A
sustentabilidade é uma das principais preocupações da maioria das empresas na
atualidade. Aliar o crescimento dos negócios com boas práticas ambientais é um
desafio, mas no Rio Grande do Norte há bons exemplos dessa prática. A
Cachaçaria Extrema, em Pureza, tem uma produção totalmente orgânica e pretende
aumentar as vendas em 35% em 2025; a VeV Agro, em Ceará-Mirim, adotou práticas
de reuso de água e plantio adensado e viu a produção mais que dobrar. Os
negócios integram a Rota da Sustentabilidade, uma ação do Ecossistema Local de
Inovação do Agronegócio (ELI Agro), fomentado pelo Sebrae-RN para fortalecer e
desenvolver ecossistemas de inovação no setor agropecuário.
A Cachaçaria Extrema, com duas décadas de história,
deu uma guinada depois de 2021 e ampliou a cartela, de quatro para 32 itens
desde então. A atuação é ancorada em três pilares: sustentabilidade, qualidade
e inovação. “Hoje temos cachaça premium, bebida mista, ice, vodca, licor e
gin”, conta Marcos Mindelo, o grande responsável pela ampliação do catálogo,
quatro anos após assumir a propriedade. A aquisição da cachaçaria, fundada em
2004, representou um desafio, dado o cenário de pandemia da época.
“Hoje, a sustentabilidade é encarada com bastante
seriedade. Por isso, os cuidados consistem em não desperdiçar nada durante o
processo de produção, que é orgânico. Tudo ganha uma nova funcionalidade. Há
preocupação com o solo, a água e o controle de pragas”, diz Mindelo. Às
questões de sustentabilidade, somam-se os planos de expansão. Para 2025, a
cachaçaria quer aumentar as vendas em 35%. O foco, por enquanto, é o mercado
potiguar, embora o proprietário admita que existem intenções de exportar.
“Temos uma força muito grande no Rio Grande do Norte, mas ainda há um espaço
enorme para crescer por aqui”, comenta.
“E é claro, nossa ideia é pegar essa força com a
qual somos reconhecidos para alcançar outros mercados, quer sejam nacionais ou
até mesmo internacionais. Temos uma equipe comercial 100% focada nisso, para
que nós possamos ser mais assertivos em todo esse processo”, acrescenta o
proprietário.
Na Ceará-Mirim Agroindustrial, empresa do Grupo
Telles localizada no município de Ceará-Mirim, na Região Metropolitana de
Natal, a preocupação com a sustentabilidade também é uma das principais pautas.
A fábrica é uma das mais modernas usinas do País, altamente mecanizada e
automatizada, com foco na produção de etanol hidratado para comercialização em
diferentes mercados do Nordeste, a partir do processamento da cana-de-açúcar.
Gardênio Dias, gestor da usina, conta que há várias
formas de reaproveitamento do bagaço da cana, que é comprada de pequenos
produtores da região. O reaproveitamento vai desde a comercialização, passando
pela geração de combustível para geração própria de energia e compostagem. “A
gente mistura vinhoto [líquido obtido da destilação do vinho durante o processo
de produção de cachaça], que é um subproduto nosso, com bagaço de cana para
fazer compostagem”, afirma Dias.
A empresa irá fechar a safra atual, que se encerra
nesta semana, com uma produção de 440 mil toneladas de cana-de-açúcar. Para a
próxima safra, que se inicia daqui a seis meses, a expectativa é aumentar a
produção em cerca de 35% e chegar a algo em torno de 600 mil toneladas. A
empesa gera, no período de safra, 500 empregos diretos. A perspectiva de
crescimento se dá em meio a inúmeros desafios para o setor, segundo Dias. “Um
deles é a dificuldade de mão de obra, mas também tem a escassez hídrica,
problema que afeta todo o agro”, pontua o gestor.
Expansão e manejo sustentável
A VeV Agro sabe bem como é importante cuidar dos
recursos hídricos. A empresa, também localizada em Ceará-Mirim, produz coco e
maracujá. Recentemente foram feitos investimentos no reúso de água e, como
consequência, houve redução drástica de desperdício. Além disso, o sistema de
plantio adensado (número maior de plantas em uma mesma área) passou a ser
adotado na empresa para o cultivo do maracujá. “Com essas duas medidas, estamos
produzindo mais com menos”, afirma Eudes Varela, proprietário da VeV Agro.
As práticas bem sucedidas na VeV Agro representam
uma preocupação a menos na hora de expandir. A empresa produz de forma perene
(sem precisar de replantio) uma média de 350 cocos por ano em uma área de 26
hectares (ha). A produção de maracujá, por sua vez, saiu de 15 toneladas por
hectare e passou a oscilar entre 20 e 40 toneladas/ha com o plantio adensado. O
mercado a que se destina a produção da empresa é essencialmente local, uma vez
que a atuação ainda é cercada de desafios. “A insegurança jurídica e as
questões de financiamento são duas grandes dificuldades”, afirma Varela.
