Os benefícios das atividades físicas para o cérebro
são objetos constantes de estudo. Já se sabe que exercícios aeróbicos como
caminhar e dançar promovem neuroplasticidade, a habilidade do cérebro de se
reorganizar e formar novas conexões, ativando mecanismos neuroprotetores. Nos
últimos 15 anos, o ato de pedalar se tornou um foco de pesquisa como estratégia
para prevenir e combater sintomas de doenças neurodegenerativas como Parkinson
e Alzheimer. Pesquisas indicam que o exercício tem o potencial de não só
aliviar os sintomas, mas também modificar a progressão dessas doenças.
O status das pedaladas como ação neuroprotetora foi
evidenciado em 2010, quando o neurologista holandês Bastiaan R. Bloem publicou
um relato científico no qual um paciente em estágio avançado de Parkinson, que
tinha sérias dificuldades para andar e sofria de congelamento de marcha,
conseguia pedalar uma bicicleta sem tremores, instabilidade ou congelamento. A
capacidade de pedalar, portanto, parece ser mantida mesmo em estágios avançados
da doença.
O pedalar pode atuar não apenas como tratamento
complementar, mas também como uma estratégia preventiva para pessoas com
predisposição ao Parkinson, segundo John Fontenelle Araújo, professor do
departamento de fisiologia e do programa de pós-graduação em psicobiologia da
UFRN. “Há evidências epistemológicas mostrando que nos países em que a
bicicleta é um dos principais meios de mobilidade urbana, a incidência de
Parkinson é menor”, diz.
Em Natal, Fontenelle faz parte de uma ação de
pesquisa conjunta entre o Laboratório de Neurobiologia Rítmica e Biológica
(LNRB) da UFRN, e o Instituto Santos Dumond (ISD), para compreender os
mecanismos que vão ajudar a criar, no futuro, orientações terapêuticas para o
uso da bicicleta, contribuindo para a melhora da qualidade de vida das pessoas
que sofrem da Doença de Parkinson, entre outras doenças neurodegenerativas.
A relação entre o pedalar e seus efeitos
neuroprotetores, segundo o professor e pesquisador, acontece na forma como o
exercício de movimentos cíclicos melhora naturalmente as condições de saúde dos
praticantes. “Como todo exercício físico, o pedalar promove uma melhora da
função cardiorrespiratória e isto beneficia a condição geral do paciente com
doença neurodegenerativa”, completa.
Fontenelle explica que, durante o exercício de
pedalar, ocorre um processo de estimulação sensorial que se origina nos membros
superiores e promove uma atuação no sistema nervoso central, especialmente no
cérebro, promovendo novas conexões cerebrais – e desta forma, uma neuroproteção
natural. “E quando o ciclismo é realizado ao ar livre, os pacientes acabam
tendo maior interação social, e isto melhora a condição de saúde de pessoas com
doenças neurodegenerativas”, ressalta.
As estratégias terapêuticas envolvendo as pedaladas
devem ser baseadas nas mudanças que ocorrem na atividade cerebral e na marcha
após alguns minutos de exercício em uma bicicleta estacionária. Além de reduzir
os sintomas do Parkinson, pedalar melhora a condição cardiorrespiratória e,
para aqueles que podem se locomover de bicicleta, aumenta a autonomia e a
interação social.
O professor ressalta que os exercícios de
intensidade moderada já são suficientes para se obter os benefícios
neuroprotetores desejados, sem diferença das atividades de intensidade alta.
Mas em especial, no caso da bicicleta, há uma frequencia ideal de frequencia:
“No caso do pedalar, no mínimo três vezes por semanas durante 30 minutos para
cada sessão de exercício”, afirma.
Parkinson
As evidências que indicam o uso regular da bicicleta
como forma de retardar ou atenuar os sintomas iniciais da Doença de Parkinson,
conforme John Fontenelle, já existem e são vários. Segundo ele, o pedalar reduz
agudamente os sintomas motores, em especial o tremor e a rigidez de marcha.
“Pedalar também ajuda na melhoria da cognição dos pacientes, em especial a
tomada de decisão e a estimativa de tempo”, explica. Há também a melhora do
padrão emocional dos pacientes, e também do condicionamento físico,
beneficiando a função cardiorrespiratória.
As pesquisas também envolvem a investigação da
fraqueza muscular, que é comum no Parkinson e está associada à instabilidade
postural e ao aumento do risco de quedas. Estudos mostram que a fraqueza e a
lentidão dos movimentos nas pessoas com Parkinson estão ligadas à
fisiopatologia da doença, incluindo a redução do fluxo de sinais do cérebro
para os músculos.
A Doença de Parkinson é uma condição multifatorial
que afeta cerca de 10 milhões de pessoas em todo o mundo. Ainda sem cura, o
Parkinson compromete diversos sistemas do corpo, causando sintomas motores
(como tremores e rigidez), cognitivos, psiquiátricos e distúrbios do sono. Um
dos maiores desafios é o diagnóstico precoce.
Na maioria dos casos, os sintomas só aparecem quando
50% dos neurônios que produzem dopamina já foram destruídos. À medida que a
doença avança, os problemas de marcha se tornam mais evidentes, com passos
curtos e arrastados, e o bloqueio súbito de movimentos – o chamado
“congelamento de marcha”.
O distúrbio de marcha é bastante incapacitante e os
tratamentos atuais, como medicamentos e a Estimulação Cerebral Profunda, não
são totalmente eficazes para essa condição. Por isso é importante a realização
de novas estratégias complementares para melhorar a qualidade de vida do
paciente e modificar a progressão da doença.
Segundo Fontenelle, o estímulo ao uso da bicicleta –
que também é um objeto de democratização das atividades físicas – é importante
porque melhora a qualidade de vida do paciente não só em relação aos sintomas e
sinais do Parkinson, mas de uma forma geral. “Ao melhorar a qualidade de vida
pelo ato de pedalar, estamos garantindo que este tenha um prolongamento de vida
com saúde”, conclui.
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