CNN Brasil
Com a alta de casos e internações causadas pelo novo
coronavírus no Brasil desde o fim de 2020, voltou a crescer também a demanda
por leitos em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) e por equipamentos como
respiradores e ventiladores pulmonares.
Pensando em tratar pacientes com insuficiência
respiratória, incluindo a causada pela Covid-19, pesquisadores do Ceará
desenvolveram o Elmo, um mecanismo de respiração artificial não invasivo que
pode reduzir em 60%, de acordo com a comprovação dos testes, a necessidade de
internação em UTI e a intubação de pacientes com Covid-19.
Recentemente, a Secretaria da Saúde do Ceará doou ao
estado do Amazonas – que enfrentou a partir das primeiras semanas de janeiro o
momento mais grave da pandemia – 65 unidades do aparelho e capacitou
profissionais da saúde para utilizá-lo em pacientes internados com o novo
coronavírus.
Mas, afinal, como o Elmo funciona e por que ele pode
ser uma ferramenta importante para desafogar os sistemas de saúde em todo o
país?
O equipamento envolve toda a cabeça do paciente e é
fixado no pescoço em uma base que veda a passagem de ar. Com a aplicação de
oxigênio e ar comprimido, o Elmo gera uma pressão positiva (em relação à
pressão atmosférica) que ajuda pacientes com dificuldade de oxigenação.
Dessa forma, ele é indicado para o tratamento de
pacientes com quadro clínico moderado, mas também auxilia casos que começam a
evoluir para gravidade.
“A ideia do Elmo surgiu em abril de 2020, na primeira
onda da pandemia aqui no Brasil, como uma iniciativa de várias instituições
para achar soluções para a falta de respiradores e leitos”, explicou à CNN o
médico pneumologista e intensivista Marcelo Alcantara Holanda, Superintendente
da Escola de Saúde Pública (ESP) do Ceará e idealizador do Elmo.
“Mas, em vez de produzir um respirador mecânico do
zero, algo que nunca foi feito no Ceará, coloquei essa ideia de fazer um
capacete que pudesse ser uma interface, um dispositivo para administrar
oxigênio com segurança ao mesmo tempo em que fornece uma pressão nas vias
aéreas, facilitando a entrada e a saída de ar no pulmão que está doente”,
completou.
Raul Gonzalez Lima, professor titular da Poli-USP,
afirmou que, por ser desenvolvido com um material flexível, o capacete é
benéfico para pacientes que precisam de fluxo contínuo de ar e oxigênio.
“Não tenho todos os detalhes da tecnologia do Ceará,
mas quando você coloca pressão no material que eles utilizam isso aumenta o
volume do capacete, que funciona bem para um fluxo contínuo de ar e oxigênio”,
afirmou.
Força-tarefa pelo equipamento
Holanda destacou que foi montada uma força-tarefa que,
só na fase de prototipagem, contou com a participação de mais de 40 pessoas
entre pesquisadores, voluntários e equipe de apoio da ESP, da Fundação Cearense
de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap), da Federação das
Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), do Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (Senai), da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Universidade de
Fortaleza (Unifor).
“O Elmo surgiu do espírito solidário entre pessoas e
instituições. Isso foi fundamental para uma ideia inovadora ser aplicada com
êxito na solução de um problema grave”. (Marcelo Alcantara Holanda, idealizador
do Elmo)
“Demos uma contribuição muito significativa e
continuamos com novas ideias para melhorar a qualidade do equipamento, já que
essa é, digamos, a versão 1.0”, afirmou Holanda.
“A tendência é que ele seja aperfeiçoado. Em Fortaleza
o pessoal está muito empolgado para fazer melhorias progressivas e, à medida
que o Elmo é usado em larga escala e colhemos dados, podemos aperfeiçoá-lo.”
Ele explicou ainda que, por não depender de respiradores,
o equipamento tem um custo relativamente baixo – estimado entre R$ 1,2 mil e R$
1,5 mil.
Além disso, o Elmo pode ser esterilizado e reutilizado
em outros pacientes, além de aumentar a segurança dos profissionais de saúde,
já que, por ser vedado, não permite a proliferação de partículas de vírus.
“Também é eficiente para outras situações em que o
problema do pulmão for a oxigenação, como em pneumonias e outras situações
comuns, como um edema pulmonar.”
Autorização da Anvisa e produção em série
Depois de ser testado por cinco meses ao longo de 2020
em pacientes no Hospital Leonardo da Vinci, em Fortaleza – comprovando sua
eficácia no tratamento de insuficiência respiratória –, o equipamento recebeu
em outubro aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para
produção em escala industrial, que ficou a cargo da emprsa Esmaltec.
“Fomos convidados pela Unifor para integrar o time de
desenvolvimento do capacete hiperbárico, através da parceria com pesquisadores,
universidades e entidades de saúde e a nossa equipe de engenheiros fez o
projeto dos componentes exclusivos e investimos em moldes de injeção
específicos e únicos para esse produto”, afirmou Marcelo Pinto, diretor
superintendente da Esmaltec, em nota.
