, na companhia do advogado de
um diretor do Master. Toffoli alega que não tratou do caso na viagem e que só
foi sorteado relator naquele mesmo dia.
É inaceitável que, diante de tantos fatos
comprometedores, o processo do Master continue sob sigilo. É imperativo que
Toffoli suspenda a medida e que as investigações passem a tramitar com total
transparência. Também urge que o STF adote um código de conduta como o
defendido pelo presidente da Corte, ministro Edson Fachin, de modo a dirimir
todas as situações que gerem conflito de interesse. O objetivo deve ser não só
preservar a imagem, mas a própria missão do Supremo, sobre cuja integridade não
pode pairar nenhuma dúvida. Seria uma medida saneadora para as instituições da
República, que revigoraria a democracia.
Editorial O Globo

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