O Rio Grande do Norte aparece entre os estados com
maiores fragilidades na gestão da demanda por creche no Brasil. Dados do
Retrato da Educação Infantil no Brasil 2025, levantamento do Ministério da
Educação (MEC) em parceria com o Gabinete de Articulação para a Efetividade da
Política da Educação (Gaepe), mostram que somente 2,99% dos municípios
potiguares declararam saber exatamente quantas crianças aguardam vaga em creche
por faixa etária. O índice contrasta com o cenário nacional, no qual 26,18% dos
municípios afirmam ter esse controle detalhado, e revela dificuldades estruturais
para planejamento, aplicação de recursos e promoção da equidade no acesso à
Educação Infantil no estado.
No levantamento, que coletou informações de 100% dos
municípios brasileiros e do Distrito Federal, o RN teve 105 municípios
classificados com baixa maturidade na gestão da demanda por Educação Infantil,
61 com média maturidade e apenas um com alta maturidade, Tibau do Sul. A
capital Natal foi enquadrada na faixa intermediária. Para o conselheiro do
Tribunal de Contas do Estado (TCE-RN) e representante do Gaepe no RN, Gilberto
Jales, o diagnóstico cumpre um papel estratégico ao oferecer um retrato
atualizado da política pública voltada a bebês e crianças de 0 a 6 anos,
especialmente no que diz respeito à disponibilidade de vagas em creches e
pré-escolas.
“Assegurar acesso à educação infantil de qualidade
não apenas atende a uma necessidade imediata das famílias, como promove a
equidade e contribui para o sucesso educacional futuro das crianças, com
impactos positivos para toda a sociedade. O diagnóstico fornecerá subsídios ao
planejamento e à efetiva expansão de vagas necessárias ao atendimento dos
dispositivos em vigência para a educação infantil em todo o Estado, e auxiliará
a elaboração de um plano de ação efetivo”, explica Gilberto Jales.
Essa baixa capacidade de identificar a demanda por
idade se reflete em outros indicadores. Segundo os dados do painel, 71,86% dos
municípios potiguares marcaram a opção “não se aplica” quando questionados se
possuem informações sobre o quantitativo de crianças em lista de espera,
enquanto 20,36% admitiram não saber quantas crianças aguardam vaga e apenas
4,79% informaram conhecer somente o total, sem detalhamento etário.
Entre as cidades do RN, Natal aparece como exceção
em alguns indicadores. A capital declarou saber o quantitativo de crianças que
aguardam vaga em creche por idade e figura entre os poucos entes que adotam
critérios padronizados e previstos em legislação municipal para priorização do
atendimento.
O secretário municipal de Educação, Aldo Fernandes,
avalia que a classificação de média maturidade reflete um processo em
construção. “A SME reconhece que a educação infantil em Natal já apresenta
avanços reais, porém ainda não plenamente consolidados. A classificação reflete
um processo de construção exitoso e o relatório é um indicador de conquistas
que pode contribuir significativamente para o planejamento e aprimoramento das
novas ações para superação de desafios”, afirmou.
Segundo ele, a capital apresenta avanços
relacionados à organização pedagógica e administrativa da rede, com diretrizes
alinhadas à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), institucionalização de
projetos político-pedagógicos e regimentos escolares, além de ações de formação
continuada e acompanhamento das unidades. “Vale destacar a ampliação de vagas
na creche, extinguindo o sorteio como forma de ingresso”, disse o titular da
SME Natal.
A realidade potiguar também se evidencia quando se
observa a idade de início da oferta de creche. Enquanto, no Brasil, 671
municípios afirmam atender crianças de 0 a 3 meses e 1.459 iniciam o
atendimento entre 3 e 6 meses, no Rio Grande do Norte a maior concentração está
em faixas mais tardias: 53 municípios só ofertam vagas entre 24 e 30 meses de
idade e outros 39 a partir de 18 meses. Natal, segundo o levantamento, inicia o
atendimento entre 6 e 9 meses. De acordo com a Secretaria Municipal de
Educação, em 2025 foram ofertadas 36 vagas para crianças de 6 a 11 meses em
duas unidades da rede, diante de uma demanda de 61 inscritos.
