Felipe Salustino
Repórter
O debate sobre a taxação do governo americano às
exportações brasileiras trouxe à tona o interesse dos Estados Unidos pelos
chamados minerais críticos e estratégicos, dentre eles, as terras raras,
disponíveis no Brasil. O Rio Grande do Norte dispõe desses minerais,
especialmente na região Seridó, de acordo com fontes ouvidas pela reportagem,
mas ainda faltam estudos que ofereçam um retrato mais amplo do potencial
potiguar nessa área. No ano passado, o Centro de Tecnologia Mineral do IFRN e o
Serviço Geológico Brasileiro (SGB) desenvolveram um projeto para pesquisas na
região da Borborema. A iniciativa, no entanto, aguarda a liberação de recursos.
O professor e geólogo Alexandre Rocha explica que
minerais estratégicos são aqueles que possuem ampla usabilidade, como os
utilizados na indústria da defesa e tecnologia. Já os críticos, mesmo com ampla
utilização, estão pouco disponíveis na natureza. Eles contêm os minerais terras
raras, formados por 17 elementos, dos quais 15 pertencem à família dos
lantanídeos (à exceção são o escândio e o ítrio). Esses elementos são
qualificados como raros por conta do processo de extração nos locais onde se
acumulam. “É um processamento difícil, que depende de muita tecnologia”, explica
Rocha.
Os 17 elementos são os seguintes: lantânio, cério,
praseodímio, neodímio, promécio, samário, európio, gadolínio, térbio,
disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio, lutécio, escândio e ítrio.
No início desta semana, o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, afirmou que os minerais críticos e as terras raras podem entrar nas
negociações tarifárias com os Estados Unidos. Segundo ele, um acordo sobre os
dois temas pode ser assinado com o governo estadunidense.
“Temos minerais críticos e terras raras. Os Estados
Unidos não são ricos nesses minerais. Podemos fazer acordos de cooperação para
produzir baterias mais eficientes”, disse Haddad.
No Rio Grande do Norte, segundo Alexandre Rocha, que
é professor do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), está sendo
desenvolvido, junto a três empresas brasileiras, a retirada de terras raras
associadas à argila. “É um trabalho que ocorre em Currais Novos”, conta.
Alexandre Rocha explica que, após a separação, os elementos são utilizados em
uma infinidade de aplicações, a exemplo de itens de nanotecnologia, como os
microchips, além de super ímãs, usados na indústria de carros elétricos,
energia eólica e fones de ouvido.
“Nossos fones têm neodímio, praseodímio, disprósio e
térbio. Aviões como o F-35 [norte-americano] chegam a ter 420 quilos de algum
tipo de terra rara. Um aspecto que chama atenção nesses elementos é o alto
valor agregado. Para efeito de comparação, uma tonelada de cobre custa em torno
de US$ 9 mil. Já uma tonelada de dérbio, por exemplo, tem custo estimado em US$
980 mil”, explica Alexandre Rocha.
Lítio, nióbio, tungstênio e tântalo são minerais
críticos. O professor do IFRN aponta que o Rio Grande do Norte desponta como um
estado com forte potencial para esses recursos, com abundância no Seridó, mas
também em municípios como São Paulo do Potengi e Tangará. O tântalo é utilizado
em capacitores e metais especiais, enquanto o nióbio tem seu uso aplicado em
turbinas de avião, gasodutos, tomógrafos de ressonância magnética, indústrias
bélica e nuclear, dentre outras. Já o lítio é bastante aplicado em baterias.
Falta de pesquisas
O potencial do RN para minerais críticos e
estratégicos é de conhecimento de quem atua no setor, mas um panorama assertivo
sobre a real capacidade do estado ainda carece de investimentos em pesquisa e
tecnologia. Em fevereiro do ano passado, o Centro de Tecnologia Mineral do IFRN
(CT Mineral/IFRN), em Currais Novos, se reuniu com o Consórcio Nordeste e
representações de outros estados para analisar um projeto que envolve estudos
na província pegmatítica da Borborema, para levantamento do potencial da região
em relação aos minerais críticos, em especial, o lítio.
À época, a proposta foi apresentada pelo Serviço
Geológico do Brasil (SGB). A atuação se daria na região da Borborema, que
abrange os estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e, em menor escala, Ceará.
Rafael Passos, diretor-geral do CT Mineral, explicou que tanto o RN quanto a
Paraíba entregaram os projetos a serem desenvolvidos, os quais possuem uma
demanda por recursos da ordem de R$ 40 milhões (R$ 20 milhões para cada
estado). Ao Consórcio Nordeste coube a busca pelos investimentos.
