A Federação da Agricultura e Pecuária do Rio Grande
do Norte (Faern) denunciou o Governo do Estado a órgãos de controle por suposto
descumprimento de condicionantes ambientais em intervenções realizadas no
Distrito Irrigado do Baixo Açu (Diba). A federação afirma que autorizações
concedidas pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente
(Idema) à Secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária e Pesca (Sape) para
supressão vegetal com vista à construção de vias de acesso do projeto Oswaldo
Amorim, no Diba, estariam sendo executadas sem o atendimento às exigências
previstas no licenciamento ambiental. A Sape nega irregularidades, e adianta
que deve lançar, na próxima semana, um edital voltado à agricultura familiar.
A denúncia foi protocolada pela Faern e pela
Associação dos Produtores Rurais Irrigantes da 2ª Etapa do Diba (Aprodiba)
junto ao Idema, ao Ministério Público Estadual, ao Ministério Público Federal e
ao Tribunal de Contas do Estado (TCE). “Foi concedida uma autorização de
supressão vegetal com várias condicionantes e nada foi cumprido”, afirmou o
presidente do Sistema Faern/Senar, José Vieira.
Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, José Vieira
sustentou que o futuro edital tem objetivo de beneficiar o Movimento dos Sem
Terra (MST). “A secretaria não cumpriu as condicionantes, e, em função disso,
fizemos a denúncia. O objetivo é assentar o MST nessa área, inclusive, o MST já
está acampado no Diba”, acrescenta o presidente da Faern. As condicionantes do
Idema determinam que o detentor da autorização deve comunicar ao órgão, por
meio de ofícios anexados ao processo, o início e a conclusão das atividades de
supressão vegetal.
Conforme a denúncia, a supressão ambiental está em
execução sem atendimento às condicionantes, com inexecução das medidas de
compensação ambiental e ausência do Termo de Compromisso para Reposição
Florestal (TCRF), referente à referida autorização publicada no Diário Oficial,
no prazo improrrogável de 15 dias a partir da data de recebimento da
autorização.
Há ainda ausência de esclarecimentos e de resolução
dos conflitos fundiários nas áreas sobrepostas, bem como de comunicação oficial
no processo acerca do início das atividades de supressão vegetal, segundo a
denúncia. A Sape deu início aos serviços de execução de abertura dos acessos
aos arruamentos, estando em 60% executados.
De acordo com o titular da SAPE, Guilherme Saldanha,
não existem irregularidades, pois foi feita apenas a abertura do acesso aos
lotes individuais. “A gente não está fazendo demarcamento, a gente está abrindo
as ruas de acesso às áreas onde será feita a licitação. Por enquanto, só isso.
Com a devida autorização de supressão vegetal”, disse Guilherme Saldanha.
A Faern avalia ingressar na Justiça para barrar o
edital que, segundo o titular da Sape, será lançado na próxima semana. “Eles
cometeram um crime, nós fomos lá e denunciamos. E agora, se eles soltarem o
edital, nós vamos entrar na Justiça também”, destaca José Vieira. Ele afirmou
que a federação é contrária à instalação de famílias do MST no Diba por
entender que a área não foi concebida para assentamentos como esse. “Ali é um
ambiente de produtores que empreendem e têm um custo alto para poder fazer as
terras produzirem”, disse.
Ele também pondera que a proposta de lotes de
aproximadamente 3,8 hectares seria economicamente inviável. “Para implantar um
hectare irrigado, você gasta pelo menos R$ 50 mil. No mínimo, cada família
teria que investir R$ 150 mil, além dos custos de manutenção de um condomínio
onde as despesas são rateadas”, acrescentou.
Áreas estão sendo abertas sem
infraestrutura básica
José Vieira destacou ainda que áreas estariam sendo
abertas sem infraestrutura básica: “Não tem energia instalada nos lotes, não
têm abastecimento de água para as famílias. É uma irresponsabilidade muito
grande querer lançar um edital sem a infraestrutura pronta”.
A Faern sustenta que a proposta, da forma como vem
sendo conduzida, já provoca retração de investimentos no distrito. Segundo
Vieira, empresários reduziram ou suspenderam aportes diante do que classificam
como insegurança jurídica. A entidade afirma defender alternativas para o
assentamento das famílias, em áreas fora do perímetro irrigado, inclusive com
apoio técnico e capacitação por meio do Senar.
Audiência na ALRN debaterá situação do
Diba
A deputada estadual Terezinha Maia (PL) protocolou a
realização de uma audiência pública para discutir a ameaça de descaracterização
do perímetro irrigado do Diba. O requerimento justifica a necessidade de debate
sobre o tema “diante das ações do Governo do Estado que preveem a instalação de
famílias em área destinada à agricultura irrigada, ocasionando riscos ao
agronegócio local, ao abastecimento hídrico dos lotes concessionados e ao
cumprimento da legislação estadual e federal pertinente”.
Ainda no requerimento a deputada menciona que o seu
gabinete tem recebido informações de que 100 famílias estão assentadas no
entorno do perímetro irrigado e”em outros casos já se instalaram nas áreas
internas do Projeto do baixo Açu, no município de Afonso Bezerra”.
A Faern, segundo José Vieira, vai se posicionar
durante a audiência. “Vamos mostrar ao Governo que existem outras opções,
outras áreas e que ali é um local que não é adequado para fazer um
assentamento”, afirmou o dirigente. José Vieira diz que a presença do MST nas
proximidades do canal principal do Diba já preocupa os produtores por atingir a
área inicial que distribui água para os lotes empresariais e, com isso, elevar
o risco de interrupção do abastecimento. “Eles estão lá na porta do canal, na
beirada do canal”, disse. Segundo ele, um eventual bloqueio do fluxo de água
afetaria diretamente a produção e a rotina do perímetro irrigado.
Segundo o presidente da Faern, caso o MST ocupe a
área, isso pode levar ao fim do próprio distrito da 2ª etapa, já que as
estradas passariam a ser exclusivamente destinadas aos futuros lotes que,
supostamente, seriam ocupados pelo movimento. “Insegurança jurídica total, eles
não pagarão a conta do condomínio e vão continuar tirando água do canal, isso
gera insegurança, os outros condomínios ou os outros lotes não vão aceitar e
isso pode levar ao fim do próprio distrito da segunda etapa”, disse José
Vieira.
Conforme a entidade, a iniciativa compromete a
viabilidade econômica do projeto irrigado, gera insegurança jurídica para
produtores já instalados e desconsidera condicionantes ambientais impostas por
órgãos licenciadores.
Do lado dos integrantes do movimento, o edital
também não deve favorecê-los, pela falta de estrutura no local, conforme
Vieira. “É um absurdo. Como vai fazer um edital se não tem infraestrutura
nenhuma pronta? Lá não tem água para eles, não foi feito sistema adutora, não
tem energia, não tem estrada, não tem colégio para filho de assentado, não tem
nada. O maior crime que eles estão querendo cometer se eles soltarem inclusive
o edital agora”.
O Diba é o único distrito irrigado em funcionamento
no Rio Grande do Norte e reúne cerca de 300 produtores distribuídos em duas
etapas do projeto, com produção anual estimada em 100 mil toneladas de frutas
como melão, banana, mamão e limão.
Nos últimos meses, a área tem sido alvo de mobilizações
do MST, incluindo acampamentos no Centro Administrativo do Estado e bloqueios
em acessos ao distrito, na RN-118. O movimento reivindica o repasse de cerca de
3,5 mil hectares e afirma haver um acordo firmado com a governadora Fátima
Bezerra que não teria sido cumprido.
Guilherme Saldanha nega a ligação do edital com o
MST. “Não tem absolutamente nada para o MST, não existe embasamento legal para
ser feito. A Secretaria da Agricultura está abrindo um edital de licitação para
a agricultura familiar, nós vamos lançar mais outro edital para pequenos
produtores e mais outro edital para a agroindústria”.
O objetivo do edital é selecionar agricultores
familiares interessados em ocupar áreas específicas, com definição prévia de
critérios para a seleção. “Eu não posso abrir um edital para botar MST dentro
de uma área que pertence ao Estado do Rio Grande do Norte”, esclareceu o
secretário.

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