Felipe Salustino
Repórter
O setor de cana-de-açúcar do RN está apreensivo
diante do cenário atual. De acordo com Hermano Neto, presidente da Associação
dos Plantadores de Cana do estado (Asplan), a expectativa é de fechar a safra
em curso com uma produção de 3,5 milhões de toneladas, o que representa uma
redução de 12,5% em relação à safra anterior, com 4 milhões de toneladas. Já o
presidente da Cooperativa de Plantadores de Cana do RN (Coplacana), Anderson
Faheina, estima perdas de cerca de R$ 140 milhões para o setor, que sofre, segundo
as fontes, com a concorrência do etanol de milho, estiagem e o tarifaço de 50%,
ainda mantido pelos EUA para alguns produtos brasileiros.
Hermano Neto, da Asplan, frisa que, embora a grande
apreensão gire em torno da próxima safra, os impactos já estão sendo sentidos,.
“Temos a barreira tarifária dos Estados Unidos, que fez com que a produção de
açúcar circulasse mais no Brasil, onde a lei da oferta e da procura fez baixar,
por consequência, o preço da tonelada de cana. Para se ter uma ideia, chegamos
a entregar a tonelada por R$ 200, em média. Hoje, o preço não passa de R$ 130,
ou seja, reduziu quase pela metade. Temos também o efeito climático muito forte
em 2025”, pontua.
Para Anderson Faheina, presidente da Cooperativa de
Plantadores de Cana do RN (Coplacana), outro fator que tem dificultado o
cenário é a concorrência com o etanol de milho, produto que tem ganhado cada
vez mais espaço no mercado. “É um produto que ganha mercado e que está cada vez
mais próximo da gente, com produção dessa matéria-prima aqui perto, no
Maranhão. Antes, só tínhamos essa produção na região do estado de Mato Grosso.
Então, isso afeta a cadeia de produção com o etanol feito da cana”, falou.
Segundo Faheina, a estiagem no período mais próximo
do final do ano, que tem sido mais severa em 2025, também tem sido um fator
importante de impacto. “Este ano, estamos enfrentando uma seca mais forte,
refletindo na safra atual. Temos relatos de produtores de que as perdas estão
acima de 35%. Considerando a projeção de produção, estamos falando de R$ 140
milhões a menos em circulação na economia”, diz.
De acordo com Hermano Neto, da Asplan, a produção de
cana-de-açúcar se concentra atualmente em municípios como São José de Mipibu,
Goianinha, Canguaretama e Baía Formosa, mas também há cultivo em Ceará-Mirim e
São Gonçalo do Amarante. Ele explica que cada hectare demanda custos de cerca
de R$ 3 mil . Os custos gerais com um único plantio giram em torno de R$ 12 mil
apenas com o tratamento da cultura.
“Especialmente com os efeitos da seca neste ano, não
está sobrando nada para investimentos na próxima safra”, destaca, ao
acrescentar que há uma preocupação com o fechamento de postos de trabalho. “Com
o baixo interesse em manter os canaviais, a gente tem também a possibilidade de
demissões”, ressaltou Hermano Neto.
Situação deve se agravar na próxima
safra
Hermano Neto cita como a situação do setor na
próxima safra pode se desenrolar, caso não haja mudanças e apoio ao plantio de
cana no estado. “Com os problemas, o produtor não vai mais querer tratar o
canavial, impactando, inclusive, outras cadeias, como a defensiva agrícola.
Então, haverá um efeito dominó, com tendência de agravamento a partir de
fevereiro, quando a safra atual acabar”, afirma.
Esta também é a grande preocupação do produtor José
Bezerra, que se diz apreensivo com os custos da manutenção da cultura para a
próxima safra. “A cana é uma cultura que tem um ciclo de vida útil acima dos
quatro anos, mas isso depende da qualidade do solo, que precisa ser tratado e
limpo, ou seja, requer custos”, pontua. Bezerra possui uma área de 350 hectares
entre os municípios de Ceará-Mirim e São Gonçalo do Amarante, onde produz cerca
de 30 mil toneladas de cana por safra. Ele calcula que, para a produção atual,
os prejuízos devem girar em torno de R$ 20 a R$ 30 por tonelada, inicialmente.
Para o cálculo, o produtor considera o preço atual
da tonelada [cerca de R$ 130], menos os valores referentes ao processo de
colheita, carregamento e transporte, os quais, juntos, geram um custo de R$ 70
a R$ 80. “Subtraindo esse valor, resta para o produtor algo em torno de R$ 70
por tonelada vendida”, descreve José Bezerra. Diante do cenário, ele conta que
prefere, no momento, não fazer nenhum planejamento para a próxima safra.
Bezerra atribui as dificuldades à concorrência com o
etanol produzido a partir do milho e ao tarifaço americano. Para Anderson Faheina,
presidente da Coplacana, a melhoria do cenário atual depende de ações diretas
com foco em benefícios fiscais para o setor. “O corte do ICMS para alguns itens
da cadeia utilizados pelo produtor, como o diesel, por exemplo, seria uma
alternativa. Mas a gente sabe que esta é uma área em que o governo não gostaria
de mexer”, fala.
Ainda segundo Faheina, o Executivo estadual deveria
“pressionar” o Governo Federal a buscar uma diplomacia com os EUA para
extinguir ou reduzir a tarifa americana ainda aplicada ao açúcar brasileiro.
“Para outras áreas, houve avanços na questão do tarifaço, mas o açúcar não
entrou nesse bloco”, sublinha. Hermano Neto, da Coplacana, também defende um
apoio do poder público ao setor.
“Em estados como Pernambuco, Paraíba e Alagoas, tem
havido audiências constantes para cobrar do Governo Federal ações para
equalizar a questão do tarifaço. Mas também é preciso que haja subsídios. Sem
falar que a Secretaria de Agricultura do RN deve atuar junto aos produtores
para uma ação direta em torno da situação”, cobra o presidente da Asplan.
Sape: oscilações se devem ao etanol de
milho
O secretário de Agricultura e Pesca do RN, Guilherme
Saldanha, afirmou que o setor sucroalcooleiro do estado tem passado por
oscilações principalmente por conta do mercado do etanol de milho, cuja
indústria fornece o produto durante os 12 meses do ano. “Consequentemente, o
comprador vai priorizar esse produtor que consegue manter uma regularidade na
oferta do etanol de milho”, disse. Do ponto de vista das exportações, Saldanha
pontuou que, mesmo com o tarifaço americano, a venda do açúcar potiguar para o
exterior deve seguir em crescimento, com projeção de atingir US$ 15 milhões
neste ano.
Os EUA foram o principal destino (US$ 7,2 milhões),
seguidos pela Geórgia (US$ 4,2 milhões). Em todo o ano de 2024, as exportações
do produto totalizaram US$ 9,9 milhões, com maior diversificação de destinos
(EUA, Bulgária, Portugal e Canadá), sendo os EUA, também nesse ano, o principal
mercado consumidor. Na comparação entre os períodos analisados, as vendas do produto
para o exterior já representam um crescimento de 22%. As informações do
Observatório da Fiern têm como base a plataforma Comex-Stat, do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).
A reportagem analisou, com base em dados da Comex-Stat,
as exportações do açúcar potiguar após a entrada em vigor do tarifaço
americano, em agosto deste ano. Os números mostram que as vendas para os EUA do
início da taxação até novembro somaram US$ 2,99 milhões, um crescimento de
73,2% em relação ao mesmo período do ano passado, quando as exportações do
produto somaram US$ 1,73 milhão.

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