Fonte: CNM
Com mais de 51% dos municípios brasileiros no
vermelho, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) publicou um novo
levantamento que aponta para o aumento nos gastos das cidades que estão
agravando a crise financeira. Na “Avaliação do Cenário de Crise nos Municípios”
a entidade estima que somente com as novas obrigações com pessoal, como o piso
nacional do magistério (2022 e 2023) e da enfermagem, bem como a nova decisão
do Supremo Tribunal Federal (STF) obrigando os municípios a universalizarem a
educação infantil, o custo para os municípios potiguares é de R$ 2,7 bilhões
até o final do ano. No país, o impacto nas contas municipais é de R$ 171,5
bilhões. O documento foi divulgado enquanto os prefeitos realizavam uma
mobilização na terça- e quarta -feira passada em Brasília, reunindo aproximadamente
2 mil gestores.
Para a sansão do piso nacional dos enfermeiros, que
define em escala menor os salários básicos das parteiras, técnicos e auxiliares
de enfermagem, a União previu recurso financeiro de R$ 7,3 bilhões de maio a
dezembro de 2023 sendo R$ 3,3 bilhões a serem
destinados às Prefeituras e R$ 4 bilhões aos Estados. O valor inclui o
repasse para as entidades filantrópicas e prestadores de serviços
contratualizados que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo Sistema
Único de saúde.
Os estudos realizados pela Confederação indicam que
a implementação da medida terá um impacto orçamentário estimado
em R$ 10,5 bilhões, anualmente, no caixa das prefeituras e de R$
157,5 milhões nos municípios potiguares.
Outra preocupação está no reajuste do piso do magistério
determinado pelo Governo Federal. Esse representa um importante aumento no
gasto com pessoal devido a quantidade de profissionais que têm direito e a soma
dos dois últimos reajustes, sendo 33,24% em 2022 e 14,95%, que no RN somam,
respectivamente, R$ 480.417.595 e R$ 222.618.183.
A folha do magistério
correspondente entre 23% a 25% da folha do
funcionalismo, o que indica que qualquer
reajuste salarial nesta área gera impacto significativo.
É importante destacar que justamente alegando falta
de recursos, apenas 50 municípios do RN concederam o reajuste do
magistério em 2022 e 49 em 2023. Apenas 27 conseguiram pagar os dois, segundo o
estudo.
Ainda na educação há mais um desafio para os gestores:
o STF julgou, em decisão de repercussão geral e efeito vinculante, pela
obrigatoriedade do poder público de garantir vagas em creches e pré-escolas
para crianças de 0 a 5 anos, conforme o Plano Nacional de Educação (PNE),
criado pela Lei 13.005/2014.
O Plano prevê universalizar, até 2016, a educação
infantil na pré-escola para as crianças de 4 a 5 anos e ampliar a oferta de
educação infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 50% das crianças de
até 3 anos até o final da vigência do PNE, em 2024. Contudo, o impacto para as
prefeituras, segundo a CNM, é de R$ 111 milhões/ano no país e de R$ 1,8 bilhão
no RN.
Paralisação
Na expectativa para os repasses das duas parcelas
restantes do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), o presidente da Federação
dos Municípios do Estado (Femurn), Luciano Santos, destacou que no próximo dia
30 de agosto as prefeituras potiguares e de outros estados farão uma
mobilização. Na primeira parcela do mês, houve queda de mais de 20% nos
recursos, em comparação com o mesmo período do ano passado, o que compromete as
finanças municipais e pode colocar em risco o pagamento de funcionários e os
serviços à população.
Luciano já havia declarado em ocasiões anteriores
que muitos municípios estão passando dos limites impostos pela Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF), que alguns não tinham recursos para reajustar os
pisos, mesmo que outros conseguiriam pagar por disporem de receitas maiores.
“Municípios como Guamaré, que tem uma receita própria robusta, e outros que estão
recebendo investimentos transitórios na questão da implantação dos veículos
geradores eólicos, certamente têm robustez orçamentária para arcar com essa
oneração nas suas folhas de pagamento”, pontuou.
Segundo ele, a maioria das cidades não conseguiu implementar
o reajuste dos professores no ano passado. “Alguns municípios sequer
conseguiram implantar o piso. Estamos falando de um reajuste da ordem de quase
50% em dois anos”, acrescentou.
Municípios precisam otimizar receitas,
dizem especialistas
Se por um lado é fato que qualquer reajuste salarial
implica no aumento de despesas, por outro as gestões também precisam trabalhar
para otimizar as receitas de modo a atender as demandas. É o que sugere o
especialista em Gestão Pública Municipal, Marcus Demétrios. “Há a
narrativa do comprometimento de receitas, mas qual o papel dos municípios na
otimização dessas receitas? Há alternativas para aumentar a arrecadação. Por
exemplo, há um estudo do IPEA que mostra que o investimento em regularização
fundiária pode aumentar a renda per capita em até R$ 7 no município”, explica.
