O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União),
cobrou do Supremo Tribunal Federal (STF) respeito ao Poder Legislativo e falou
em mudar a Constituição diante da decisão do ministro Gilmar Mendes, nesta
quarta-feira (03), que blindou os ministros da Corte contra processos de
impeachment.
“Não é
razoável que uma lei votada em duas Casas Legislativas e sancionada pelo
presidente da República seja revista pela decisão de um único ministro do STF.
Para tanto, deve ser exigível a decisão colegiada”, disse o presidente do
Senado. O senador também citou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que
restringe decisões monocráticas, ou seja, aquelas que são tomadas por um só
ministro.
“A situação estabelecida indica a necessidade de se
alterar o regime das chamadas decisões monocráticas, em especial aquelas que
suspendem a vigência de lei cautelarmente”, declarou o senador.
Gilmar Mendes concedeu nesta quarta-feira (03) uma
liminar que altera o rito e torna mais difícil o impeachment de ministros do
STF, o que causou forte repercussão no Legislativo. Na liminar, Gilmar retirou
de “todo cidadão” o direito de denunciar um crime de responsabilidade contra um
ministro do STF. Segundo a decisão do decano, a denúncia caberá somente à
Procuradoria-Geral da República (PGR).
Além disso, o quórum para o afastamento de um
ministro foi alterado para dois terços do Senado (54 dos 81). Até então, o
processo de impedimento de um juiz do STF avançava por maioria simples dos
votos.
O decano proferiu a decisão após ouvir
esclarecimentos do Congresso, da PGR e da Advocacia-Geral da União (AGU). “A
prática do impeachment de ministros, quando utilizada de forma abusiva ou
instrumentalizada, não se limita a um ataque a indivíduos, mas se configura
como um ataque à própria estrutura do Estado de Direito”, argumentou Gilmar.
O presidente do Senado, por sua vez, afirmou que a
decisão contraria o que está previsto no sistema legal. “Eventuais abusos no
uso desse direito não podem levar à anulação desse comando legal, muito menos
por meio de decisão judicial”, disse o presidente do Senado, referindo-se ao
crescente número de pedidos de impeachment de ministros do STF.
STF só teve um ministro afastado em 134 anos
Em 134 anos, o STF só teve um integrante demovido do
cargo por decisão do Poder Legislativo. Em 1894, o Senado negou a indicação de
Cândido Barata Ribeiro para uma das cadeiras na Corte. Os senadores avaliaram
que Barata Ribeiro, que era médico, não possuía o “notório saber” previsto na
Constituição para o exercício do cargo de juiz da Suprema Corte.
Diferentemente do rito atual, nos primeiros anos da
República o indicado pelo presidente para ocupar uma cadeira no STF podia
exercer o posto antes de ter o nome aprovado pelos senadores. Sendo assim, o
presidente Floriano Peixoto indicou Barata Ribeiro em outubro de 1893, durante
um recesso parlamentar, o que impediu que a sabatina com o médico fosse
realizada de imediato. O médico foi ministro do STF por 11 meses até ter a
indicação barrada pelo Senado.
RITO PROCESSUAL
Como funciona o processo de impeachment
de ministros do STF no Senado:
- O
pedido de impeachment de um ministro do STF pode ser apresentado por
qualquer cidadão
- O
processo começa com a aceitação da denúncia pelo presidente da Casa
- É
criada uma comissão especial de 21 senadores, que tem dez dias para
avaliar preliminarmente o caso
- Se
o parecer for favorável, o plenário vota a instauração formal do processo,
exigindo maioria simples (41 votos)
- Após
aberta a ação, o ministro é notificado, tem 10 dias para responder, e a
comissão tem 15 dias para investigar antes de nova votação
- A
condenação exige maioria qualificada de 54 votos
- Se
condenado, o ministro perde o cargo
- Se
absolvido, retorna ao posto
Rogério Marinho: ‘liminar de Gilmar é
inconstitucional’
O líder da oposição no Senado, senador Rogério
Marinho (PL-RN), também repercutiu a decisão do decano do STF. Ele destacou,
por meio de nota, que o impeachment de ministro do STF é, por disposição constitucional,
um mecanismo de freios e contrapesos da democracia, uma vez que estabelece ao
Senado Federal a competência para instaurar processo e julgar membros da Corte
por crimes de responsabilidade.
“Por essa razão, a liminar monocrática proferida
hoje pelo ministro Gilmar Mendes, que suspendeu dispositivos legais vigentes há
décadas, configura um fato institucional de elevada gravidade. Ao retirar, sem
o necessário debate republicano, a legitimidade de cidadãos para provocar e
iniciar o procedimento de impeachment, cria-se um precedente que fragiliza o
sistema de controle mútuo instituído pela Constituição”, disse o senador.
Marinho ressaltou ainda que a decisão do magistrado
tende a reduzir a sujeição da Corte a mecanismos de responsabilização, abrindo
espaço para uma “blindagem incompatível com o Estado de Direito e com a
Constituição”.
“Há uma diferença elementar que não pode ser
ignorada: o Presidente da República só assume o cargo após conquistar a maioria
absoluta dos votos válidos de mais de 155 milhões de brasileiros. Já um
ministro do STF, que decide diariamente sobre a vida política, econômica e
social do país, não recebeu um único voto popular. A liminar de hoje, ao
pretender conferir a ministro do STF uma tutela imune a qualquer controle,
altera profundamente o equilíbrio constitucional entre os Poderes”, declarou o
senador potiguar.
O parlamentar enfatizou ainda que está em curso há
anos um processo que denominou de “hipertrofia do Poder Judiciário”, por meio
do qual, sob o pretexto de defesa da democracia, “avança sem limites sobre
competências dos demais Poderes”.
Rogério Marinho cobrou reação do parlamento
brasileiro diante da decisão de Gilmar Mendes e de seus desdobramentos. “Diante
disso, o Poder Legislativo não pode se calar diante de mais este abuso. É nosso
dever constitucional restabelecer o equilíbrio entre as instituições,
reafirmando o sistema de freios e contrapesos que sustenta a República”,
sublinhou.

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