sexta-feira, 11 de julho de 2025

Opinião do Estadão: A nova investida petista no BNDES

 


A nova investida petista no BNDES

Decisão do banco estatal de voltar a comprar participações acionárias em empresas, sob pretexto de incentivar a inovação, lembra política estatólatra malsucedida dos ‘campeões nacionais’

O anúncio de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) voltará ao mercado acionário, investindo diretamente no capital de empresas de variados portes e setores, é capaz de provocar desconfiança até no observador mais ingênuo. Mesmo com o cuidado de destacar que a retomada será dirigida a projetos de inovação e economia verde, o comunicado do banco remete inevitavelmente à época da política das “campeãs nacionais”, de gestões petistas passadas, quando dezenas de bilhões de reais foram aportados em companhias “eleitas” pelo BNDES.

A apreensão aumenta diante da declaração do presidente do banco, Aloizio Mercadante, de que, depois de dez anos sem investimentos em renda variável, “o governo do presidente Lula retoma a missão da BNDESPar de desenvolver o País com o fortalecimento do mercado de capitais”. Fala como se os empréstimos de mais de R$ 440 bilhões do Tesouro Nacional ao banco entre 2008 e 2014 – em parte usados em operações de compra de participações – tivessem produzido um mercado de capitais pujante, o que obviamente não é o caso.

Em 2015, a BNDESPar – subsidiária do banco que administra as participações acionárias da instituição – tinha posição em 125 empresas dos mais diversos setores, como telecomunicações, alimentos, varejo, energia, mineração, siderurgia, logística, tecnologia da informação, enfim, uma infinidade de áreas. A partir de 2016, no governo Michel Temer, o banco passou a adotar outra política, buscando sair de empresas consideradas maduras, que já não precisavam do apoio da instituição.

Hoje, a carteira da BNDESPar reúne participações em 13 companhias listadas em bolsa de valores a um valor total de R$ 78,7 bilhões (março/2025). Detém, ainda, R$ 5,6 bilhões em outras 67 companhias fechadas ou com baixa liquidez. De algumas é sócia há 50 anos, como a Metanor, petroquímica da qual a Petrobras se retirou no ano passado; outras já tiveram falência decretada, como a Mesbla, que passou a atuar como marketplace. Há, ainda, participações consideradas “estratégicas”, como Eletrobras e Petrobras, mesmo que não haja uma noção clara de tal estratégia.

Durante o período em que o BNDES atuou agressivamente no mercado acionário ficaram notórios casos como o da indústria de alimentos JBS, que recebeu do banco R$ 8,1 bilhões em compra de ações. A participação da BNDESPar na empresa chegou a 22,17%, reduzida depois para 20,81% e mais recentemente – cerca de um mês antes do anúncio do restabelecimento da política acionária – para 18,18%. Apesar dos questionamentos que cercaram as operações, o Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que não houve irregularidades. O BNDES, por sua vez, alegou ter obtido retorno significativo com a participação.

E é aí que reside a questão de fundo sobre o papel que cabe ao banco de fomento federal: como instrumento de desenvolvimento, é papel do BNDES incentivar projetos de infraestrutura que contribuam para reduzir custos de produção, logística e transporte no País, o conhecido custo Brasil, que dificulta a competitividade das empresas nacionais. Também é razoável que se dedique a corrigir falhas de mercado que emperrem financiamentos a determinadas iniciativas. No entanto, é difícil encontrar justificativa para fazer do Estado acionista de empresas privadas, a não ser pela visão estatólatra do lulopetismo.

Até o fim do ano, a BNDESPar pretende investir R$ 10 bilhões em ações de empresas, diretamente ou por meio de fundos de participações. É muito dinheiro em curto prazo. E mesmo o banco ressaltando que utilizará recursos de vendas de outras participações e dividendos, não há como desvincular a ação do erário público. Afinal, o único acionista do banco é o Tesouro, o caixa que concentra os recursos pagos pelos contribuintes brasileiros.

Fomentar inovação é função do banco, e para isso existem fundos específicos, como o Criatec. A chamada economia verde está também no foco econômico mundial, e o apoio do BNDES a iniciativas do tipo é justificável. Mas o ingresso na composição acionária de empresas é um caminho no mínimo questionável.

Opinião do Estadão

 

 

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