Segundo ele, isso ocorre com a receita do IPTU,
imposto municipal voltado a propriedades com construção no meio urbano.
“Municípios de médio e grande e porte sofrem com a falta de atualização das
áreas tributárias. A falta de atualização desses cadastros acarreta perda da
arrecadação por meio do IPTU. Os de pequeno porte, muitas vezes nem
cobram esse imposto”, destaca.
O especialista acrescenta que o Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) também apontou que a regularização
fundiária pode aumentar R$ 20 reais per capita a receita do ISS (Imposto Sobre
Serviço), que também é uma fonte de receita dos municípios.
O consultor em gestão pública da Analisa RN,
Francistony Valentim, também diz que são necessárias medidas mais eficazes
diante da crise. “Temos como exemplo a reforma tributária, que está no Senado,
e os estudos sobre um novo pacto federativo para distribuir a arrecadação
federal aos municípios de uma forma mais justa, considerando que os problemas
acontecem nas cidades”, observou.
Ele pondera que paira sobre os municípios a
incerteza se eles vão conseguir honrar seus compromissos depois das freqüentes
quedas nos repasses do FPM e o atraso na divulgação das perspectivas dessas
transferências, que são realizadas pelo Tesouro Nacional. Por causa disso, os
prefeitos têm dificuldade de realizar um planejamento financeiro
adequado. “O corte nos recursos e o atraso na divulgação prejudicam a
capacidade de investimento e o compromisso do município em honrar com as suas
obrigações financeiras. Os gestores ficam na corda bamba entre manter a folha
de pagamento em dia e pagar aos fornecedores para manter os serviços essenciais
à população”, destacou.
CNM aponta medidas para recuperar
finanças
No mesmo documento que narra a crise nas finanças
enfrentada pelas prefeituras brasileiras, a Confederação Nacional dos
Municípios (CNM) também sugere medidas para a recuperação de receitas.
Algumas dessas dependem da aprovação do legislativo, como a PEC 25/2022, que
tem a finalidade de instituir o adicional de 1,5% do Fundo de Participação dos
Municípios (FPM) no mês de março de cada ano.
“A Confederação calcula o impacto da medida em um
aumento dos repasses em R$ 11 bilhões. A finalidade da medida proposta é o
pagamento do piso da enfermagem e o alívio da situação fiscal dos Municípios”,
diz a entidade no documento. No Rio Grande do Norte, esse adicional somaria R$
276.405.335 a mais para os municípios.
Outra ajuda está no Projeto de Lei Complementar
94/2023, que prevê a compensação de perdas no ICMS. A CNM diz que o texto, ao
reconhecer o acórdão homologado no STF entre a União e os governadores,
permitirá o envio de recursos financeiros aos Municípios na
ordem de mais de R$ 6,5 bilhões relativos
aos 25% da quota-parte e de até R$ 69,4 milhões para o Rio Grande
do Norte até 2025.
Além disso, os municípios aguardam recursos de
royalties há uma década, desde a aprovação da Lei
12.734/2012, que alterou e democratizou a repartição das
receitas de royalties e participação especial de
petróleo, o julgamento em plenário da ADI 4.917. Se a lei estivesse em vigor
desde meados de 2013, os Municípios teriam recebido por meio do Fundo Especial
de Petróleo (FEP), distribuído via FPM, a cifra de R$ 93
bilhões, ou seja, R$ 77 bilhões a mais do que receberam pelas regras
antigas. Os municípios potiguares deixaram de receber R$ 1.912.568.335.
A CNM ressalta ainda que o cenário observado no
primeiro semestre, marcado pelo baixo crescimento da receita de
transferências, pode ter alguma melhora na
segunda metade de 2023 por dois fatores. Primeiro, parcela
relevante das emendas não pagas na área de saúde, por exemplo, deverão ser
pagas até o final do ano por serem impositivas. “Isso implica
que a arrecadação dessa modalidade de
transferências deve se expandir no segundo semestre. Um segundo
fator é a cota-parte de ICMS. Neste ano, os Estados elevaram as alíquotas
modais do ICMS”, explica a entidade.
Uma vez que as alíquotas no segundo semestre de 2022
eram as modais entre 17% e 18%, é esperado algum aumento dos repasses de
cota-parte. E, por outro lado, o governo federal já começou a compensar os
Estados e o Distrito Federal pelas perdas de arrecadação ocorridas
entre julho e dezembro de 2022 em
função da aprovação da LC 194/2022.
Números:
R$ 703.035.778
é o impacto do reajuste do piso do magistério de
2022 (33,24%) e 2023 (14,95%) nas prefeituras do RN
R$ 1.867.708.800
É o impacto financeiro anual da universalização das
creches para os municípios potiguares
R$ 157.545.979
É o impacto do piso da enfermagem nas contas dos
municípios do RN
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