domingo, 21 de dezembro de 2025

Cana-de-açúcar: setor prevê baixa na produção e perdas de R$ 140 milhões no RN

 


Felipe Salustino
Repórter

O setor de cana-de-açúcar do RN está apreensivo diante do cenário atual. De acordo com Hermano Neto, presidente da Associação dos Plantadores de Cana do estado (Asplan), a expectativa é de fechar a safra em curso com uma produção de 3,5 milhões de toneladas, o que representa uma redução de 12,5% em relação à safra anterior, com 4 milhões de toneladas. Já o presidente da Cooperativa de Plantadores de Cana do RN (Coplacana), Anderson Faheina, estima perdas de cerca de R$ 140 milhões para o setor, que sofre, segundo as fontes, com a concorrência do etanol de milho, estiagem e o tarifaço de 50%, ainda mantido pelos EUA para alguns produtos brasileiros.

Hermano Neto, da Asplan, frisa que, embora a grande apreensão gire em torno da próxima safra, os impactos já estão sendo sentidos,. “Temos a barreira tarifária dos Estados Unidos, que fez com que a produção de açúcar circulasse mais no Brasil, onde a lei da oferta e da procura fez baixar, por consequência, o preço da tonelada de cana. Para se ter uma ideia, chegamos a entregar a tonelada por R$ 200, em média. Hoje, o preço não passa de R$ 130, ou seja, reduziu quase pela metade. Temos também o efeito climático muito forte em 2025”, pontua.

Para Anderson Faheina, presidente da Cooperativa de Plantadores de Cana do RN (Coplacana), outro fator que tem dificultado o cenário é a concorrência com o etanol de milho, produto que tem ganhado cada vez mais espaço no mercado. “É um produto que ganha mercado e que está cada vez mais próximo da gente, com produção dessa matéria-prima aqui perto, no Maranhão. Antes, só tínhamos essa produção na região do estado de Mato Grosso. Então, isso afeta a cadeia de produção com o etanol feito da cana”, falou.

Segundo Faheina, a estiagem no período mais próximo do final do ano, que tem sido mais severa em 2025, também tem sido um fator importante de impacto. “Este ano, estamos enfrentando uma seca mais forte, refletindo na safra atual. Temos relatos de produtores de que as perdas estão acima de 35%. Considerando a projeção de produção, estamos falando de R$ 140 milhões a menos em circulação na economia”, diz.

De acordo com Hermano Neto, da Asplan, a produção de cana-de-açúcar se concentra atualmente em municípios como São José de Mipibu, Goianinha, Canguaretama e Baía Formosa, mas também há cultivo em Ceará-Mirim e São Gonçalo do Amarante. Ele explica que cada hectare demanda custos de cerca de R$ 3 mil . Os custos gerais com um único plantio giram em torno de R$ 12 mil apenas com o tratamento da cultura.

“Especialmente com os efeitos da seca neste ano, não está sobrando nada para investimentos na próxima safra”, destaca, ao acrescentar que há uma preocupação com o fechamento de postos de trabalho. “Com o baixo interesse em manter os canaviais, a gente tem também a possibilidade de demissões”, ressaltou Hermano Neto.

Situação deve se agravar na próxima safra

Hermano Neto cita como a situação do setor na próxima safra pode se desenrolar, caso não haja mudanças e apoio ao plantio de cana no estado. “Com os problemas, o produtor não vai mais querer tratar o canavial, impactando, inclusive, outras cadeias, como a defensiva agrícola. Então, haverá um efeito dominó, com tendência de agravamento a partir de fevereiro, quando a safra atual acabar”, afirma.

Esta também é a grande preocupação do produtor José Bezerra, que se diz apreensivo com os custos da manutenção da cultura para a próxima safra. “A cana é uma cultura que tem um ciclo de vida útil acima dos quatro anos, mas isso depende da qualidade do solo, que precisa ser tratado e limpo, ou seja, requer custos”, pontua. Bezerra possui uma área de 350 hectares entre os municípios de Ceará-Mirim e São Gonçalo do Amarante, onde produz cerca de 30 mil toneladas de cana por safra. Ele calcula que, para a produção atual, os prejuízos devem girar em torno de R$ 20 a R$ 30 por tonelada, inicialmente.

