A Amazônia Legal vive hoje a maior expansão do
crime organizado de sua história. É o que revela o novo relatório
Cartografias da Violência na Amazônia, divulgado nesta quarta-feira (19)
pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O levantamento mostra
que facções como Comando Vermelho (CV) e Primeiro Comando da
Capital (PCC) aceleram sua presença na região.
Segundo o relatório, já são 344 municípios sob
influência criminosa, um avanço de quase 100% em apenas dois anos. Desse
total, 258 cidades estão sob hegemonia de uma única facção, enquanto 86
vivem disputas territoriais marcadas por homicídios, tráfico de drogas,
garimpo ilegal e conflitos agrários.
O CV, hoje a organização com maior capilaridade
na Amazônia, passou de 128 municípios em 2023 para 286 municípios em 2025.
O PCC mantém influência estratégica em 90 cidades, fortalecendo
rotas aéreas e conexões internacionais.
Vale mencionar que a região é formada por 772
cidades distribuídas nos nove estados que compõem a Amazônia Legal.
Quantas e quais são as facções
criminosas na região?
Segundo pesquisadores, o cenário amazônico
atual inclui 17 facções ativas. Além do CV e PCC, tem os regionais Amigos do
Estado (ADE), Bonde dos 40 (B40), Primeiro Comando do Maranhão (PCM), Família
Terror do Amapá (FTA), União Criminosa do Amapá (UCA), Comando Classe A (CCA),
Bonde dos 13 (B13), Bonde dos 777 (dissidência do CV), Tropa do Castelar e
Piratas do Solimões.
As facções nordestinas também aparecem na
região, sendo elas Bonde do Maluco (BDM) e Guardiões do Estado (GDE). Também há
presença de organizações estrangeiras, como o Tren de Araguá, o Estado Maior
Central (EMC) e o Ex-Farc Acácio Medina.
Território redesenhado pelo crime
A presença criminosa se espalha por capitais,
cidades médias e pequenos municípios que se tornaram estratégicos para
o tráfico de drogas, armas, ouro e madeira, atividades que conectam a
Amazônia aos mercados nacionais e globais. A região já funciona
como corredor prioritário para a cocaína produzida em Peru, Colômbia e
Bolívia.
Essa reorganização territorial está diretamente
ligada ao aumento das mortes violentas intencionais, que atingiram
8.047 vítimas em 2024, e ao crescimento das disputas ligadas ao narcotráfico e
à exploração ilegal de recursos naturais.
Maranhão foi o único que apresentou aumento nas
taxas de homicídio entre 2023 e 2024, com um crescimento de 11,5%. O estado tem
vivenciado disputa territorial pelo controle do tráfico de drogas que envolve
especialmente o Bonde dos 40, o CV e o PCC. O estado mais violento da região e
do país foi o Amapá.
Rotas fluviais, aéreas e fronteiriças
impulsionam a expansão
O relatório detalha que o CV domina as rotas
fluviais, especialmente no rio Solimões, enquanto o PCC migra para rotas
aéreas clandestinas, usando pistas de pouso em garimpos ilegais e unidades de
conservação. Portos de Barcarena, Manaus, Itacoatiara, Santana e Santarém
aparecem como entrepostos essenciais da logística criminosa.
Fronteiras como Tabatinga, Benjamin Constant, São
Gabriel da Cachoeira, Bonfim, Pacaraima, Oiapoque, Guajará-Mirim,
Epitaciolândia, Assis Brasil e Cáceres também se tornaram áreas de alto risco
pela circulação de drogas, migrantes, ouro e armas.
A expansão das facções está profundamente conectada
a conflitos fundiários, grilagem e desmatamento. Terras
Indígenas como Yanomami, Apyterewa, Trincheira-Bacajá e Sararé concentram
invasões estruturadas e atividades ilegais financiadas ou exploradas por grupos
criminosos.
A Amazônia registrou 1.317 conflitos no campo
em 2024, maior número desde 2015, e concentra 60% de todos os conflitos
agrários do país.
Outros dados alarmantes
- Mulheres
enfrentam violência extrema
O relatório também aponta que 586 mulheres
foram assassinadas na região em 2024, taxa 21,8% maior que a nacional. A
violência sexual segue em alta, com 13.312 registros de estupro,
impulsionada por isolamento, ausência do Estado e presença de facções em garimpos
e áreas de fronteira.
Os pesquisadores denunciam como a presença de
facções na Amazônia impõe às mulheres diferentes formas de controle e
violência, que vão muito além das agressões “tradicionais” enfrentadas em
outras regiões. Mulheres que se relacionam afetiva ou familiarmente com
integrantes desses grupos são submetidas a regras rígidas sobre seus vínculos,
rotinas e até a necessidade de autorização para terminarem relacionamentos.
Já aquelas que vivem em territórios dominados pelo
crime, mesmo sem qualquer relação com faccionados, tornam-se alvo de sanções e
castigos sob a justificativa de “manutenção da ordem”, incluindo humilhações e
execuções.
- Epicentro
do narcotráfico continental
A Pan-Amazônia tornou-se corredor prioritário
de cocaína para Europa, América do Norte, África e Oceania. Em cinco anos, as
apreensões de cocaína realizadas pelas polícias da região cresceram 574%, e as
do governo federal, mais de 80%.
No Alto Solimões, território estratégico na tríplice
fronteira Brasil-Peru-Colômbia onde 54% da população é indígena, o CV controla
6 de 9 municípios, e opera como “porta de entrada” da droga no país.

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