O Pix, sistema de pagamentos que transformou a forma
como os brasileiros movimentam dinheiro, está prestes a ganhar uma nova
funcionalidade: o parcelamento. Prevista para ser regulamentada pelo Banco
Central em setembro, a novidade adiciona ao Pix o pagamento em prestações, um
dos principais atrativos dos cartões de crédito. Além de acirrar a concorrência
com gigantes como Visa e Mastercard, a iniciativa desperta a atenção
internacional. Em julho, os Estados Unidos incluíram a modalidade em uma
investigação sobre práticas comerciais desleais. Em resposta, o presidente Lula
afirmou que, “se o Pix tomar conta do mundo, os cartões de crédito irão
desaparecer”. Exageros à parte, é fato que a ofensiva dos Estados Unidos surgiu
às vésperas de uma mudança que pode, sim, representar ameaça real a essa
concorrência.
O parcelamento de transações via Pix já é oferecido,
de forma independente, por algumas instituições financeiras há algum tempo.
Pioneiro na modalidade, o Banco do Brasil movimentou 1,5 bilhão de reais desde
dezembro de 2022, valor modesto diante dos mais de 5 trilhões de reais
transacionados anualmente em Pix à vista pela instituição. Não por acaso, o
próprio setor bancário solicitou ao Banco Central uma padronização, como forma
de tornar a prática mais transparente e acessível ao consumidor.
Hoje, na ausência de regras claras, algumas
instituições chegam a usar a fatura do cartão de crédito do cliente como base
para o parcelamento do Pix, mas essa solução é considerada inadequada pelo BC.
Com a nova regulação, o Pix parcelado passará a ser, de fato, um novo produto
financeiro. O parcelamento será vinculado à análise de crédito pessoal do
cliente e as taxas de juros ficarão a cargo de cada banco, de acordo com o
perfil de risco do pagador. Tudo isso sem cobrança de tarifas adicionais e sem
a intermediação das operadoras de cartões.
O Pix parcelado tem, de fato, potencial para se
firmar como uma alternativa relevante ao cartão de crédito. “O objetivo não é
eliminar nenhum meio de pagamento, mas ampliar as opções disponíveis para a
população”, afirma Breno Lobo, chefe adjunto do Departamento de Competição e
Estrutura do Mercado Financeiro do Banco Central. A expectativa, também
compartilhada pela Federação Brasileira de Bancos, é de que a nova
funcionalidade impulsione ainda mais a já ampla adesão ao Pix.
Até junho de 2025, mais de 168 milhões de
brasileiros já haviam feito ou recebido ao menos uma transação instantânea.
Hoje, o sistema lidera com folga entre os métodos de pagamento no país: 46% da
população usa a ferramenta como principal forma de transação, mesmo tendo sido
lançada há menos de cinco anos. Os cartões de débito e crédito, apesar de
décadas de presença no mercado, são os preferidos de apenas 17% e 11% dos
usuários, respectivamente.
O Banco Central acredita que as compras feitas por
meio do Pix parcelado tendem a ter preço igual ou inferior para os consumidores
em relação às realizadas com cartão de crédito. A expectativa se baseia na
ausência de tarifas adicionais — como as cobradas pelas maquininhas — e no
recebimento instantâneo dos valores pelos comerciantes, o que pode estimular o
oferecimento de descontos. “Varejistas pagam caro para aceitar cartões de
crédito”, afirma Ana Paula Tozzi, diretora-executiva da AGR Consultores. Para
ela, a entrada do Pix parcelado promete aquecer a concorrência: “As operadoras
e bandeiras de cartão vão ter que melhorar suas condições”. Apesar do cenário
desafiador, a Mastercard demonstra confiança em sua capacidade de adaptação.
“Assim como o mercado de pagamentos evolui rapidamente, o cartão de crédito
acompanha essas mudanças”, declarou a empresa em nota. A Visa preferiu não
se manifestar.
Ainda assim, há temor de que a pressão resulte em
sanções contra o país. A solução criada pelo Banco Central preocupa mesmo a
concorrência e vem conquistando reconhecimento internacional. Em artigo
recente, o Nobel de Economia Paul Krugman afirmou que o Brasil pode ter
inventado o futuro do dinheiro. “Outros países podem, sim, aprender com o
sucesso do Brasil no desenvolvimento de um sistema de pagamentos digital”,
disse. De fato, o Pix já se consolidou como uma inovação inquestionável — e sua
próxima evolução promete acelerar ainda mais a transformação do sistema
financeiro brasileiro.
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