O governo de Luiz Inácio Lula da Silva provavelmente
terá de mudar a meta fiscal das estatais federais no ano que vem por causa dos
Correios. O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026 permitia
um déficit de até R$ 6,75 bilhões para o conjunto de empresas públicas da
União, mas o número foi proposto em abril, antes do irrefreável processo de
deterioração pelo qual os Correios passariam ao longo dos meses seguintes.
Esse ajuste, evidentemente, não visa a alterar a
trágica trajetória dos Correios em direção à ruína. A questão é que, se a
previsão de déficit das empresas públicas não for adequada, o Executivo será
obrigado a cortar outras despesas para cumprir a meta fiscal do ano que vem,
que prevê um superávit de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), de cerca de R$
34 bilhões. E tudo que Lula não quer é cortar gastos, ainda mais em um ano eleitoral.
Foi exatamente o que ocorreu neste ano. Em pleno mês
de novembro, a projeção de déficit das estatais, que era de R$ 5,5 bilhões,
teve de ser ampliada para R$ 9,2 bilhões por causa dos Correios. A situação
obrigou o governo a cortar R$ 3 bilhões em gastos dos ministérios a poucas
semanas do fim do ano, quando o Executivo imaginava que contingenciamentos não
seriam mais necessários.
Esse é apenas mais um capítulo da longa e dolorosa
decadência dos Correios. O governo Lula até tenta fingir surpresa, mas a
verdade é que menosprezou o problema até que ele virasse um problemão. Enquanto
os resultados financeiros dos Correios pioravam a olhos vistos, o Executivo
recorria a discussões semânticas para diferenciar déficit de prejuízo e gastos
de investimentos.
Em julho, o governo já estava ciente de que a
empresa precisaria de ajuda. À época, o socorro, estimado em R$ 5 bilhões,
derrubou o então presidente dos Correios, Fabiano Silva dos Santos. Três meses
depois, seu sucessor, Emmanoel Schmidt Rondon, anunciou que a estatal
precisaria de nada menos que R$ 20 bilhões para pagar as contas em dia e
executar um tardio plano de reestruturação.
O aporte virou empréstimo e, em conjunto, alguns
bancos aceitaram participar da operação de salvamento. Exigiram, no entanto,
que a União assumisse a bronca em caso de calote e, como não rasgam dinheiro,
pediram juros equivalentes a 136% do CDI, superior ao teto com que o Tesouro
Nacional trabalha. O governo chiou, a oferta foi rejeitada e a possibilidade de
um aporte da União na empresa, que custou o cargo do presidente anterior,
voltou à mesa.
Entre idas e vindas, todo esse esforço seria
defensável se ao menos servisse para solucionar de vez os problemas dos
Correios, mas é difícil ser otimista diante da visão do governo sobre o papel
“estratégico” das estatais na economia.
Afinal, enquanto o prejuízo escalava, os Correios
realizaram um concurso para contratar mais de 3,5 mil empregados no fim do ano
passado. Pior: em vez de enterrar de vez os planos depois dos rombos, mesmo
porque conta com mais de 80 mil funcionários, a empresa ainda pensa em convocar
os aprovados.
Para recompor as receitas que os Correios perderam
nos últimos anos com o avanço de empresas privadas na área de logística e
encomendas, a ideia da estatal é cobrar uma espécie de “indenização” do Tesouro
Nacional pelos custos que tem com a universalização dos serviços postais, por
ela estimados em alguns bilhões.
Esses dois singelos exemplos mostram que qualquer
ajuste, se é que haverá, será insuficiente frente ao desafio da empresa. É
importante destacar que as dificuldades dos Correios não são exclusividade
nacional. No mundo todo, empresas tradicionais do setor de logística e entregas
tentam se adaptar às mudanças tecnológicas e aos novos hábitos da população,
seja via parcerias com a iniciativa privada, seja pela assunção de outros
serviços e funções públicas.
No Brasil, no entanto, por questões ideológicas que
beiram a teimosia, o governo prefere empurrar o problema com a barriga a
encará-lo. A continuar nessa toada, novos empréstimos, aportes e mudanças na
meta das estatais serão necessários muito em breve. A sociedade que se vire
para pagar a conta.
Opinião do Estadão

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