O governo Lula (PT) omitiu durante oito meses
informações sobre a distribuição bilionária de honorários advocatícios pagos
aos integrantes das três carreiras que compõem a Advocacia-Geral da União
(AGU). Os dados pararam de ser publicados em novembro passado e só voltaram a
ser atualizados nesta quarta-feira (16), após questionamentos da reportagem.
Desde dezembro passado, esses honorários somam R$
2,5 bilhões. Os dados publicados no Portal da Transparência só vão até maio
deste ano.
Como servidor de carreira da AGU desde 2006, o chefe
da AGU, o ministro Jorge Messias, tem direito aos honorários advocatícios.
Na última rodada de dados publicados pelo Portal da Transparência, referentes
ao mês de maio de 2025, Messias recebeu R$ 21.096,23 em honorários.
Ou seja, sob Jorge Messias, a AGU manteve em sigilo
durante meses os pagamentos recebidos pelo próprio ministro. Até então, os
dados eram divulgados mensalmente.
A interrupção da divulgação das informações também
contraria o discurso de campanha de Lula nas eleições de 2022. Na ocasião, o
petista afirmou que faria um “revogaço” dos sigilos impostos na gestão do
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
No último mês disponível no Portal da Transparência
até então, ou seja, outubro de 2024, 33 pessoas receberam mais de R$ 100 mil em
honorários. Um servidor, Marcos da Rocha, recebeu R$ 517.008,39. Outra, Maria
da Conceição Carvalho do Prado, recebeu R$ 496.278,49.
Em maio deste ano, o maior pagamento foi a uma
servidora chamada Regina Lucia Lopes Jaguaribe Haguette, no valor de R$
478.701,19.
Além dos honorários em si, uma mudança recente nas
regras também contribuiu para a elevação dos rendimentos dos integrantes da
AGU: o pagamento do terço adicional de férias passou a considerar também o
montante recebido em honorários. Ou seja, para fins de terço de férias, os
honorários são parte do salário.
O sigilo imposto pela AGU na gestão de Jorge Messias
coincide com a adoção da bandeira contra os supersalários pelo governo Lula
(PT).
Nesta semana, a bancada petista na Câmara apresentou
um projeto de lei para coibir a multiplicação dos “penduricalhos”, adicionais
que inflam os rendimentos de alguns servidores públicos, principalmente no
Judiciário. Recentemente, a deputada federal Tábata Amaral (PSB-SP) viralizou
nas redes sociais com um vídeo sobre o tema.
No discurso, governo defende cortar
supersalários
A distribuição elevada de honorários sigilosos na
AGU coincide também com um momento de dificuldade, da parte do governo, para
equilibrar as contas públicas.
A última crise a atingir o governo Lula (PT) seu deu
por conta da derrubada, no Congresso, de um decreto presidencial que pretendia
elevar as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).O assunto foi
parar no Supremo Tribunal Federal (STF), e é uma das apostas do ministro
Fernando Haddad (Fazenda) para fechar as contas deste ano.
Os honorários dos advogados da União são
distribuídos pelo Conselho Curador dos Honorários Advocatícios (CCHA), uma
entidade sem fins lucrativos criada por lei e vinculada à AGU. No ano passado,
o CCHA recebeu R$ 3,84 bilhões. Desde fevereiro de 2017, recebeu R$ 15,8
bilhões da União.
Honorários são uma espécie de prêmio pago aos
advogados quando vencem uma ação judicial – neste caso, trata-se de processos
nos quais a União era parte, representada por um advogado público da AGU. O
valor é rateado entre os cerca de 8 mil integrantes das carreiras da AGU,
inclusive aposentados.
Procurado, o CCHA disse que a publicação das
informações parou de ser feita por “incompatibilidades técnicas” entre os
sistemas da entidade e da Controladoria-Geral da União (CGU), que mantém o
Portal da Transparência.
Disse ainda que os dados “já foram enviados” e que
CGU e CCHA estão trabalhando para “viabilizar a correta publicação das
informações, o que deve acontecer nos próximos dias” (leia mais abaixo). A
entidade não deu prazo para voltar a publicar as informações.
À coluna, Messias disse que determinou à própria AGU
que passe a publicar os valores dos honorários, enquanto os montantes não
estiverem disponíveis no Portal da Transparência. “Não podemos aceitar não ter
transparência”, disse ele.
No entanto, até o momento, as informações não estão
disponíveis no site do órgão. A página da AGU na internet até inclui
uma aba sobre os honorários advocatícios, mas o link direciona para a
página inicial do Portal da Transparência, onde os dados pararam de ser
publicados em dezembro.
AGU: Informações estão com CCHA
Procurada, a AGU disse que a publicação das
informações sobre os honorários advocatícios é “de responsabilidade exclusiva
do CCHA” e que informações pessoais de Jorge Messias e de outros membros da AGU
devem “ser consultadas diretamente no Portal da Transparência”.
Leia abaixo a íntegra da resposta da AGU:
“Segundo a previsão do art. 27 da Lei n°
13.327, de 29.7.2016, os ‘honorários advocatícios de sucumbência das causas em
que forem parte a União, as autarquias e as fundações públicas federais
pertencem originariamente aos ocupantes’ de cargos jurídicos da Advocacia-Geral
da União (AGU).”
O atual advogado-geral da União, Jorge
Messias, é também procurador da Fazenda Nacional, concursado, desde 2006.
As informações pessoais relativas à
remuneração do Advogado-Geral, assim como de todos os demais membros da AGU,
devem ser consultadas diretamente no Portal da Transparência do Governo Federal,
cuja atualização é responsabilidade do próprio Conselho Curador dos Honorários
Advocatícios (CCHA) e da Controladoria-Geral da União (CGU).
As decisões relacionadas à autorização
de pagamento, critérios de distribuição e à natureza das verbas — sejam elas
ordinárias ou referentes ao reconhecimento de direitos não pagos dentro do
prazo — são de responsabilidade exclusiva do CCHA, conforme previsão do art.
34, caput e incisos I a V, da Lei nº 13.327, de 2016.
Dessa forma, sobre honorários, as
informações devem ser solicitadas diretamente ao CCHA”.
CCHA: pagamentos voltarão a ser públicos
nos próximos dias
Procurado, o Conselho Curador dos Honorários
Advocatícios (CCHA) disse que a publicação das informações foi suspensa por
“incompatibilidades técnicas” entre os sistemas da entidade e do Portal da
Transparência, mantido pela Controladoria-Geral da União (CGU). Ainda segundo o
CCHA, a publicação das informações deve voltar a ser feita nos próximos dias.
Leia abaixo a íntegra da manifestação do CCHA:
“Com a implementação de um novo modelo
de detalhamento das informações, mais preciso e transparente, foram
identificadas incompatibilidades técnicas entre os sistemas do Conselho Curador
dos Honorários Advocatícios (CCHA) e os sistemas atualmente utilizados pela Controladoria-Geral
da União (CGU).
Apesar disso, os dados já foram
devidamente enviados, e ambas as instituições estão trabalhando conjuntamente
na parametrização e adequação dos sistemas, a fim de viabilizar a correta
publicação das informações, o que deve acontecer nos próximos dias.”
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