Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal)
decidiram não se manifestar a respeito das menções feitas sobre eles por Jair
Bolsonaro (PL) e Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
Em troca de mensagens em junho, Bolsonaro relatou ao
filho que havia tido conversas com membros do STF. Nas agendas dos ministros,
não há registros de encontros recentes com o ex-presidente.
As referências do ex-presidente e do deputado
federal aos magistrados aparecem em relatório final de investigação da Polícia
Federal apresentado na quarta-feira (20), que aponta indícios de que os dois
tentaram obstruir o julgamento da trama golpista, atualmente em curso na corte.
A Folha procurou os gabinetes dos 11 ministros e
também a própria assessoria de comunicação do STF. A reportagem perguntou se
eles tiveram encontros ou contatos com Bolsonaro ou seus aliados e
interlocutores, onde e com qual finalidade.
A corte respondeu que não fará comentários sobre o
caso, que está em andamento. Em notas, os ministros André Mendonça, Flávio Dino
e Gilmar Mendes afirmaram que também não se pronunciariam. Os demais não
responderam.
No relatório da Polícia Federal, destacam-se as
menções a Gilmar e Mendonça.
Em 27 de junho, após receber material de seu filho
Eduardo que a PF não conseguiu recuperar, Bolsonaro disse que o conteúdo não
deveria ser compartilhado por ele nas redes sociais, pediu que ele esquecesse
“qualquer crítica ao Gilmar” e afirmou que tinha “conversado com alguns do STF”
e que “todos ou quase todos demonstram preocupação com sanções”.
Dias depois, em 9 de julho, o presidente dos Estados
Unidos, Donald Trump, anunciou o tarifaço contra o Brasil.
Gilmar mantém diálogo com integrantes de núcleo
bolsonarista, que chegaram a tentar organizar um encontro do ex-presidente com
o ministro, mas não tiveram sucesso.
Mendonça, por sua vez, é citado no relatório em
contexto no qual a PF aponta “ação coordenada” entre Eduardo, Jair Bolsonaro e
a defesa de Filipe Martins, ex-assessor de assuntos internacionais do
ex-presidente e também réu no caso da trama golpista, com o objetivo de causar
“tumulto processual”.
Em 10 de julho, Jeffrey Chiquini, advogado de
Martins, apresentou mandado de segurança no STF no qual questionou a atuação do
ministro Alexandre de Moraes no processo, contestou o andamento acelerado, em
sua visão, das investigações a respeito da trama golpista e criticou o veto do
magistrado a depoimentos de testemunhas de defesa do réu.
No sorteio eletrônico do STF, a ação foi distribuída
para Mendonça, o que animou o grupo bolsonarista, já que o ministro é considerado
alinhado com o ex-presidente e é também crítico à visão predominante na corte a
respeito do 8 de Janeiro como tentativa de golpe de Estado.
Dois dias após a ação de Chiquini, Eduardo
encaminhou mensagens a seu pai que diziam que eles tinham a “oportunidade de
mudar a relatoria da trama golpista”, que é de Moraes. “Mendonça pode ficar
prevento das questões [pode assumir as ações] que irão para o plenário. Vitória
gigante hoje. Precisamos que o Mendonça dê essa liminar”, explicavam as
mensagens, cuja autoria a PF não conseguiu rastrear.
Eduardo, então, disse a Bolsonaro que, se Mendonça
admitisse o mandado de segurança, Moraes ficaria como relator dos processos na
Primeira Turma do STF, e o ex-ministro da Justiça do governo de seu pai
assumiria o posto no plenário.
“O advogado Jeffrey Chiquini pede uma liminar para
cancelar audiência que será nesta segunda-feira e para suspender processo da
trama golpista até que se julgue o agravo regimental que suscita nulidade”,
completou.
Para a PF, o diálogo mostra que os Bolsonaros e a
defesa de Martins agiram para subverter a lógica do julgamento no STF. O
relatório destaca que a investigação não identificou indícios de que Mendonça
soubesse das intenções dos investigados. O caso ainda não foi analisado pelo
ministro.
Mendonça já sinalizou a pessoas próximas que a
jurisprudência do STF mostra que mandado de segurança não pode ser usado para
derrubar a decisão de outro ministro e, portanto, considera o pedido da defesa
de Martins juridicamente inviável.
Para Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio,
qualquer contato de ministros do STF com Bolsonaro ou seus aliados seria
“absolutamente inadequado, ainda que o interlocutor não integre a Primeira
Turma, onde ocorre o julgamento” da trama golpista.
“Um ministro não deve se manifestar nem pública nem
privadamente sobre um caso que está pendente de julgamento no tribunal que ele
integra. Sobretudo acerca do efeito das pressões externas feitas sobre o STF,
supostamente causadas por um dos acusados a serem julgados”, afirma Bottino.
Além de Gilmar e Mendonça, somente Moraes é citado
entre os demais ministros do Supremo no relatório. Para a PF, Eduardo e Jair
Bolsonaro atuaram coordenadamente, com o apoio de figuras como o pastor Silas
Malafaia, que foi incluído no inquérito, e o advogado Martin de Luca, que
representa a Trump Media Group e a plataforma de vídeos Rumble nos EUA, para
buscar sanções contra o ministro, coagir o Judiciário brasileiro e impedir
eventual condenação criminal de Bolsonaro.
Eles foram indiciados e podem ser denunciados pela
PGR (Procuradoria-geral da República) pelos crimes de coação no curso do
processo e abolição violenta do Estado democrático de Direito.
Caso seja condenado no caso da trama golpista,
Bolsonaro pode, com base nos tempos previstos em lei, receber uma pena mínima
de 12 anos e meio até uma máxima superior a 43 anos de prisão.
Na ação penal sobre a trama golpista, ele é acusado
de organização criminosa armada, abolição violenta do Estado democrático de
Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio
tombado.
Folhapress
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