Para o cálculo, o produtor considera o preço atual da tonelada [cerca de R$ 130], menos os valores referentes ao processo de colheita, carregamento e transporte, os quais, juntos, geram um custo de R$ 70 a R$ 80. “Subtraindo esse valor, resta para o produtor algo em torno de R$ 70 por tonelada vendida”, descreve José Bezerra. Diante do cenário, ele conta que prefere, no momento, não fazer nenhum planejamento para a próxima safra.

Bezerra atribui as dificuldades à concorrência com o etanol produzido a partir do milho e ao tarifaço americano. Para Anderson Faheina, presidente da Coplacana, a melhoria do cenário atual depende de ações diretas com foco em benefícios fiscais para o setor. “O corte do ICMS para alguns itens da cadeia utilizados pelo produtor, como o diesel, por exemplo, seria uma alternativa. Mas a gente sabe que esta é uma área em que o governo não gostaria de mexer”, fala.

Ainda segundo Faheina, o Executivo estadual deveria “pressionar” o Governo Federal a buscar uma diplomacia com os EUA para extinguir ou reduzir a tarifa americana ainda aplicada ao açúcar brasileiro. “Para outras áreas, houve avanços na questão do tarifaço, mas o açúcar não entrou nesse bloco”, sublinha. Hermano Neto, da Coplacana, também defende um apoio do poder público ao setor.

“Em estados como Pernambuco, Paraíba e Alagoas, tem havido audiências constantes para cobrar do Governo Federal ações para equalizar a questão do tarifaço. Mas também é preciso que haja subsídios. Sem falar que a Secretaria de Agricultura do RN deve atuar junto aos produtores para uma ação direta em torno da situação”, cobra o presidente da Asplan.

Sape: oscilações se devem ao etanol de milho

O secretário de Agricultura e Pesca do RN, Guilherme Saldanha, afirmou que o setor sucroalcooleiro do estado tem passado por oscilações principalmente por conta do mercado do etanol de milho, cuja indústria fornece o produto durante os 12 meses do ano. “Consequentemente, o comprador vai priorizar esse produtor que consegue manter uma regularidade na oferta do etanol de milho”, disse. Do ponto de vista das exportações, Saldanha pontuou que, mesmo com o tarifaço americano, a venda do açúcar potiguar para o exterior deve seguir em crescimento, com projeção de atingir US$ 15 milhões neste ano.

 “É um recorde. Para se ter uma ideia, em 2022, as exportações do produto somaram US$ 1,5 milhão. Hoje, os EUA ainda são um mercado importante, com o acréscimo de outros destinos que ganham destaque, como a União Europeia e a África”, disse o secretário. De acordo com dados do Observatório da Indústria Mais RN, da Fiern, em 2025 foram exportados US$ 12 milhões em açúcares de cana até novembro.

Os EUA foram o principal destino (US$ 7,2 milhões), seguidos pela Geórgia (US$ 4,2 milhões). Em todo o ano de 2024, as exportações do produto totalizaram US$ 9,9 milhões, com maior diversificação de destinos (EUA, Bulgária, Portugal e Canadá), sendo os EUA, também nesse ano, o principal mercado consumidor. Na comparação entre os períodos analisados, as vendas do produto para o exterior já representam um crescimento de 22%. As informações do Observatório da Fiern têm como base a plataforma Comex-Stat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

A reportagem analisou, com base em dados da Comex-Stat, as exportações do açúcar potiguar após a entrada em vigor do tarifaço americano, em agosto deste ano. Os números mostram que as vendas para os EUA do início da taxação até novembro somaram US$ 2,99 milhões, um crescimento de 73,2% em relação ao mesmo período do ano passado, quando as exportações do produto somaram US$ 1,73 milhão.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Briga de casal termina em agressão, prisão e atendimento hospitalar no interior do RN

  Por volta das 2h20 da madrugada deste sábado (20), a Polícia Militar do Rio Grande do Norte atendeu a uma ocorrência de violência doméstic...