Crime ambiental previsto na legislação brasileira, a
captura e comercialização de aves silvestres segue dando dor de cabeça para
agentes ambientais, biólogos e pesquisadores da fauna nacional. No Rio Grande
do Norte não é diferente. Desde 2019, foram 7.575 aves resgatadas no Estado,
incluindo apreensões e entregas voluntárias. Na semana passada, uma operação
integrada entre o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e Polícia
Rodoviária Federal apreendeu 95 aves silvestres numa feira livre na Cidade da
Esperança, zona Oeste de Natal.
Segundo dados da Rede Nacional de Combate ao Tráfico
de Animais Silvestres (Renctas), estima-se que 38 milhões de animais são
traficados no Brasil por ano. As aves representam mais de 80% desses animais,
segundo estimativas de ONGs de proteção animal.
O órgão classifica os dados em três contextos: resgates, apreensões e entregas
voluntárias. Segundo dados do Ibama enviados a pedido da TRIBUNA DO NORTE, de
2019 a novembro de 2024, as apreensões somaram 4.897, ou seja, 65% dos
resgates. As entregas voluntárias somaram 436 e os resgates 2.057. Chama
atenção o seguinte fato: em 2024, o Ibama registrou apenas 116
resgates/apreensões (sem contar as apreensões da Operação Mercatio).
“Em setembro
de 2023, o Centro de Triagem de Animais Silvestres do RN (Cetas-RN) foi
fechado, com as atividades redirecionadas a órgãos estaduais e aos Cetas do
Ceará e da Paraíba. O número de pássaros apreendidos/resgatados pelo Ibama em
2024 foi de 116, mas esse quantitativo deve ser maior, visto que, nessa
contagem, não estão contemplados os animais que, porventura, tenham sido
atendidos diretamente no âmbito estadual”, justificou o órgão.
No último domingo, o Ibama e a PRF deflagraram a
Operação Mercatio, que chamou a atenção pela quantidade de aves apreendidas e
pessoas detidas, que foram seis ao todo. Entre as aves resgatadas estavam
azulões, galos-de-campina e cambacicas, além de espécies ameaçadas como o
verdelinho e o tuim. As aves em condições de soltura foram devolvidas ao seu
habitat natural, enquanto as debilitadas foram encaminhadas ao Centro de
Triagem de Animais Silvestres (CETAS) da Paraíba para tratamento especializado.
Historicamente, no Brasil, as aves mais apreendidas
são coleiros e papa-capins, cardeal-do-nordeste, trinca-ferro,
canário-da-terra, pássaro-preto, galo de campina e azulão. No RN, são seis
agentes que atuam no trabalho de fiscalização, número considerado bem abaixo
por profissionais do Ibama.
“Esse número é alto mas infelizmente ele é somente
uma pequena amostra do que realmente acontece porque a nossa capacidade é
limitada, nossos recursos, tanto humanos quanto de abrangência para atingir
todo o RN dado ao volume de ações que temos que atender, pois o Ibama tem a
parte de recursos marinhos, florestais, genéticos e a quantidade de servidores
é pequena, então não conseguimos estar presentes para esse tipo de ação o tempo
todo, então esse número que chega no Ibama é uma pequena amostra”, explica o
coordenador da operação e agente ambiental federal, Tadeu Oliveira, que atua no
Ibama há 22 anos.
“Como uma pessoa que tenho uma ideologia ambiental é
difícil para mim compreender esse tipo de situação, as pessoas dizem que é uma
questão cultural, mas a gente percebe que a maioria das pessoas sabe que a
criação de aves é errado e mesmo assim cometem. É algo difícil de compreender”,
acrescenta.
Segundo agentes ambientais ouvidos pela TN, na maior
parte dos casos as aves silvestres são encontradas com patas ou asas feridas,
mutilações e se alimentando de maneira inadequada. No mercado ilegal, fatores
como ameaça de extinção, idade e canto elevam o valor dos pássaros. Ainda
segundo o Ibama, historicamente, os municípios com o maior número de apreensões
são Jardim de Piranhas, João Câmara, Macaíba, Macau, Mossoró, Natal, São
Gonçalo do Amarante e Taipu.
“Encontramos esses animais em várias situações,
desde recém-capturados, bravos e se debatendo dentro das gaiolas querendo sair.
Então já tivemos situações da fiscalização se deparar com animais recém
capturados naquele ambiente, com aqueles viajantes e armadilhas. Nessa situação
a legislação diz que o animal pode ser solto no próprio local para não precisar
trazer para o Ibama, evitar se misturar com outros. Há situações também de
feiras em que o bicho fica mal armazenado, mal acondicionado, alimentação
inadequada. Nessas situações de tráfico e venda o que menos importa é o bem
estar do bicho para o vendedor”, explica o analista ambiental, Ronaldo Douglas
Pereira.
Ação judicial pede centro de triagem de
animais
Nessa semana, o Ministério Público Federal (MPF)
ajuizou uma ação civil pública contra o estado do Rio Grande do Norte, a União,
o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema) e o
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama). A ação cobra a criação de um centro estadual de triagem de animais
silvestres e a melhoria do centro federal já existente, o Cetas, ligado ao
Ibama. O centro federal foi fechado em setembro do ano passado para reforma,
mas não há prazo para reabertura do espaço.
O Cetas vinha recebendo, em média, 2.800 animais por
ano, provenientes de fiscalizações, entregas voluntárias ou resgates. Porém o
local sofre com falta de espaços adequados e de recursos humanos. Isso
atrapalha as ações fiscalizatórias, pois não impede que os animais silvestres
continuem a enfrentar sofrimentos e até venham a morrer, por falta da
assistência adequada.
Em nota enviada à TRIBUNA DO NORTE, o Instituto do Desenvolvimento e Meio
Ambiente do RN (Idema) disse que a Procuradoria Geral do Estado (PGE) tem
entendimento divergente do MPF.
“A Procuradoria defende que a responsabilidade pelo
manejo da fauna silvestre é do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), órgão federal encarregado de proteger a
fauna em todo o Brasil. E referendou a proposta do Idema de criar um convênio
entre os entes federativos para o Estado custear o CETAS, com a administração
do Ibama, mas o órgão federal rejeitou a proposta”, apontou. O Ibama foi
contatado, mas não enviou posicionamento à reportagem da TN.
Comércio de animais também acarreta
multa
Segundo o Ibama, o comércio ilegal de animais
silvestres não apenas ameaça a biodiversidade, mas também impõe severas
punições financeiras. Cada ave resgatada gera uma multa de R$ 500, valor que
sobe para R$ 5.000 em caso de espécies ameaçadas. No total, as autuações
somaram mais de R$ 130.000, refletindo o impacto devastador da atividade ilegal
sobre o meio ambiente.
Os responsáveis detidos na Operação Mercatio
responderão por comercializar ou receptar espécies da fauna silvestre sem
autorização do órgão ambiental competente, conforme previsto na Lei de Crimes
Ambientais (Lei nº 9.605/98). A ação evidencia o compromisso das autoridades no
combate ao tráfico de animais, uma prática que desestrutura ecossistemas
inteiros e coloca a biodiversidade em risco iminente.
No Brasil, o Ibama possui uma listagem definida em
seus canais de aves que podem ser domesticadas. Entre as mais populares estão a
Calopsita, Periquito Australiano, Manon, Phaeton, Diamante de Gould, Pombo
Doméstico, Pombo Diamante, entre outras. Mesmo com a permissão, é preciso
seguir a legislação e ter autorização ambiental necessária.
Tribuna do Norte
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