Passada uma semana de debates sobre o pacote de
controle de gastos prometido pelo governo, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva continua a demonstrar resistência. Não faltam estudos e simulações feitas
pelas equipes dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento,
Simone Tebet. Lula já dispõe faz tempo de todas as informações necessárias para
tomar decisões. Infelizmente, continua a procrastinar. Promoveu uma romaria de
ministros ao Planalto, sabendo que ninguém abriria mão do próprio orçamento.
Com isso, só contribui para semear ainda mais incerteza e corroer o que ainda
resta da credibilidade de seu governo diante dos agentes econômicos.
Os ministros se esmeram no festival de lamúrias e
populismo. Luiz Marinho, do Trabalho, ameaçou pedir demissão, buscou apoio das
centrais sindicais e bateu pé contra mudanças sugeridas para seguro-desemprego
e abono salarial. Outro a falar em deixar o governo foi Carlos Lupi, da
Previdência. Wellington Dias, do Desenvolvimento Social, negou mudanças no Bolsa
Família— que jamais foram cogitadas — e no Benefício de Prestação Continuada
(BPC), voltado a deficientes e idosos de baixa renda. Os titulares da Saúde
(Nísia Trindade) e da Educação (Camilo Santana) também se encarregaram de
deixar claro que resistirão a cortes em suas pastas.
O que anima essa mobilização, além do espaço aberto
por Lula, é o equívoco fundamental que amaldiçoa as gestões petistas: a
confusão entre melhoria na qualidade do gasto público e malefícios aos pobres e
desassistidos. Nenhuma das propostas sobre a mesa defende cortes descabidos na
proteção a trabalhadores, nos sistemas de aposentadorias e pensões, em
programas sociais ou nos investimentos em Saúde e Educação. A ideia é trazer um
mínimo de racionalidade às despesas, para evitar desperdício. É o caso de
gastos ineficazes (abono salarial), da duplicidade entre seguro-desemprego e
FGTS, dos reajustes acima da inflação para o BPC ou do crescimento
descontrolado das despesas obrigatórias (resultado da vinculação constitucional
de gastos com Saúde e Educação).
É evidente que será impossível superar todos esses
desafios simultaneamente, mas não passa de hipocrisia negar-se a encarar a
necessidade de diminuir despesas empunhando a bandeira da defesa dos pobres.
Nada pune tanto a população desassistida quanto o descontrole fiscal, que
aumenta a incerteza, pressiona a inflação e força o Banco Central a aumentar os
juros, inibindo investimentos, a geração de empregos e o crescimento da
economia e da renda.
A História mostra que a conta da irresponsabilidade
fiscal é sempre paga pelos mais pobres e pelos trabalhadores — lição que já
deveria ter sido aprendida. Desde 2010, a produtividade no Brasil cresceu
mísero 0,3% ao ano. Somente na década perdida dos anos 1980 o desempenho foi
pior. De 2010 a 2023, a renda per capita se expandiu apenas 0,2% anual. É uma
tragédia, algo que todos os ministros de Lula deveriam lembrar todo dia ao
acordar. Nesse ritmo, o brasileiro só dobrará de padrão de vida daqui a 344
anos. Será que interessa mesmo aos mais pobres manter o desequilíbrio das
contas públicas? Lula precisa parar de procrastinar. Ele deve ao país, com
urgência, uma resposta à necessidade de controlar gastos.
Editorial O Globo
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