Ainda que não executadas diretamente pelas grandes
empresas, as boas práticas ambientais podem surtir efeito relevante se houver
encadeamento com os pequenos negócios. É isso que acontece com a Ceará-Mirim
Agroindustrial, onde parte da cana-de-açúcar é adquirida junto à Cooperativa
dos Plantadores de Cana do Rio Grande do Norte (Cooplacana-RN). Anderson Faheina,
presidente da Cooplacana, explica que toda a produção vendida à usina e a
outras empresas da região é cultivada através de manejo sustentável. “Isso
significa que o controle de pragas é feito de forma biológica e a colheita é
mecanizada, sem queima, o que faz com que a gente tenha uma melhor qualidade,
além da geração de um combustível renovável, que é o etanol”, sublinha Faheina.
Outros empreendedores têm buscando inspiração nas
iniciativas. Micarla Fernandes, proprietária de uma queijeira, localizada na
Fazenda Lima, no Agreste Potengi do Rio Grande do Norte, teve a ideia de montar
o próprio negócio depois de participar de um evento no Sebrae sobre a iguaria.
Esta semana, ela participou da Rota da Sustentabilidade em busca de novas
ideias para, quem sabe, ampliar o próprio negócio.
“Conheci ações muito interessantes, uma delas, na
VeV Agro, é um case de sucesso de como produzir mais com menos. Quero adotar
essa estratégia”, afirma. Além disso, ela pretende ampliar o alcance dos
negócios com novos serviços aos consumidores. “Percebo que uma das grandes
demandas do mercado é a da experiência, algo que vai além de apenas consumir o
produto. As pessoas querem saber quem produz e como se produz. É um nicho muito
importante que alia o consumo ao turismo, que é um dos projetos para a nossa
fazenda”, conta.
Na Cachaçaria Extrema, o turismo de experiência já é
uma realidade. Além da produção artesanal, o local, que fica na fazenda de
mesmo nome, está aberto a visitações, que ocorrem de segunda a sexta-feira, por
meio de agendamento. Durante as visitas, o cliente conhece todo o processo de
criação da cachaça, que é diverso. A iniciativa começou em abril do ano
passado. Os turistas podem escolher entre pacotes que oferecem, além da visita
e da degustação dos diversos tipos da bebida, um almoço com pratos regionais
como carneiro, carne de sol na nata, costela, pirão, feijão e macaxeira.
“O visitante, quando chega aqui, conhece nossa
estrutura e faz uma harmonização da cachaça com a gastronomia local”, explica
Marcos Mindelo, proprietário do empreendimento. Para agradar aos mais
exigentes, são oferecidas três opções diferentes de cachaça premium. “Temos,
ainda, a linha de cachaça saborizada para agregar um público maior”, aponta.
Para comemorar os 20 anos da marca, está sendo produzida uma cachaça extra
premium, envelhecida em barris de carvalho e bourbon, uma inovação da casa.
- Fomento
A Rota da Sustentabilidade, que inclui os negócios
citados nesta reportagem, integra as ações do ELI Agro, que tem como objetivo
levar produtores, empresários e investidores para conhecer e se inspirar em
cadeias de produção do Estado e mostrar o potencial agro do Rio Grande do
Norte. “Esta rota, especificamente, mostra como é possível produzir de forma
eficiente e sustentável. E como se faz isso? Com economia de água,
aproveitamento do nosso potencial eólico e solar, bem como em iniciativas como
as do Grupo Telles, com o aproveitamento do bagaço. O caso da Cachaçaria
Extrema, que tem uma produção totalmente orgânica, também deve ser citado”,
afirma Malu Fontes, que integra o ELI Agro.
A possibilidade de expansão para o trade turístico é
outro aspecto ressaltado no rol das iniciativas para o desenvolvimento dos
negócios sustentáveis. “A Extrema é um exemplo disso. O alambique foi
transformado em um restaurante e agora eles podem receber muito bem os
turistas”, diz Malu. O Sebrae é quem fomenta a iniciativa, que conta com alguns
critérios.
“São considerados aspectos como manejo sustentável,
produção orgânica e integração, como acontece com a usina Ceará-Mirim, que
compra cana-de-açúcar de pequenos produtores para mostrar que o agro também
olha para a sustentabilidade e que faz um processo diferenciado, neste caso,
sem a queima da cana. Nosso intuito foi selecionar propriedades que tivessem o
apelo de certificações, de bom manejo e de encadeamento produtivo para
estimular os pequenos negócios”, destaca Mona Nóbrega, gerente de
Desenvolvimento Rural do Sebrae-RN.
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