Ícaro Carvalho
Repórter
Se há algumas décadas o aparelho celular era
considerado um item de luxo e de difícil acesso para a população, nos dias
atuais é praticamente impossível encontrar alguém que não tenha um smartphone.
Contendo dados sensíveis, imagens privadas, senhas de bancos, entre outras
itens considerados fundamentais, os celulares passaram a ser visados por
criminosos e quadrilhas que ora revendem os aparelhos, ora desmontam em busca
das peças, ora aplicam novos crimes e golpes se aproveitando das informações.
Dados do Anuário Brasileiro da Segurança Pública apontam que o RN recuperou, em
2024, menos de 10% do total de ocorrências de celulares furtados/roubados. A
cidade de Natal, inclusive, ficou em 14º entre as 20 cidades com as maiores
taxas de aparelhos subtraídos por 100 mil habitantes.
Segundo os dados do Fórum Brasileiro de Segurança
Pública (FBSP), o Estado registrou 16.005 ocorrências de roubos e furtos de
celulares em 2024, número 10% menor do que em 2023, quando 17.849 ocorrências
foram registradas. Já quando se trata de recuperação de celulares, o Estado
registrou 1.059 recuperações em 2024 contra 971 em 2023, aumento de 9%. A
Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesed) informou que os números do
Anuário estão desatualizados. Segundo a pasta, a recuperação de celulares, ano
passado, atingiu 1.840 aparelhos. Até junho de 2025, 575 celulares já foram
recuperados pelas polícias do RN.
Nacionalmente, segundo o Anuário Brasileiro da
Segurança Pública, cerca de 8% dos aparelhos celulares roubados conseguem ser
recuperados pelas forças policiais e de segurança pública.
Na avaliação do professor universitário e especialista
em segurança pública, Francisco Augusto da Cruz Araújo, a baixa taxa de
recuperação está menos relacionada à ausência de atuação policial e mais à
complexidade da cadeia criminosa, que envolve desde o roubo até a revenda
rápida, muitas vezes para outros estados ou até fora do país.
O especialista cita, por exemplo, que do ponto de
vista investigativo, esse crime enfrenta dificuldades específicas. Um desses
pontos, por exemplo, são os entraves legais. Além disso, há entraves
operacionais para que os investigadores acessem dados que poderiam ajudar nas
investigações, como geolocalização e registros de IMEI, que nem sempre são
prontamente fornecidos pelas operadoras.
“A primeira delas é o tempo de resposta, pois a
revenda ou desmonte do aparelho costuma ocorrer em poucas horas, o que exige
ações quase imediatas para que a recuperação seja possível. A segunda está na
limitação de recursos humanos e tecnológicos para monitorar e rastrear em tempo
real os aparelhos e suas redes de circulação”, explica.
Segundo informações publicadas pela Polícia Civil,
delegacias do Estado têm apostado em operações de recuperação de celulares. As
operações “Recupera”, “Reset” e a “Return”, em cidades como Natal, Parnamirim,
Caicó e João Câmara, têm focado na devolução dos aparelhos aos respectivos
donos. Em João Câmara, por exemplo, 20 celulares foram recuperados após furtos
no São João. Na Operação Return, em Caicó, a 2ª fase promoveu a devolução de 50
celulares, tendo recuperado outros 80 na primeira fase. Durante as diligências,
as equipes policiais conseguiram recuperar os celulares em diversos municípios
do Rio Grande do Norte e também em outros estados, como Ceará, Bahia,
Pernambuco, São Paulo e Rondônia.
Na avaliação do delegado Marcos Vinícius dos Santos,
diretor de Polícia Civil da Grande Natal, a dificuldade em se recuperar
celulares deve-se muito à falta de dados.
“Tivemos um avanço do aplicativo do Governo Federal,
mas aqui no Estado, acho que não chega a 10 mil cadastrados”, cita. “Para se
trabalhar a recuperação de um celular você precisa dos dados dele. O IMEI, por
exemplo. Muitas vezes a pessoa chega para fazer o registro, vindo de um evento,
onde temos muitos furtos ou às vezes a perda, mas faltam os dados. Sem o IMEI
já começa a complicar para rastrearmos e recuperarmos”, acrescenta.
O delegado Marcos Vinícius acrescenta ainda que as
delegacias da PCRN têm trabalhado em operações para recuperação de celulares.
“Praticamente toda semana tem celulares sendo recuperados”, diz.
A Polícia Civil orienta, ainda, que vítimas de furto
ou roubo de celular adotem imediatamente as seguintes medidas: entrar em
contato com instituições bancárias para trocar senhas associadas ao aparelho,
registrar o boletim de ocorrência, presencialmente ou pela Delegacia Virtual (https://delegaciavirtual.sinesp.gov.br),
e informar, sempre que possível, o número do IMEI do celular subtraído – dado
que pode ser encontrado na caixa do aparelho, na nota fiscal ou digitando *#06#
no próprio dispositivo.
