Aprovado na madrugada do último dia 17 pela Câmara
dos Deputados, o Projeto de Lei 2159/2021 estabelece um novo marco legal para o
licenciamento ambiental no Brasil. Com novas categorias de licença, prazos
definidos para análise dos pedidos e maior autonomia para estados e municípios,
o texto aguarda sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O setor
produtivo do Rio Grande do Norte avalia que a proposta representa um avanço
para destravar investimentos e garantir mais previsibilidade nos processos.
Entre outras proposições, o projeto cria a Licença
por Adesão e Compromisso (LAC), que poderá ser concedida com base em
autodeclaração do empreendedor, e a Licença Ambiental Especial (LAE), voltada a
empreendimentos estratégicos. Também flexibiliza a exigência de Estudos de
Impacto Ambiental (EIA) em alguns casos, autoriza a emissão de licenças únicas
ou corretivas para atividades em operação sem autorização e estabelece prazos
entre 3 e 10 meses para análise, dependendo do tipo de licença.
Além disso, o texto aprovado dispensa o
licenciamento para determinadas atividades, como obras de manutenção em
estruturas já existentes, empreendimentos militares e práticas agropecuárias
com propriedades regularizadas no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Também retira
a necessidade de manifestação de órgãos como Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Fundação Nacional dos Povos Indígenas
(Funai) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) quando
não houver impacto direto em seus campos de atuação, desde que respeitado o
prazo máximo de 45 dias para resposta.
As mudanças propostas no novo marco do licenciamento
ambiental repercutem de forma direta na indústria potiguar, especialmente nos
segmentos que lidam com obras estruturantes, uso de recursos naturais e
instalação de empreendimentos de médio e grande porte. Com a introdução de
novas categorias de licença, como a LAC e a Licença Ambiental Única (LAU), além
de prazos mais definidos para análise e menor exigência de estudos complexos em
determinadas situações, o setor produtivo enxerga um cenário mais claro e
favorável à atração de investimentos e à viabilização de projetos que antes
esbarravam na lentidão e na burocracia dos processos.
A Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande
do Norte (Fiern) avalia que o novo marco representa um ganho de clareza,
segurança jurídica e agilidade. “Considero como um avanço importante para o
país, porque traz regras mais claras e proporcionais ao risco ambiental. Além
disso, amplia a previsibilidade e segurança jurídica e simplifica processos
para atividades de menor impacto”, afirma o presidente da instituição, Roberto
Serquiz.
Segundo ele, setores como energias renováveis,
mineração, petróleo e gás, indústria manufatureira, fruticultura, pescado e
salineira devem ser diretamente beneficiados com a nova configuração legal. Um
dos exemplos citados é a exploração dos campos maduros de petróleo, que poderão
migrar para a LAU – Licença Ambiental Única. “São áreas já exploradas pelo homem
que, com a nova legislação, poderão migrar para LAU, simplificando o processo
de licenciamento, dando maior agilidade”, acrescenta.
A LAC também deve beneficiar especialmente os
pequenos empreendimentos industriais, de acordo com Serquiz. “Essa modalidade
de licença irá beneficiar, especialmente, as micro e pequenas empresas dos mais
diversos segmentos. Entre eles, é possível destacar o segmento de corte e
costura, o setor fotovoltaico, o de alimentos, entre outros”, afirma.
Ele ressalta ainda que a ausência de prazos
definidos era um entrave histórico. “Hoje não há estimativa, não há prazo
definido. Essa queixa é recorrente em vários setores. De fato, com a nova
legislação, poderemos ter essa previsibilidade – o que será um ganho de extrema
importância para o desenvolvimento do Estado”, completa o presidente da Fiern.
Agro prevê licenciamento mais flexível
As atividades agropecuárias também estão entre as
diretamente impactadas pelo novo marco legal. O texto aprovado prevê a dispensa
de licenciamento para práticas como cultivo de espécies agrícolas e pecuária
extensiva, desde que a propriedade esteja regular no Cadastro Ambiental Rural
(CAR). Já atividades de médio porte, como a pecuária intensiva, poderão ser
licenciadas por meio da LAC, reduzindo etapas e acelerando o trâmite. A
proposta atende a uma antiga demanda do setor rural por desburocratização,
conforme explica a Federação da Agricultura e Pecuária do RN (Faern).
“Representa um avanço na política ambiental, com uma
visão mais compatível com a realidade atual, em que a tecnologia via satélite
permite aos órgãos monitorar com precisão as intervenções no meio ambiente. A
nova lei desobriga os produtores rurais de obter licenciamento ambiental para
determinadas atividades, uma vez que elas já são controladas por meio do CAR”,
afirma o presidente da Faern, José Vieira.
Segundo ele, atividades como a pecuária intensiva de
até 500 hectares e com até 1.500 animais poderão se beneficiar diretamente da
Licença por Adesão e Compromisso (LAC). “Esse tipo de licença já vem sendo
adotado pelo Estado de Goiás e tem se mostrado eficiente tanto para a
administração ambiental quanto para os empreendedores”, sublinha Vieira. Ele
considera que a burocracia se tornou um obstáculo ao desenvolvimento rural. “É
um sentimento generalizado entre os setores produtivos. Essa nova lei surge
justamente para dar agilidade ao processo, sem prejuízo do controle exercido
pelos órgãos competentes, o que resultará em um ambiente de negócios mais
atraente para os investidores”.
Construção civil projeta mais segurança
jurídica
Para o presidente do Sindicato da Indústria da
Construção Civil do RN (Sinduscon-RN), Sérgio Azevedo, as mudanças trazem maior
segurança jurídica e reduzem incertezas para empreendimentos urbanos e de
infraestrutura. “O Sinduscon-RN considera as mudanças aprovadas um avanço
necessário para destravar o desenvolvimento do país. A legislação atual
tornou-se um gargalo para o setor produtivo, com exigências muitas vezes
desconectadas da realidade”, analisa.
De acordo com ele, empreendimentos como duplicações de rodovias, linhas de
transmissão e projetos de saneamento poderão se beneficiar diretamente da LAC.
Azevedo também destaca que obras estruturantes do Rio Grande do Norte, como
corredores de mobilidade e conjuntos habitacionais, poderão entrar na categoria
de empreendimentos estratégicos, com acesso à Licença Ambiental Especial.
“A previsibilidade é um fator essencial para atração
de investimentos. Reduzir o tempo de espera por manifestações e permitir que a
autoridade licenciadora priorize obras estratégicas cria um ambiente de maior
confiança para empreendedores e financiadores”, diz o presidente do
Sinduscon-RN.
Idema quer fortalecer as fiscalizações
Para os órgãos ambientais do Rio Grande do Norte, o
novo marco legal é visto com cautela. Embora as mudanças tenham potencial para
tornar os processos mais ágeis, a flexibilização de etapas e o uso ampliado da
autodeclaração por parte dos empreendedores exigirão maior capacidade técnica e
operacional do poder público. Uma das principais preocupações, segundo o
Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN (Idema), é com o
fortalecimento da fiscalização, que passará a ter papel ainda mais central na
proteção efetiva do meio ambiente diante dos novos instrumentos legais.
“Ainda é cedo para poder fazer uma avaliação, um
pronunciamento mais técnico relacionado a essa aprovação, porque, inclusive, o
texto consolidado ainda não chegou na mesa do Presidente da República para
apreciação de sanção, veto parcial, veto integral, ou tampouco para o controle
de constitucionalidade por parte do STF”, disse Thales Dantas, diretor-técnico
do Idema.
Dantas ressalta ainda que o novo cenário exigirá
adaptações. “Isso nos coloca esse desafio, porque no texto tem algumas licenças
que nós não temos, por exemplo, aqui no Rio Grande do Norte ou em outros
estados, que é uma Licença Ambiental Especial voltada a projetos considerados
estratégicos”.
“O que nos coloca como preocupação é que, toda vez
que existe uma flexibilização na parte do licenciamento, de fato aumenta a
responsabilidade do poder do estado de exercer seu papel de polícia, de
fiscalização”, analisa Thales.
Semurb: lei deve respeitar a realidade
local
A Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal
(Semurb) avalia que o novo marco do licenciamento traz avanços, mas alerta para
a necessidade de respeitar as especificidades locais. “O novo marco legal do
licenciamento ambiental pode trazer avanços importantes na busca por celeridade
processual, especialmente ao estabelecer prazos definidos, ampliar o uso de
licenças simplificadas e permitir procedimentos baseados em autodeclaração para
atividades de menor impacto”, diz o secretário Thiago Mesquita.
No entanto, o secretário acrescenta que a realidade
urbana da capital potiguar exige cuidados adicionais. “Nosso território é quase
totalmente urbanizado ou consolidado, e não abriga atividades como mineração,
grandes obras de infraestrutura energética ou exploração em larga escala, que
são o foco de parte substancial das alterações previstas no PL”.
A secretaria destaca que já utiliza um modelo de
licenciamento autodeclaratório com base em um decreto municiapal (nº
12.789/2023). “A lógica da LAC já está incorporada à prática da Semurb, e a
eventual adoção da modalidade federal deverá ser feita por meio de
compatibilização normativa, com o cuidado de respeitar a realidade local”,
afirma o secretário.
Tribuna do Norte
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