Escoar produtos para mercados alternativos pode ser
uma saída para as empresas enfrentarem o tarifaço do
presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Alguns
problemas são apontados, contudo, sobre essa estratégia.
Uma das questões é adaptar os produtos que seriam
direcionados para um lugar às normas do outro, e, mesmo assim, abrir as portas
para novos parceiros comerciais é uma missão que demanda tempo, negociação e
confiança entre as partes, o que, segundo exportadores ouvidos pela reportagem,
torna esta uma alternativa para o médio/longo prazo.
Para os produtores de frutas e suco, há uma questão
ainda “maior”: o volume produzido pelos brasileiros é tão grande que não há
mercado para direcionar estes itens.
“Não dá para, com os volumes que o Brasil produz,
sair com uma sacolinha oferecendo para outros mercados”, pontua Antônio
Pitangui de Salvo, presidente da Faemg (Federação da Agricultura e Pecuária do
Estado de Minas Gerais).
Além disso, se os produtos forem direcionados para o
consumo interno, Guilherme Coelho, presidente da Abrafrutas (Associação
Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados), fala em “uma
quantidade tão grande que vai colapsar o mercado”.
Ariosto da Riva Neto, CEO da marca Xandô e da
processadora Sucorrico, afirma que, “supondo que reduza o consumo dos Estados
Unidos em 50%, são 40 milhões de caixas que o Brasil produziria e que ele deixa
de produzir. A indústria tem como opção ou processar e mandar para outro mercado
ou deixar no estoque, só que hoje não tem mercado para isso. Acho que a opção
vai ser de não processar, o volume é muito grande”.
Importância do mercado norte-americano
10% do suco processado pelo grupo vai mara o mercado
interno nas garrafas da Xandô. Os outros 90% são direcionados às exportações em
forma de suco concentrado congelado ou coprodutos da laranja – óleo da casca e
limoneno, utilizados para aromatizantes, fragrâncias e produtos químicos.
O empresário relata que os parceiros comerciais nos
EUA estão preocupados com a tarifa vindoura contra o Brasil, uma vez que toda
esse cadeia que vai além do suco em si depende dos insumos brasileiros.
A cada 10 copos de suco de laranja bebidos no mundo,
oito são frutos do Brasil. Olhando para a mesa de café da manhã
norte-americana, 70% da laranja consumida por eles veio da produção brasileira,
enquanto 40% do que produzimos é destinado aos EUA.
A indústria de laranja da Flórida já foi mais
expressiva. Contudo, os produtos brasileiros começaram a ocupar o espaço nas
prateleiras por conta de doenças e catástrofes climáticas que praticamente
inviabilizaram a produção na região. De um pico de 280 milhões de caixas, a
cultivação norte-americana caiu a 12 milhões na última safra.
No caso dos agricultores que vendem as próprias
frutas para os EUA, sem processar, há casos em que são feitos lotes especiais
dedicados ao mercado estadunidense.
Há mais de 15 anos, os produtores de manga do
Nordeste colhem os frutos gerados entre a primeira semana de agosto e meados de
outubrio especialmente para mandar aos Estados Unidos.
“Estamos muito preocupados de atingir diretamente os
produtores do Vale do São Francisco, temos a safra da manga para os Estados
Unidos, uma safra planejada por 6 meses”, contou Guilherme Coelho.
O produtor rural, empresário e ex-prefeito de
Petrolina (PE) relata que o planejamento para este momento vai da compra de
embalagens à organização da mão de obra.
Porém, “com esse tarifaço, os exportadores fazem uma
conta de que é inviável pagar. E aí, o que fazer com essa fruta? Começamos
a pensar em alternativas, mas infelizmente as notícias não são boas”, segundo
Coelho.
O presidente da Abrafrutas ressalta que não seria
possível redirecionar a produção para outro mercado por conta das
especificações de embalagens – que além de serem feitas sob medida para cada
mercado, às vezes são sob demanda do próprio importador -, da falta de meios
para realizar essas exportações – o envio requer agendamento de transportes, e
o pânico com o tarifaço já agravou a falta de espaço e tempo nos navios e
aviões – e do fato de os contratos para o curto prazo já estarem todos
concluídos.
Então, buscar mercados alternativos “está
descartado” para Coelho. “Estou temeroso de que a gente termine não conseguindo
nem colher a manga, vamos perder a manga e gerar desemprego.”
Inviabilização de comércio
Valéria Natal, diretora da empresa de bebidas Stock,
conta que seus produtos já estão no mercado norte-americano há quase 10 anos.
Apesar de não ser expressiva, a exportação para os EUA é estratégica por conta
dos padrões de qualidade exigidos. Em essência, a prateleira estadunidense é
uma vitrine.
“Porém, o tarifaço nos atrapalha muito. Nosso
produto já é em torno de US$ 10 mais caro que o concorrente norte-americano, e
para repor o estoque da Amazon com tarifa 50% mais cara é totalmente inviável”,
disse Natal
“Se não for revogado, não faz nenhum sentido para
mim e nenhum empresário brasileiro trabalhar com o mercado americano.
É todo um projeto de médio/longo prazo, um esforço de muitos anos para
entrar nesse mercado que é estratégico, que fica inviável.”
Se o governo não conseguir chegar a um acordo com
Washington, os EUA devem começar a aplicar, a partir do dia 1º de
agosto, uma alíquota de 50% contra os importados brasileiros.
Um exportador de laranjas ouvido anonimamente pela
reportagem diz que, como o cenário é incerto e “cada dia que passa é uma
caixinha de surpresa”, segue “esperando para ver”. Até o momento, não planeja
nenhum contingenciamento, aguardando por uma saída.
Saídas para o tarifaço
Um pleito levado pela Abrafrutas ao governo, nas
reuniões interministeriais chefiadas pelo vice-presidente Geraldo Alckmin
(PSB), é que o Executivo peça a Trump a isenção dos alimentos, considerando que
o tarifaço “não é concebível, não é razoável, não é justo e não é humano”,
segundo Guilherme Coelho.
“Um mundo hoje que tem tanta insegurança alimentar,
pessoas que tomam café e nem sabem o que vão almoçar, ao tarifar o alimento, lá
nos Estados Unidos o preço do café vai pipocar, do suco de laranja, da fruta,
da carne”, pontua o presidente da entidade.
“Não é razoável aqui também, onde vamos ter
desemprego em massa, empresas entrando em sérias dificuldades financeiras e
manga estragando no pé, é simples assim.”
Para o empresário Ariosto da Riva Neto, um caminho
para estimular a demanda no mercado interno e abrir espaço para os produtos
aqui dentro é a redução de carga tributária.
“Nós temos uma carga tributária bastante grande, um
terço do produto que a gente vende é imposto: ICMS, Pis/Cofins, um valor
importante. Ao reduzir a carga tributária no Brasil, para que os preços ao
consumidor sejam reduzidos, incentivando a demanda, a fruta que deveria ir pra
exportação, que será perdida, tem chance de ser processada e consumida no
país”, indica o CEO da Xandô.
Fonte: CNN Brasil
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