Ícaro Carvalho
Repórter
Uma terapia alternativa tem chamado a atenção da
comunidade de pais e mães atípicos do Rio Grande do Norte: a equoterapia.
Voltada especialmente para crianças e jovens diagnosticados com Transtorno do
Espectro Autista (TEA), a utilização de cavalos para o desenvolvimento de
exercícios e atividades com crianças autistas tem mostrado resultados
satisfatórios em várias questões e atraído cada vez mais adeptos no RN e no
Brasil. Recentemente, foi inaugurado um Centro de Equoterapia da Polícia
Militar no RN, com vagas abertas para a comunidade autista na capital potiguar.
Basicamente, a equoterapia consiste em ter o cavalo como um aliado terapêutico
e agente facilitador. Na prática, o movimento do animal proporciona estímulos
sensoriais, motores e cognitivos, promovendo o desenvolvimento físico,
psicológico e social do paciente.
Além do movimento do cavalo, a equoterapia tem outros princípios fundamentais,
como a interação emocional humano-animal, trazendo benefícios psicológicos,
como redução de ansiedade e aumento de autoestima, além de ajudar em questões
de melhora de postura, equilíbrio e foco dos pacientes.
“Para essas crianças diagnosticadas com TEA, a prática, além de melhorar
equilíbrio e postura através de estimulação de reações de proteção, ela também
estimula sensibilidade tátil, visual, olfativa e auditiva, tanto pelo ambiente
quanto pelas atividades realizadas na sessão com o cavalo. Isso ajuda a
desenvolver modulação de tônus muscular, promove organização e consciência
corporal. Essas atividades desenvolvem e modificam atitudes e comportamentos
devido ao movimento tridimensional do cavalo”, explica a fonoaudióloga Liliana
Câmara, do Centro de Equoterapia e Equitação do RN (CEERN), que atua com a
terapia há 22 anos no Estado em Parnamirim.
No Rio Grande do Norte, há registros de outros três centros de equoterapia com
atividades frequentes e semanais, sendo dois deles em Parnamirim, um em Natal e
outro em São Gonçalo do Amarante. O mais recentemente inaugurado foi o Centro
de Equoterapia da PMRN, localizado no Regimento da Cavalaria, na zona Norte. O
espaço conta com fisioterapeuta, psicólogo e equoterapeuta.
“A equoterapia sempre foi um sonho do coronel Moreira, chefe do regimento.
Fomos conseguindo apoio e desde julho colocamos em prática”, explica a tenente
Angélica Pascoal, fisioterapeuta e uma das coordenadoras do Centro de
Equoterapia da PMRN. “Durante os atendimentos ficamos com três profissionais
além do cavalo e da criança, com o guia conduzindo o animal, um guia lateral e um
terapeuta em outra lateral. Na prática, isso tem possibilitado melhora na
coordenação motora, equilíbrio, normalização do tônus, fortalecimento muscular
e interação social e psicológica”, acrescenta.
Às terças e quartas, 14 crianças estão participando das sessões de 30 minutos
cada. São três cavalos à disposição, todos cavalos da reserva: Bozó, Tarzan e
Dorinha. São trabalhadas questões de equilíbrio com posições específicas da
criança sobre o cavalo, além de pequenos exercícios de jogar e segurar uma bola
de futebol. As turmas são divididas em 50% para dependentes de policiais
militares e 50% para o público em geral.
Uma das crianças beneficiadas é Thalita, 5 anos, filha de Thiago Aldenir, 35
anos. Diagnosticada desde os dois anos com Transtorno do Espectro Autista, o
pai explica que a filha sempre tinha uma “carga pesada de terapias”, com a
equoterapia sendo uma maneira de dar um alívio e propiciar uma terapia
alternativa em um ambiente diferente.
“Foi uma forma de continuarmos as terapias num ambiente diferente da clínica.
Ela gosta bastante. Estamos vindo uma vez por semana e algumas coisas já dão
para notar, como o equilíbrio e a questão do contato visual. Quando ela está
aqui ela está mais focada, em especial quando está em cima do cavalo”, revela.
Os interessados em participar devem apresentar indicação médica e entrar em
contato pelo e-mail equoterapia.pmrn@gmail.com para obter informações
sobre o processo de inscrição.
Terapia tem muitos benefícios
Pais e mães ouvidos pela TRIBUNA DO NORTE são
unânimes em dizer que a equoterapia só trouxe benefícios para os seus filhos.