“Essa busca se deu junto a entidades como a Financiadora de Estudos e Projetos
(Finep), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
e o Ministério de Minas e Energia (MME), mas o financiamento, até o momento,
não chegou. Os recursos são referentes à compra de equipamentos para
aperfeiçoar os laboratórios de pesquisa, contratação de equipes de campo para
atuar na coleta e envio das amostras, entre outras despesas. O produto desse
trabalho seria o mapeamento minucioso da província da Borborema, com foco nos
minerais críticos, mas com possibilidade de encontrar outras oportunidades de exploração”,
pontuou Passos.
Valdir Silveira, diretor de Geologia e Recursos
Minerais do SGB, avalia que a pesquisa representará um marco para o Nordeste e
um primeiro passo para as pesquisas em minerais críticos na região. “A gente
aguarda esses estudos com muita ansiedade. O projeto é muito interessante, mas
precisa de investimentos também do Governo do Estado e da iniciativa privada.
Deve haver uma soma de esforços para encontrar esses bens minerais que estão no
subsolo do nosso estado e de estados vizinhos, especialmente, Ceará, Bahia,
Piauí, Maranhão, Paraíba, e Pernambuco”, disse Silveira.
A TRIBUNA DO NORTE fez contato com a Finep, o CNPq e
o MME para obter um posicionamento sobre a liberação de recursos para o
projeto, mas não houve retorno até o fechamento desta edição. Já o Consórcio
explicou, em nota, que elaborou o Programa de Minerais Críticos e Estratégicos
do Nordeste em parceria com os estados da região. O programa visa a
estruturação da Rede de PD&I em Minerais Críticos e Estratégicos e o aumento
da disponibilidade de recursos para pesquisa, desenvolvimento e inovação no
Nordeste.
“É o primeiro programa pensado para o
desenvolvimento das rotas tecnológicas para transformação desses minerais na
região, que conta com apoio do Governo Federal, por meio da Finep, do MCTI e do
BNB, pensado e estruturado no ano passado. A etapa atual é a fase final de
aprovação dos recursos, que devem superar, inicialmente, os R$ 100 milhões. A
previsão é que a publicação de editais ou chamadas para aprovação dos projetos
ocorra ainda neste ano”, esclareceu o Consórcio, ao explicar que os estudos na
Borborema poderão ser contemplados com esses investimentos.
A Secretaria de Desenvolvimento Econômico do RN
(Sedec) disse que tem buscado fortalecer parcerias com instituições de
pesquisa, universidades e o setor produtivo, para a atração de investimentos
para o setor de minerais críticos. Segundo a pasta, o projeto do CT Mineral
está na Finep, cumprindo trâmites processuais. “Seguimos acompanhando esse
processo de perto, em diálogo com os órgãos federais envolvidos, como o
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e a própria Finep, com o objetivo
de garantir que o RN avance nas etapas necessárias para consolidar sua posição
como um polo estratégico para a produção de minerais críticos no Brasil”, falou
Alan Silveira, secretário da pasta.
CT Mineral
Além das expectativas em torno do projeto para
estudar minerais críticos na Borborema potiguar, o Centro de Tecnologia Mineral
do IFRN desenvolve soluções tecnológicas para os desafios da indústria da
mineração em conjunto com o setor produtivo. “Nascemos em 2019 e desde 2023
somos também uma das 93 Unidades Embrapii [Empresa Brasileira de Pesquisa e
Inovação Industrial] espalhadas pelo Brasil e uma das poucas que trabalham com
tecnologias da mineração”, descreve Rafael Passos, diretor-geral do CT.
Ele explica que o Centro de Tecnologia já possui
projetos de PD&I com empresas que buscam soluções para extração e
beneficiamentos de minérios associados a terras raras, mas as tecnologias para
o beneficiamento de minerais ricos nesses elementos são limitadas e, portanto,
carecem de mais estudos e de desenvolvimento.
“Nos últimos dois anos, o CT Mineral já desenvolveu
ou desenvolve quatro projetos com empresas para aperfeiçoamento dessa técnica.
Portanto, estamos nos especializando em metodologias para atender a essa
necessidade latente da indústria de forma geral. Tanto o RN quanto o Brasil têm
um potencial muito promissor para os minerais críticos”, fala Rafael Passos.
Valdir Silveira, do SGB, afirma que, diante dessa
capacidade, o campo de pesquisa em todo o País é enorme. “Diante do potencial
do RN, que é fantástico, se tivéssemos um olhar diferente para o estado
poderíamos estar em outro patamar”, disse, ao comentar sobre os interesses do
governo norte-americano nos minerais críticos brasileiros. “É importante
salientar que nós somos um país soberano, estamos no centro das atenções
mundiais nesse tema, mas a decisão de aceitar ou não qualquer tipo de imposição
será sempre do governo brasileiro”, assinala.
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