Para o conselheiro do TCE-RN, a limitação no
atendimento aos bebês mais novos está diretamente associada à ausência de dados
consolidados. “Dados fidedignos e atualizados revelam uma fotografia real da
oferta de creche e pré-escola nos municípios do Brasil, bem como proporciona
mecanismos de gestão da demanda, do planejamento das redes e das formas de
colaboração entre diferentes instituições”, afirmou Gilberto Jales, ao destacar
que a falta de informações compromete a expansão de vagas e o uso racional dos
recursos públicos.
No conjunto dos indicadores, o RN aparece com
percentuais ligeiramente superiores à média nacional em ações de
conscientização sobre o direito à Educação Infantil para crianças de 0 a 3
anos. Segundo o painel do levantamento, 83,83% dos municípios potiguares
declararam realizar campanhas ou iniciativas para informar a população, contra
77,76% no Brasil. Natal informou que desenvolve essas ações e também declarou
identificar famílias com crianças fora da creche e fora da lista de espera,
prática adotada por 66,47% dos municípios do RN.
Critérios de acesso e desafios
Outro ponto de alerta revelado pelo levantamento diz
respeito aos critérios de priorização de vagas em creche. No Rio Grande do
Norte, 60 municípios afirmaram que o atendimento é feito exclusivamente pela
ordem de cadastramento, enquanto apenas uma parcela menor declarou adotar
critérios padronizados e previstos em legislação. A capital aparece entre esse
grupo, com critérios incluem pessoas com deficiência, irmãos na mesma unidade,
residência próxima à escola, inscrição em programas sociais e data e hora da
inscrição.
Para Gilberto Jales, a baixa conexão entre políticas
de proteção social e a priorização de vagas ainda é um entrave estrutural.
“Embora 78% dos municípios do Brasil monitorem famílias beneficiárias de
programas de transferência de renda, apenas 26,1% utilizam essa condição como
critério formal de prioridade em filas de espera”, afirmou. Diante do cenário,
o Gaepe RN publicou a Nota Técnica com orientações para aprimorar a gestão, a expansão
e a transparência das políticas de creche no estado, com foco na priorização de
crianças em situação de vulnerabilidade e na promoção da equidade no acesso.
O diagnóstico nacional também aponta limitações no
planejamento de expansão. Apenas parte dos municípios brasileiros possui plano
formal para ampliar vagas na Educação Infantil. Em Natal, a Secretaria
Municipal de Educação informou que há planejamento para ampliar a oferta de
vagas na Educação Infantil em Natal. “A prefeitura pactuou com o Governo
Federal, a construção de 12 Centros Municipais de Educação Infantil,
distribuídos nas quatro Regiões Administrativas da cidade”, disse o secretário
Aldo Fernandes. A pasta, no entanto, não detalhou quais são os prazos de
execução desses espaços.
No âmbito institucional, a União dos Dirigentes
Municipais de Educação do Rio Grande do Norte informou que ainda está em fase
de avaliação técnica do levantamento. Em nota, a Undime/RN destacou que “está
analisando os dados apresentados pelo relatório Retrato da Educação Infantil no
Brasil 2025, elaborado pelo Ministério da Educação em parceria com o Gaepe”, e
que aguarda uma reunião com o MEC para discutir o tema de forma mais
aprofundada. Segundo a entidade, o objetivo é “compreender com precisão os
parâmetros dos indicadores utilizados e a metodologia de classificação dos
municípios em cada categoria estabelecida”.
Procurada, a Secretaria de Estado da Educação, da
Cultura, do Esporte e do Lazer (SEEC) também se manifestou por meio de nota e
ressaltou o papel do Estado no regime de colaboração com os municípios. “O
Governo do Estado do Rio Grande do Norte atua como articulador e apoiador das
políticas educacionais desenvolvidas pelos municípios, especialmente na
Educação Infantil, que é de responsabilidade prioritária municipal”, afirmou a
pasta, ao destacar que essa atuação ocorre por meio de apoio técnico, formações
continuadas e fortalecimento dos sistemas de informação educacional.
Segundo a SEEC, a estratégia estadual busca
qualificar o planejamento e promover maior equidade educacional nos
territórios, com iniciativas que reforçam a cooperação entre Estado e
municípios. A secretaria citou como exemplo o Compromisso Nacional Criança
Alfabetizada, implementado no RN por meio da Política Territorial de
Alfabetização de Crianças (Pró-Alfa RN), voltada ao apoio às redes públicas.

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