A ministra da guerrilha
Gleisi Hoffmann é cogitada por Lula a deixar o
comando do PT para ocupar a Secretaria-Geral da Presidência – um agrado à
esquerda e ao partido e uma afronta a Haddad e aos moderados
A repórter Vera Rosa informou neste jornal que a
presidente do PT, Gleisi Hoffmann, ocupará a Secretaria-Geral da Presidência,
compondo a equipe do presidente Lula da Silva a partir da reforma ministerial.
Oficialmente, entre as atribuições da pasta liderada atualmente pelo ministro
Márcio Macêdo, está a interlocução do governo com os movimentos sociais,
incluindo centrais sindicais, organizações como o MST, sindicatos e ONGs.
Só oficialmente. Na prática, o provável embarque de
Gleisi na Secretaria, passando a dar expediente diário no quarto andar do
Palácio do Planalto, significa tudo menos a desejável melhora na qualidade da
equipe ministerial de Lula. Não há meio-termo em relação a ela: Gleisi será a
ministra da cisão enquanto o governo precisa de união, ou a porta-voz do
desmonte, quando se requer reconstrução.
Só o convite feito a Gleisi representa mais do que a
disposição do presidente em ter no Palácio uma petista radical, dando
musculatura adicional a um grupo no qual se inclui o chefe da Casa Civil, Rui
Costa, e o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha – isso num
momento em que se esperaria de Lula e do PT um maior compartilhamento do poder
com outros partidos que formam a coalizão governista.
Se ministra for, Gleisi pode tornar-se ainda um
símbolo de mais um constrangimento imposto ao ministro da Fazenda, Fernando
Haddad. Afinal, ela tem sido um ruidoso e virulento contraponto a Haddad e a
qualquer premissa de responsabilidade fiscal. Coube a ela liderar o levante
petista contra o próprio governo, aprovando um documento do partido que
classificou a política fiscal de “austericídio” – uma pressão que, com a
chancela do presidente Lula, desmontou qualquer esforço do ministro da Fazenda
e da ministra do Planejamento, Simone Tebet, de pôr ordem nas contas do
governo.
O arsenal de Gleisi é vasto e vai além dos ataques a
Haddad. A ex-ministra da Casa Civil de Dilma Rousseff costuma funcionar como
uma espécie de braço retórico armado de Lula da Silva. É nessa condição que
frequentemente despeja declarações furiosas contra o Banco Central (pelo menos
enquanto a instituição era presidida pelo inimigo preferencial dos petistas,
Roberto Campos Neto), o mercado financeiro, o mundo corporativo, o agronegócio,
o Congresso, a direita (inclusive a direita que não se enquadra no bolsonarismo
fundamentalista), Israel, os evangélicos, a imprensa profissional e, agora, o
presidente dos EUA, Donald Trump.
Por outro lado, revela-se uma afável defensora de
Nicolás Maduro, de Cuba e do Partido Comunista Chinês – aos quais costuma
bajular enviando missões do PT ou indo pessoalmente para trocas que decerto
geram dividendos políticos à esquerda de linhagem lulopetista e constrangimento
ao restante do Brasil.
Com tais atributos, resta entender a natureza do
convite feito por Lula a um nome que afrontou, desautorizou e deslegitimou seu
ministro da Fazenda, mesmo sabendo que inexiste na história um governo forte
com um ministro da Fazenda fraco; que Gleisi exibe um modus operandi de
guerrilha contra tudo e contra todos que poderiam inspirar o governo a um
padrão mínimo de racionalidade e eficiência; e que a presidente do PT tem como
único mérito a defesa implacável de Lula, na alegria e na tristeza. Eis aí a
natureza da possível escolha: agradar à esquerda do PT e resolver um problema
do partido.
Instalar Gleisi numa pasta do governo significa
tirar dela o comando do processo eleitoral que escolherá, no fim de junho, o
novo presidente do partido. O favorito de Lula, o ex-ministro e ex-prefeito de
Araraquara Edinho Silva, é visto por Gleisi como um nome indesejável. O defeito
de Edinho, na visão de Gleisi, é ser moderado, ter bom trânsito no mercado
financeiro e em outros partidos e ser próximo de Haddad. Uma vez ministra, ela
deixará o posto que ocupa desde 2017, substituída por um mandato-tampão até a
eleição petista.
Eis aí uma artimanha tipicamente lulista – para o
bem do PT e a ruína do País.
Opinião do Estadão
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