Não importa a decisão do ministro Alexandre de
Moraes, do Supremo Tribunal Federal, nesta terça-feira, 15: as empresas já se
preparam para recorrer à Justiça contra o aumento da tributação do Imposto
sobre Operações Financeiras (IOF), defendido pelo governo Lula.
Moraes media nesta terça a primeira reunião de
conciliação entre Legislativo e Executivo no impasse do IOF. O governo aumentou
as alíquotas do imposto e o Legislativo suspendeu a decisão por meio de um
decreto legislativo, alegando que o Executivo usa um imposto de caráter
regulatório para aumentar a arrecadação. Inconformado, o Executivo recorreu ao
Supremo, que agora dará a palavra final sobre a legalidade da cobrança.
O núcleo da discussão é sobre se o governo pode usar
o IOF de forma arrecadatória ou se isso extrapola a função do tributo, como
alega o Legislativo. Ao anunciar o aumento do imposto, a equipe econômica
informou que previa arrecadar R$ 20 bilhões neste ano, o que ajudaria a fechar
as contas. Com a resistência do setor privado, o decreto foi alterado; mas,
ainda assim, a expectativa de receita era de R$ 12 bilhões.
Assim, a ação de empresas contra a medida pode
atrapalhar os planos do governo na arrecadação do imposto.
Em entrevista ao Estadão, o número 2 da Fazenda,
Dario Durigan, disse que o objetivo do governo é regulatório e que a
arrecadação era uma consequência secundária - tese que o governo defenderá na
Corte.
Na semana passada, líderes partidários da Câmara e
do Senado sinalizaram uma via de acordo em que aceitavam um aumento do IOF
desde que o governo reduzisse a tributação, deixando clara a intenção meramente
regulatória. Nesta segunda-feira, 14, o chefe da Casa Civil, Rui Costa, fez uma
declaração sugerindo que o governo não está aberto a acordos.
Empresas e tributaristas a postos
Seja a decisão pró-governo ou pró-Legislativo,
tributaristas a serviço do setor privado já estão preparados para recorrer à
Justiça em nome de empresas dos mais variados setores.
“Independentemente do deslinde final, cabe medida
judicial em ambos os casos”, afirma o tributarista Menndel Macedo, do
escritório Mendel e Melo Associados.
Ele afirma que, caso seja acolhida a tese do
governo, de que é constitucional a cobrança do IOF, haverá uma série de ações
na Justiça questionando a cobrança de IOF sobre operações de “risco sacado”.
Essas operações são muito comuns entre empresas e
seus fornecedores e consistem na antecipação de pagamentos a fornecedores. Até
o momento, essa operação não era caracterizada como crédito e não recolhia
imposto. No decreto do IOF, o governo estipulou que se trata de uma operação de
crédito e que, assim, vale a tributação.
“O Executivo tentou empurrar por meio de um decreto
um novo fato gerador, uma nova constituição de incidência de IOF sobre o risco
sacado. Só que, para instituir um tributo e um fato gerador, é necessário uma
lei complementar ou ordinária; ele não pode fazer isso por meio de decreto”,
afirma Menndel.
Segundo ele, cada empresa afetada pela tributação
poderá recorrer à Justiça alegando que houve desvio no princípio da legalidade
estrita e na competência do Executivo ao estipular a tributação.
“O objetivo é não incidir IOF sobre o risco sacado
independentemente do resultado da decisão sobre se o decreto presidencial é ou
não é constitucional. O fato é que empurraram um ‘jabuti’ tentando emplacar a
tributação sobre o risco sacado”, diz Menndel. “É possível requisitar que sejam
reavidos os recursos tributados no risco sacado desde o início do processo de
tributação”.
O sócio tributarista do Mattos Filho Advogados,
Eduardo Melman Katz, tem a mesma opinião e avalia que o governo deverá apostar
em uma redução maior da alíquota sobre o risco sacado para desestimular a
litigância - a Fazenda já fez um recuo em relação ao primeiro decreto, baixando
a tributação, após pressão do setor financeiro. Ainda assim, diz ele, muitas
empresas terão apetite de recorrer à Justiça devido ao alto volume de operações
feitas com fornecedores.
“Ainda que o resultado da negociação (entre governo
e Legislativo) seja reduzir a carga sobre o risco sacado, há uma tendência de
as empresas a irem à Justiça alegando que a cobrança não poderia ter vindo por
decreto”, disse.
Segundo ele, o varejo e todos os ramos industriais,
do químico ao alimentício, utilizam da modalidade de antecipação de pagamento a
fornecedores e são afetados pela tributação.
“O risco sacado impacta toda a economia; a prática
de antecipação de recebíveis é comum no mercado e é muito disseminada”, afirma.
Muitas empresas já entraram na Justiça questionando
a tributação, mas deverá haver nova onda após a decisão final do STF, preveem
os advogados ouvidos pelo Estadão. Isso porque a taxação está paralisada neste
momento por decisão do STF e, assim, não há efeito nocivo a se comprovar. Mas,
assim que acionada novamente a cobrança, companhias deverão recorrer
individualmente na primeira instância da Justiça federal contra o IOF.
A segunda hipótese é o STF declarar inconstitucional
o decreto presidencial que elevou o IOF, o que não é o cenário base dos
tributaristas. Ainda assim, é passível de recurso para reaver o que foi pago a
mais durante a vigência da cobrança do IOF. Como mostrou o Estadão, o governo
arrecadou R$ 2 bilhões com a majoração do imposto antes que o Supremo
congelasse a cobrança.
Menndel afirma que, embora a decisão sobre a
constitucionalidade seja de caráter vinculante - ou seja, válido para todas as
empresas -, será necessário recorrer à Justiça para restituir os valores.
“Na esfera administrativa (recorrendo à Receita
Federal), isso pode levar anos. A medida mais efetiva é ir direto ao Judiciário
questionando a ilegalidade da cobrança”, afirma o tributarista.
Katz, do Mattos Filho, afirma que o recurso à
Justiça, neste caso, deve ocorrer apenas se a Receita dificultar a restituição
em um primeiro momento.
“Como esse tipo de ação declaratória tem caráter
vinculante, a Receita não deveria se opor em fazer a restituição; mas, se
colocar obstáculos ou entraves para atrasar o pagamento, a empresa pode
recorrer à Justiça”, disse Katz.
Segundo ele, muitas empresas seguraram operações de
risco sacado nas últimas semanas aguardando o desfecho do impasse do IOF e
recorreram a alternativas para antecipar o pagamento a fornecedores usando até
fundos de direitos creditórios (FIDCs) para essa finalidade.
Estadão
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