O Senado se prepara para votar a proposta do novo
Código Eleitoral brasileiro e, apesar de estar com o projeto há quase quatro
anos, pretende chancelar mudança relativa às pesquisas eleitorais que é
controversa e não teve quase nenhum debate nas sessões de discussão.
O texto relatado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI)
estabelece que a divulgação de pesquisas terá que ser precedida da informação
dos três últimos levantamentos eleitorais realizados por aquele instituto na
disputa anterior, em comparação com o resultado das urnas.
A medida, com potencial de embaralhar as informações
dadas aos eleitores e que é bastante criticada por diretores dos institutos,
não foi alvo de emendas nem de discussões relevantes no Senado, apesar de o
texto aprovado pela Câmara estar por lá há quase quatro anos.
A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado
discutiu a proposta do código na quarta-feira (9), mas devido a divergências
sobre outros pontos, a votação foi adiada.
Pesquisas eleitorais são antigos alvos dos
congressistas, que afirmam haver em alguns casos fraudes e indução do eleitor a
erros, principalmente em disputas regionais.
Ao aprovar o novo código em 2021, por exemplo, a
Câmara estabeleceu uma censura à divulgação de pesquisas na véspera e no dia da
votação, além de estipular que os institutos publicassem um "percentual de
acerto" das últimas cinco eleições. Ou seja, que cotejasse as últimas
pesquisas daqueles anos com o resultado das urnas.
O senador Marcelo Castro retirou de seu relatório a
censura, frisando que a medida já havia sido considerada inconstitucional pelo
STF (Supremo Tribunal Federal), e trocou a proposta de percentual de acerto
pela exigência de divulgação prévia das três últimas pesquisas do instituto na
eleição passada para o cargo em disputa —prefeito, governador, senador e
presidente da República.
As poucas emendas apresentadas na CCJ do Senado
relativas às pesquisas buscaram restringir ainda mais as regras. A do senador
Laércio Oliveira (PP-SE) queria simplesmente proibir qualquer tipo de pesquisa.
A da senadora Professora Dorinha Seabra (União Brasil-TO) sugeria que a
"taxa de acerto" fosse medida em relação à média de todas as
pesquisas realizadas pelo instituto no pleito anterior.
Castro as rejeitou e, entre outros argumentos,
listou um que guarda semelhança com o que dizem os diretores de instituto.
"Não há sentido, salvo melhor juízo, em
considerar a médias dos resultados das pesquisas ao longo da campanha e
comparar esse número com os votos apurados nas urnas. Campanhas são feitas com
a intenção de mudar a intenção de votos dos eleitores, objetivo no qual algumas
logram êxito, outras não, e pesquisas honestas procuram detectar essas mudanças
ao longo do tempo", escreveu o relator em seu parecer.
O argumento dos diretores de institutos é,
principalmente, o de que pesquisas eleitorais não têm o intuito de
"acertar" resultados das urnas, mas sim o de jogar luz sobre o
cenário de momento, que sofre alterações no decorrer da disputa, potencialmente
inclusive no próprio dia da eleição.
Pesquisas com o intuito de revelar o resultado são
as chamadas "boca de urna", que praticamente não são mais realizadas
no Brasil devido à agilidade da divulgação oficial da apuração dos votos com as
urnas eletrônicas.
A primazia das informações das eleições anteriores
antes do resultado da disputa em questão também é um ponto questionado.
"Isso vai dar um nó na cabeça do eleitor. O que
tem a ver um cara que não está concorrendo agora, ou se de repente na outra
eleição ele concorria a outro cargo? Isso vai dar muita confusão", diz
Duilio Novaes, presidente da Abep (Associação Brasileira de Empresas de
Pesquisa).
Ele afirma que houve uma tentativa de diálogo com os
senadores, mas que não houve resposta a nota técnica enviada com essas
ponderações aos senadores da CCJ.
O Conselho Superior da associação é integrado, entre
outros, por Luciana Chong, diretora do Datafolha, instituto de pesquisas de
opinião pertencente ao Grupo Folha.
"As pesquisas eleitorais revelam as tendências
ao longo do período eleitoral e cada eleição tem uma dinâmica diferente.
Apresentar os resultados de pesquisas realizadas em pleitos anteriores é
irrelevante, não representa nenhum critério de qualidade ou credibilidade para
os institutos de pesquisas", diz Chong.
A reportagem enviou a Marcelo Castro perguntas sobre
o capítulo das pesquisas eleitorais e sobre a ausência de debate mais
aprofundado sobre o tema, mas não houve resposta.
O projeto como um todo tem 877 artigos e revoga toda
a legislação eleitoral com o objetivo de instituir um único código. A proposta
tem o objetivo formal de modernizar e simplificar as regras, mas traz diversos
pontos que fragilizam a fiscalização e punição a partidos e candidatos por mau
uso das verbas públicas.
Os assuntos que mais têm atraído a atenção dos
senadores são a nova tentativa de emplacar o voto impresso nas eleições, a
quarentena para magistrados, policiais e militares que desejem disputar um
cargo e a punição a fake news nas eleições.
Caso seja aprovada na CCJ do Senado, a medida tem
que passar ainda pelo plenário e, após isso, volta para a Câmara, que tem a
palavra final na tramitação. Entre deputados, o sentimento contra pesquisas
eleitorais é, historicamente, mais robusto.
Em caso de aprovação final, o presidente da
República ainda pode vetar total ou parcialmente a medida, mas mesmo assim cabe
ao Congresso a última palavra. Eventuais vetos presidenciais podem ser
derrubados com o apoio da maioria dos 513 deputados e 81 senadores.
Folha de São Paulo
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