A empresa afirmou que ficou encarregada pela parte
fabril, pela comercialização e pelos registros de patente junto ao Instituto
Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o que foi feito em julho. Já a
produção do Elmo foi iniciada em dezembro.
Também em dezembro, a Esmaltec doou 250 unidades do
capacete de respiração para utilização na rede pública do Ceará. Desses, 200
foram destinados a hospitais públicos e 50 para a Escola de Saúde Pública
(ESP). Neste ano, mais 300 aparelhos foram doados à Secretaria da Saúde
cearense. Já a rede privada de saúde recebeu 100 unidades do Elmo.
Segundo a Pinto, a linha de produção da empresa tem
capacidade para atender uma demanda de até 100 peças/dia – até o momento, já
foram enviados mais de 700 unidades para secretárias e hospitais, das regiões
Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
“Estamos recebendo consultas de vários hospitais e
instituições da área da saúde de todas as regiões do pais. O grande desafio
durante o processo foi garantir um equipamento acessível a todos,
principalmente quando se compara com preços de ventiladores hospitalares que
tem preços bem elevados”, completou, destacando que o Elmo é comercializado por
menos de R$ 2 mil.
“Nossa participação nesse projeto não busca a
lucratividade, isso fazemos como fabricante de eletrodomésticos da linha
branca. O que nos motiva com o Elmo é gerar valor à sociedade e contribuir para
o bem estar das pessoas.”
Uso no Amazonas
Depois de doar 65 unidades do equipamento para o
governo do Amazonas – que devem beneficiar 10 unidades de saúde amazonense –, a
Secretaria da Saúde do Ceará realizou, no começo de fevereiro, o treinamento de
74 profissionais de saúde amazonenses para usar o capacete de respiração
assistida.
A fisioterapeuta e bolsista da ESP Ingrid Sá foi uma
das três responsáveis pela capacitação de médicos, enfermeiros e
fisioterapeutas, além de engenheiros clínicos no Amazonas.
À CNN, ela destacou a parceria entre os dois governos
e o interesse dos profissionais amazonenses em utilizar o Elmo nos pacientes
com Covid-19.
“O Elmo será mais um recurso para ajudar [os
profissionais do Amazonas] no tratamento dos pacientes com Covid-19. Além de
não ser invasivo e ter baixo custo, acreditamos que ele será importante para
ajudar nas internações”, afirmou.
Além da parte teórica sobre o funcionamento do aparelho,
os profissionais passaram por uma simulação com um voluntário para experimentar
o uso do capacete em situação próxima à realidade.
“Nossa orientação para eles foi que não deixem o Elmo
para uso apenas em último caso e, sim, que o utilizem assim que a lista de
recomendações [para uso do capacete] começar a ser preenchida”, explicou Sá.
Ela destacou ainda que foi criado um grupo focal por
meio de um aplicativo de comunicação para que os profissionais no Ceará possam
dar suporte durante os primeiros usos no Amazonas.
Para participar do treinamento, Sá, a também
fisioterapeuta Betina Santos e a enfermeira Rebeca Bandeira foram imunizadas
com a primeira dose da vacina contra a Covid-19.
À CNN, a Secretaria da Saúde do Ceará esclareceu que a
doação dos aparelhos foi feita a pedido do governo amazonense. A pasta afirmou
ainda que os hospitais que quiserem adquirir o Elmo devem entrar em contato
diretamente com a empresa responsável.
Já a Secretaria de Saúde do Amazonas informou que
recebeu 40 unidades do aparelho e que “está providenciando a distribuição delas
entre as unidades da capital”.
Equipamento semelhante
Raul Gonzalez Lima é coordenador de uma parceria da
USP com a iniciativa privada que desenvolve um capacete que, adaptado a um
respirador artificial, dispensa o uso do tubo endotraqueal em pacientes
internados em UTIs.
O aparelho, batizado de Escafandro, teve alguns
protótipos testados ao longo de 2020, incluindo a produção de um lote piloto,
mas ainda não entrou em produção em larga escala.
À CNN, Lima afirmou que a equipe está trabalhando na
modificação de alguns subsistemas e na simplificação de seu uso. Ainda não há,
porém, um prazo para a conclusão dessas modificações.
Ele explicou ainda que o Escafandro, por ser destinado
a pacientes já internados em UTI, se difere do Elmo por ter como objetivo
trabalhar com um fluxo pulsado de ventilação.
“Alguns pacientes estão com músculos da respiração
fadigados e, portanto, precisam de um descanso. Para eles, a respiração pulsada
ajuda muito, porque é uma pressão positiva que se impõe para entrar no pulmão
e, com isso, os músculos acabam relaxando e descansando, o que é benéfico para
sua recuperação.”


Nenhum comentário:
Postar um comentário