Entre os pontos positivos relatados estão melhoria na coordenação motora, olhar
focado, postura, desenvolvimento de habilidades sociais, e regulação emocional,
além de uma relação amistosa com o animal.
Segundo Priscila Oliveira, 39, mãe de Piero, 13 anos, o impacto na vida do seu
filho foi “verdadeiramente transformador”. Ele há três anos faz equoterapia no
Ceern. A corretora de imóveis conta que o contato com os cavalos não apenas
melhorou sua postura e comportamento, mas também o ajudou a compreender melhor
noções essenciais de segurança e postura adequada.
“Essa jornada de autoconhecimento permitiu que Piero se movesse com mais
segurança e confiança, enquanto aprende a interpretar os sinais do cavalo e a
respeitar seu espaço. Nesse processo, ele desenvolveu empatia e habilidades
sociais que antes pareciam distantes”, comemora Priscila.
Ainda segundo a mãe de Piero, seu filho enfrenta desafios de hipersensibilidade
sensorial, e o contato com os animais, com pelo e salivas, poderia ser um
obstáculo, assim como o uso de equipamentos como botas e capacetes.
“No entanto, a conexão que ele estabeleceu com os cavalos tem sido tão poderosa
que esses obstáculos foram superados. Esses 40 minutos são verdadeiramente
preciosos: é o tempo em que Piero se desconecta do mundo digital e se conecta
com a natureza, respirando ar puro e desfrutando da beleza ao seu redor. O
ambiente da hípica é um estímulo incrível para ele, permitindo que explore
diferentes cheiros e texturas enquanto fortalece sua capacidade de
autorregulação emocional. É uma experiência enriquecedora o aproxima da vida ao
seu redor de uma maneira profundamente significativa”, acrescenta.
Quem também está na equoterapia com o filho é a estudante de pedagogia Jéssica
Cirilo, 33 anos. Ela cita que seu filho, Jean Miguel, 8 anos, teve um
desenvolvimento considerável nos últimos quatro meses. Além dessa atividade ele
faz também terapia ocupacional e psicomotricidade.
“Meu filho está há quatro meses e o desenvolvimento é perceptível
principalmente nas outras terapias. Ele consegue sentar agora, atender melhor
os comandos, equilíbrio, mas principalmente essa questão da paciência que ele
não tinha nem um pouco. Ele tem muita rigidez cognitiva, é um desafio se
adaptar a novas funções, mas agora ele consegue, com mudança de percurso, novos
movimentos e exercícios”, explica.
Além do Centro de Equoterapia da PMRN, a Secretaria de Agricultura e Pesca
(SAPE) promove o Projeto de Equoterapia no Parque, sediado no Parque de
Exposições Aristófanes Fernandes em Parnamirim, realizou em 2024 cerca de 1.200
atendimentos a crianças com transtorno do espectro autista e paralisia
cerebral. O projeto é feito em parceria com a Associação Norte-rio-grandense de
Criadores de Cavalos Quarto de Milha (ANQM) e a Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN). O Governo do Estado mantém o projeto e assegura o
acesso gratuito à Equoterapia.
História
Segundo informações da Associação de Equoterapia de Santos, o método chegou ao
Brasil no início dos anos 70, por meio da Dra. Gabriele Brigitte Walter. Com a
criação da Associação Nacional de Equoterapia do Brasil (ANDE-Brasil), em 1989,
foi dado um grande impulso à implantação de centros de equoterapia no País,
contando atualmente com mais de 320 entidades em territóro nacional.
A palavra equoterapia, inclusive, (do latim “equus” e, do grego, “therapeia”)
foi criada pela ANDE-Brasil em 1989 para caracterizar todas as práticas que
trabalham com o cavalo utilizando técnicas de equitação e atividades equestres,
objetivando a reabilitação e/ou educação de pessoas com deficiência e/ou com
necessidades especiais, sendo o termo propriedade da ANDE-Brasil e registrado
no Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI, do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio, em 1999.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) reconheceu o método em 1997 e o Conselho
Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO) dispõe sobre o
reconhecimento da equoterapia como um recurso terapêutico da fisioterapia e
terapia ocupacional na resolução Nº. 348, de 27 de março de 2008. Em 2009, a
Lei nº 12.067, de 29 de outubro, criou o Dia Nacional da Equoterapia, em 9 de
agosto, para difundir a prática na sociedade.
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