RN adere a programa nacional de
recuperação
O secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa
Social do RN (Sesed), Coronel Francisco Araújo, atribui a baixa recuperação de
celulares no Estado a uma série de problemas estruturais, como, por exemplo, a
falta de Internet nas delegacias do Estado, problema que existia anteriormente
e afetava o registro dos B.Os e consequentemente, as investigações. O
secretário informou ainda que todas as delegacias do Estado contam com conexão.
Ele acrescenta que o Estado implementou, desde o final de 2023, o PPE
(Procedimento Policial Eletrônico), em convênio com o Ministério da Justiça e
Segurança Pública (MJSP). O PPE é onde a Polícia registra todos os boletins de
ocorrência de crimes no Estado.
A adesão ao PPE possibilitou, segundo Araújo,
assinar convênio com o MJSP para implementar um programa de recuperação de
celulares roubados, o Celular Seguro. A iniciativa foi pioneira no Piauí e
passou a ser replicada em outras unidades da federação.
“Esse número ainda não estava tabulado. As ações
feitas hoje por todas as delegacias. Não é mais só a diretoria de inteligência
da Polícia Civil que faz. Tivemos ações em Mossoró, Caicó, Pau dos Ferros,
então está aumentando a quantidade de recuperações porque todas as delegacias
estão tendo acesso a essa chave ao sistema e estão fazendo a recuperação e
entregando ao cidadão”, disse.
Ainda segundo o secretário de Segurança, o número de
registros de ocorrência, aliado ao fato de os cidadãos informarem o IMEI
(International Mobile Equipment Identity), uma espécie de CPF do celular, tem
auxiliado o trabalho da polícia na recuperação dos aparelhos. Na prática,
segundo informações da Sesed, o software solta um disparo para a pessoa que
está com o dispositivo, informando que o aparelho é fruto de ação criminosa,
sendo necessário o comparecimento a uma delegacia para devolução.
“Por exemplo, o celular é furtado aqui em Caicó e é
apreendido em João Pessoa. É um software que acompanha em qualquer local em que
o aparelho for cadastrado novamente. A cada dia estamos aperfeiçoando mais.
Acreditamos que nesse ano vamos ter um aumento do número de celulares
recuperados, de objetos sendo entregues de volta ao cidadão. Acreditamos ainda
que estamos reduzindo a quantidade de roubos. Se você olhar a estatística,
reduzimos em relação ao que era, porque o sujeito está vendo que roubar e
vender, o camarada que está com o celular pode responder como receptador”,
acrescenta.
A Sesed apontou que os furtos e roubos de aparelhos
celulares no Rio Grande do Norte caíram de 8.044 ocorrências no primeiro
semestre de 2024 para 6.464 casos registrados nos primeiros seis meses de 2025.
São 1.580 crimes a menos, o que representa uma diminuição de 19,64% no período.
Em 2024, foram 15.708 registros no total contra 17.809 ocorrências em 2023. A
queda é de 11%.
Roubos e furtos trazem danos
psicológicos
Em alguns casos o uso da violência, em outros, uma
rapidez silenciosa. Das duas formas, o roubo ou furto de celulares deixam danos
materiais e psicológicos para vítimas ouvidas pela TRIBUNA DO NORTE. Um ponto
em comum citado pelos alvos de criminosos é a “dor de cabeça” em ter que correr
atrás de um novo aparelho e claro, bloquear redes sociais e contas bancárias.
É o caso de uma potiguar de 35 anos ouvida pela TN
que preferiu não se identificar. Ela conta que foi furtada em outubro de 2023
durante uma festa de rua, em Natal. O criminoso tirou o celular de dentro de
sua bolsa, que era presa ao seu corpo.
“Foi um grande susto perceber que não tinha mais o
celular. No meio de uma multidão, minha bolsa foi aberta. É uma sensação de ter
sido invadida. Ainda bem que agi rápido e bloqueei todas as contas bancárias,
etc, então o prejuízo material foi o valor do celular. Porém, o prejuízo maior
é de mudar senhas, proteger e recuperar informações pessoais e de trabalho.
Registrei logo um boletim de ocorrência e cancelei o celular pela operadora.
São medidas importantes a serem tomadas com rapidez”, disse.
Em outro caso, um operador de telemarketing de 40
anos conta que também foi furtado durante uma festa de rua no ano passado em
Natal. “A ação foi muito rápida. É algo que você não percebe. E ao mesmo tempo
é muito irritante, porque precisei comprar o celular e não estava previsto no
orçamento. Além disso, a dor de cabeça de bloquear as contas, transferir para o
novo celular, sem contar nas fotos e arquivos que eu tinha, é algo que incomoda
bastante”, declarou.
“O furto ou roubo de um celular vai muito além da
perda material. Ele representa uma ruptura imediata na vida pessoal,
profissional e emocional da vítima. Hoje, o celular concentra informações
bancárias, documentos, agendas, redes de contato, aplicativos de trabalho,
registros médicos, senhas e muitas fotografias. O roubo ou furto podem causar
bloqueio de atividades diárias, interrupção do trabalho, prejuízo financeiro
direto, além de gerar medo, insegurança e sensação de vulnerabilidade”,
finaliza Francisco Augusto Cruz.
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