O procurador-geral da República, Paulo Gonet,
apontou a existência de indícios de envolvimento do ministro da Casa Civil, Rui
Costa, em crimes praticados na compra de respiradores durante sua gestão como
governador da Bahia.
Gonet escreveu que o ex-governador “assinou contrato
com previsão de pagamento antecipado integral e sem garantias ao ente público”.
Por isso, o procurador-geral da República pediu ao ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) Flávio Dino, que envie o inquérito sobre esse caso para a
retomada das investigações no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Procurado, o
gabinete de Dino informou que a petição ainda será analisada.
Procurada, a assessoria de Rui Costa afirmou que a
manifestação de Gonet “não agrega nenhum elemento acusatório” e disse que não
existem fatos que o vinculem a irregularidades no contrato. A assessoria
afirmou ainda que a defesa do ex-governador também opinou que o processo
deveria tramitar no STJ.
“Cabe destacar que a nova peça da PGR não agrega
nenhum elemento acusatório quanto à conduta do então governador da Bahia e que
o próprio Ministério Público já tinha manifestado, em parecer emitido no
decorrer do processo, que não existe nenhum fato que vincule Rui Costa a
qualquer irregularidade na compra dos respiradores”, diz a nota da assessoria
do ministro. Ele também já afirmou anteriormente que determinou a abertura de
investigação da Polícia Civil após os respiradores não terem sido entregues.
Prejuízo de R$ 48 milhões
A manifestação sigilosa da PGR foi enviada no final
de junho ao ministro Flávio Dino. O Estadão teve acesso com exclusividade ao
documento apresentado por Gonet. Trata-se da primeira manifestação do atual
procurador-geral da República no inquérito.
O caso envolve um prejuízo de R$ 48 milhões na
compra de respiradores pulmonares pelo Consórcio Nordeste em 2020, no início da
pandemia da covid-19. Na época, Rui Costa era governador da Bahia e presidente
do consórcio. Ele assinou um contrato com uma empresa sem capacidade técnica e
autorizou o pagamento adiantado, mas os respiradores nunca foram entregues.
A investigação tramitou no STJ quando Rui Costa era
governador, mas foi declinada para a primeira instância da Justiça Federal da
Bahia após o fim do seu mandato na gestão estadual. Mais recentemente, o caso
foi enviado ao STF por causa das mudanças no entendimento do foro privilegiado.
A investigação está parada desde que foi remetida ao
STF, em maio deste ano. Por isso, Gonet solicitou a retomada das apurações. “A
manifestação é pelo declínio de competência do presente inquérito e das
cautelares a ele correlatas para o Superior Tribunal de Justiça, órgão
competente para a continuidade das apurações dos fatos que teriam sido
praticados no exercício do cargo de governador do Estado da Bahia”, escreveu.
Em sua manifestação, Gonet apontou que existem
suspeitas do envolvimento de Rui Costa e outros agentes públicos em crimes
envolvendo essa contratação e citou, entre os delitos investigados, o de
dispensa irregular de licitação.
“As investigações, iniciadas pela Polícia Civil da
Bahia, revelaram indícios de irregularidades na contratação da Hempcare Pharma,
empresa com capital social ínfimo, reduzido número de empregados e sem
experiência no ramo médico/hospitalar, mas que logrou firmar um contrato
milionário com o Consórcio Nordeste”, escreveu.
O procurador-geral da República afirmou que o
inquérito apura a participação de agentes públicos nos crimes investigados,
citando a possível atuação de Rui Costa. De acordo com a manifestação da PGR,
ele “assinou contrato com previsão de pagamento antecipado integral e sem
garantias ao ente público”.
Gonet afirmou ao STF que a nova regra estabelecida
para o foro privilegiado indica que o caso deveria voltar a tramitar no STJ,
porque envolve fatos da época em que Rui Costa era governador da Bahia.
“No presente caso, os fatos investigados ocorreram
durante o período em que Rui Costa exercia o cargo de governador do Estado da
Bahia. A prerrogativa de foro, portanto, está diretamente vinculada ao cargo
ocupado à época dos fatos e à natureza das funções então desempenhadas”,
escreveu.
Prosseguiu o procurador-geral da República: “Ainda
que o investigado Rui Costa atualmente ocupe o cargo de Ministro de Estado, o
novo entendimento firmado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal indica que
a competência para processar e julgar os crimes que lhe são imputados, por
terem sido supostamente praticados no exercício do mandato de governador e em
razão dele, permanece no Superior Tribunal de Justiça”.
Delatora diz que pagou ‘comissão’
O inquérito sobre a compra de respiradores foi aberto
pela Polícia Civil da Bahia em 2020, mas enviado ao STJ depois que surgiram os
primeiros indícios da participação de Rui Costa nos fatos.
Desde então, o caso é investigado pela Polícia
Federal, que já deflagrou duas operações para rastrear o caminho do dinheiro
desviado.
A dona da empresa Hempcare, Cristiana Taddeo, fechou
uma delação premiada e afirmou ter pagado uma “comissão” de R$ 1,6 milhão a um
intermediário do governo da Bahia. Segundo ela, esse intermediário, o
empresário Cleber Isaac Soares, se apresentou como amigo de Rui Costa e da
então primeira-dama Aline Peixoto e disse ter sido o responsável por sugerir a
possibilidade de contratação da Hempcare para fornecimento dos respiradores.
Ela também admitiu não ter os documentos necessários para obter o contrato,
dentre outras irregularidades.
A defesa da empresária não se manifestou. Já a
defesa de Cleber Isaac disse que sua inocência será comprovada no processo. “A
defesa de Cleber Isaac Soares Ferraz informa que confia na Justiça e acredita
que a situação será resolvida em breve. O advogado criminalista Vinícius
Assumpção reitera a convicção de que a inocência de Cleber será comprovada ao
longo do processo. A defesa destaca que Cleber Isaac já depôes na CPI dos
Respiradores da Assembleia do Rio Grande do Norte para esclarecer o assunto e
que está colaborando com a Justiça”, afirmou, em nota.
Leia a íntegra da nota divulgada pela assessoria do
ministro da Casa Civil
“Na manifestação citada, a Procuradoria Geral da
República mostra-se em acordo com a tese apresentada pela defesa de Rui Costa,
na medida em que concorda com a manutenção do processo no Superior Tribunal de
Justiça. Essa continuidade do foro decorre de decisões e de jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal, consolidadas anteriormente a esse caso concreto, e
colabora com a maior celeridade possível para o andamento do processo, como é
desejo manifestado publicamente por Rui Costa e pela sua defesa desde o início.
Cabe destacar que a nova peça da PGR não agrega
nenhum elemento acusatório quanto à conduta do então governador da Bahia e que
o próprio Ministério Público já tinha manifestado, em parecer emitido no
decorrer do processo, que não existe nenhum fato que vincule Rui Costa a
qualquer irregularidade na compra dos respiradores".
Estadão
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