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domingo, 10 de novembro de 2024

Editorial O Globo: Lula deve ao país programa urgente de controle de gastos

 


Passada uma semana de debates sobre o pacote de controle de gastos prometido pelo governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva continua a demonstrar resistência. Não faltam estudos e simulações feitas pelas equipes dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet. Lula já dispõe faz tempo de todas as informações necessárias para tomar decisões. Infelizmente, continua a procrastinar. Promoveu uma romaria de ministros ao Planalto, sabendo que ninguém abriria mão do próprio orçamento. Com isso, só contribui para semear ainda mais incerteza e corroer o que ainda resta da credibilidade de seu governo diante dos agentes econômicos.

Os ministros se esmeram no festival de lamúrias e populismo. Luiz Marinho, do Trabalho, ameaçou pedir demissão, buscou apoio das centrais sindicais e bateu pé contra mudanças sugeridas para seguro-desemprego e abono salarial. Outro a falar em deixar o governo foi Carlos Lupi, da Previdência. Wellington Dias, do Desenvolvimento Social, negou mudanças no Bolsa Família— que jamais foram cogitadas — e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado a deficientes e idosos de baixa renda. Os titulares da Saúde (Nísia Trindade) e da Educação (Camilo Santana) também se encarregaram de deixar claro que resistirão a cortes em suas pastas.

O que anima essa mobilização, além do espaço aberto por Lula, é o equívoco fundamental que amaldiçoa as gestões petistas: a confusão entre melhoria na qualidade do gasto público e malefícios aos pobres e desassistidos. Nenhuma das propostas sobre a mesa defende cortes descabidos na proteção a trabalhadores, nos sistemas de aposentadorias e pensões, em programas sociais ou nos investimentos em Saúde e Educação. A ideia é trazer um mínimo de racionalidade às despesas, para evitar desperdício. É o caso de gastos ineficazes (abono salarial), da duplicidade entre seguro-desemprego e FGTS, dos reajustes acima da inflação para o BPC ou do crescimento descontrolado das despesas obrigatórias (resultado da vinculação constitucional de gastos com Saúde e Educação).

É evidente que será impossível superar todos esses desafios simultaneamente, mas não passa de hipocrisia negar-se a encarar a necessidade de diminuir despesas empunhando a bandeira da defesa dos pobres. Nada pune tanto a população desassistida quanto o descontrole fiscal, que aumenta a incerteza, pressiona a inflação e força o Banco Central a aumentar os juros, inibindo investimentos, a geração de empregos e o crescimento da economia e da renda.

A História mostra que a conta da irresponsabilidade fiscal é sempre paga pelos mais pobres e pelos trabalhadores — lição que já deveria ter sido aprendida. Desde 2010, a produtividade no Brasil cresceu mísero 0,3% ao ano. Somente na década perdida dos anos 1980 o desempenho foi pior. De 2010 a 2023, a renda per capita se expandiu apenas 0,2% anual. É uma tragédia, algo que todos os ministros de Lula deveriam lembrar todo dia ao acordar. Nesse ritmo, o brasileiro só dobrará de padrão de vida daqui a 344 anos. Será que interessa mesmo aos mais pobres manter o desequilíbrio das contas públicas? Lula precisa parar de procrastinar. Ele deve ao país, com urgência, uma resposta à necessidade de controlar gastos.

Editorial O Globo

 

 

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