Gastança de Brasília se espalha pela Federação
Quando se analisa a situação das contas públicas, o
foco da preocupação se direciona ao governo federal —e por boas razões.
Trata-se, de longe, do maior ente da economia, capaz
de se apropriar de um quinto da renda nacional, por meio de impostos e
contribuições sociais, e de gastar ainda mais, dada sua elevada capacidade para
obter crédito no mercado.
Só os títulos vendidos pelo Tesouro Nacional somam
hoje o equivalente a 52,5% do Produto Interno Bruto, mais de dois terços da
exorbitante dívida pública do Brasil, de 75,3% do PIB.
Assim como as despesas da União podem afetar toda a
demanda do país, com transferências de recursos a famílias ou compras de
produtos e serviços de empresas, os juros dos papéis federais servem de base
para as demais taxas do mercado.
Tudo isso considerado, há motivos para dedicar maior
atenção aos gastos de estados e municípios —que avançam sem os limites
existentes em âmbito federal.
Segundo cálculos do economista Bráulio Borges,
colunista da Folha, os desembolsos dos governos regionais somaram R$ 645
bilhões por trimestre, em média, no ano passado, enquanto os realizados
diretamente pelo Tesouro Nacional ficaram em R$ 508 bilhões, como mostra série
de reportagens neste jornal.
Os primeiros tiveram aumento de 26% acima da
inflação desde 2019, ante 5% dos segundos.
Note-se, porém, que grande parte da gastança
estadual e municipal tem origem em Brasília, por meio de decisões temerárias do
Executivo e do Legislativo.
Pela Constituição, parcelas fixas da arrecadação
federal são transferidas aos demais entes federativos. Logo, quando a União
eleva impostos, como o fez sob Luiz Inácio Lula da Silva (PT), governadores e
prefeitos ganham mais dinheiro para gastar.
Tais repasses foram majorados nos últimos anos, como
se deu na ampliação do Fundeb, o fundo de financiamento da educação básica.
Ademais, o Congresso Nacional determinou um generoso socorro financeiro às
administrações regionais durante a pandemia.
Deputados e senadores aprovaram programas sucessivos
de renegociação de dívidas estaduais, o mais recente deles foi sancionado em
janeiro. O governo Lula também propagandeou o crédito de bancos públicos aos
parceiros da Federação.
Por fim, caixas de governos estaduais e prefeituras
foram reforçados nos últimos anos pela multiplicação desmesurada de emendas
parlamentares, que ainda por cima não preenchem requisitos de prioridade e
transparência.
Em quaisquer desses casos, o erro não está na
divisão de recursos e atribuições, que é a base do sistema federativo. O
problema é a escassez de controles sobre as finanças regionais, que se resumem
a limites de endividamento e de gastos com pessoal como proporção da receita, e
a pouca disposição para a disciplina fiscal que emana de Brasília.
Editorial Folha de São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário