segunda-feira, 14 de julho de 2025

Opinião do Estadão: Inflação não é brincadeira

 


Inflação não é brincadeira

Mais um estouro da meta de inflação desqualifica a pressão de Lula e do PT por queda de juros a qualquer custo. BC faz bem ao reafirmar que seu papel é resguardar o poder de compra da moeda

O avanço de 0,24% da inflação em junho elevou para 5,35% o acumulado em 12 meses e inaugurou o estouro inflacionário sob o sistema de meta contínua, em vigor desde janeiro. Por esse modelo, o comportamento da inflação apurado em um ano é observado mês a mês, e a meta é considerada descumprida quando o resultado ficar acima do intervalo de tolerância por seis meses consecutivos. Durante todo o primeiro semestre, o acumulado do IPCA ficou bem acima de 4,5%, o limite máximo permitido para a meta de 3% ao ano.

Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central (BC), teve de escrever ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mais uma carta detalhando que o banco não conseguiu conter a inflação em razão de fatores como o sobreaquecimento da economia, que roda com demanda acima da capacidade de produção. Até março do ano que vem, o banco espera trazer a inflação para dentro do limite máximo e, ao final de 2026, chegar aos 3%.

A carta é uma formalidade, mas carrega a importantíssima função de reafirmar o compromisso do BC com o controle da inflação, razão para o ciclo de aperto monetário iniciado em setembro do ano passado que incorporou, desde então, 4,5 pontos porcentuais à Selic. O pacto ratificado pelo BC ganha mais relevância diante da leviandade explícita do presidente Lula da Silva, que não perde a oportunidade de vaticinar uma iminente queda dos juros, insistindo que os preços estão “razoavelmente controlados”.

Não é o que mostra o aumento de preços em sete dos nove grupos do IPCA em junho. Em audiência na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, Galípolo destacou que mais de 70% dos itens que compõem o índice estão acima da meta e que essa é a principal justificativa para a taxa de juros de 15% ao ano. Não são altas pontuais, neste ou naquele produto ou serviço, e sim um encarecimento espalhado dos preços.

De quebra, o presidente do BC expôs aos deputados que, ao contrário de outros países, no Brasil os subsídios cruzados distorcem e barateiam o custo do crédito para as empresas e esvaziam a Selic como trava inflacionária. Seria essa a explicação para a demora nos efeitos dos juros sobre os preços.

Inflação não é brincadeira, e embora Lula tenha dito que os brasileiros levam a alta de preços “muito a sério”, o contínuo estouro da meta preocupa – e muito. O sistema atual, com aferição mês a mês, confirma que os juros não conseguem frear a inflação justamente porque outros fatores, inclusive incentivos do próprio governo, continuam empurrando os preços para cima.

Nas últimas semanas causou apreensão a retomada da pressão de Lula da Silva e do PT pelo corte dos juros a qualquer custo, sob pretexto de fomentar o desenvolvimento econômico mesmo com “um pouco de inflação”. Em junho, duas semanas antes de o Copom elevar de 14,75% para 15% a Selic, Lula chegou a dizer que “logo, logo” o Banco Central tomaria a “atitude correta” de começar a baixar os juros.

A pressão petista andava arrefecida desde a passagem de bastão na presidência do BC, em 1.º de janeiro. Indicado no governo Bolsonaro, Roberto Campos Neto continuou no cargo nos dois primeiros anos do governo atual, para só então ser substituído por Galípolo, indicado de Lula. A não coincidência dos mandatos, imposta pela lei da autonomia do banco, tem se revelado crucial para a política monetária.

Em sua ida à Câmara, em meio à pressão revigorada de parte do governo pela queda de juros, Galípolo reafirmou que o papel do Banco Central é o de defensor do poder de compra da moeda. Com todas as letras, o indicado de Lula declarou que o banco não vai se desviar desse objetivo nem mediar a busca por outra meta.

“Ninguém quer baixar os juros para ter uma inflação lá em cima. Você quer conviver com uma taxa de juros que produza o mesmo efeito, do ponto de vista de conter a inflação”, explicou aos deputados. Ou seja, se o governo quer que os juros caiam, precisa trabalhar para acabar com os fatores que fazem a inflação subir, sobretudo os gastos públicos em excesso.

Opinião do Estadão

 

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