A líder comunitária Alessandra Moja Cunha, da
Associação da Comunidade do Moinho, integrava a organização criminosa comandada
por seu irmão, Leonardo Moja, o “Léo do Moinho”, e também comandava a extorsão
de moradores que desejavam deixar a favela do Moinho, no Centro de São Paulo.
Léo é apontado como o principal líder do PCC na região central da capital.
Foi com essa associação que o ministro da
Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macêdo, se reuniu para
preparar a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à favela no fim
de junho. Dois dias depois, Lula esteve no local e dividiu o palco com
Alessandra.
As informações constam de representação do
Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), que embasou a Operação
Sharpe, deflagrada na manhã desta segunda-feira (8/9).
Alessandra foi presa na operação. Segundo registros
da Receita Federal, ela é presidente da Associação da Comunidade do Moinho.
De acordo com o MPSP, Alessandra “exerce importante
papel na mobilização e organização das manifestações públicas que blindam a
comunidade das intervenções policiais, além de auxiliar o irmão em suas
empreitadas criminosas”.
Ainda conforme o órgão, ela era responsável por
extorquir moradores interessados em aceitar o acordo proposto pelo governo
estadual para deixar a favela. Como mostrou o Metrópoles, a facção cobrava uma
“multa” de até R$ 100 mil de quem desejasse sair.
Pelo acordo, os moradores recebem ajuda de custo até
serem alocados em imóveis da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano
de São Paulo (CDHU).
O MPSP aponta ainda que Alessandra “também é
responsável pelo grupo que cobra propina das famílias beneficiadas pelo acordo
com o CDHU, somente autorizando o cadastro e a assinatura mediante o pagamento
de valores à família Moja”.
“Tanto os valores arrecadados neste contexto quanto
os recursos derivados das demais atividades ilegais controladas por ‘Léo do
Moinho’ são recolhidos por Alessandra com o intuito de branqueamento
(lavagem)”, afirma a representação.
Na operação desta segunda, a Polícia Militar e a
Polícia Civil também prenderam a filha de Alessandra, Yasmin Moja Cunha. O nome
dela aparece em reuniões com o governo federal durante as negociações para a
desocupação da área.
O governo estadual pretende construir um parque no
local, mas a área pertence à União. Ficou acertado que o terreno será repassado
ao estado após a saída das famílias.
“Quando estiver tudo pronto, estiver certa a casa
que vocês vão comprar, aí faremos a cessão definitiva para o governo do estado.
Por mais bonito que seja um parque, ele não pode ser feito às custas do ser
humano”, disse Lula na visita à comunidade.
Alessandra já foi condenada por
homicídio
Antes da operação, Alessandra costumava dar
entrevistas como representante da favela, geralmente criticando a atuação da
Polícia Militar. Aos 40 anos, afirma morar no Moinho há mais de 30. É mãe de
quatro filhos e dona de cerca de dez cachorros.
Em 2015, foi presa e condenada a oito anos de
reclusão em regime inicial semiaberto por participar de um assassinato ocorrido
em 2005, na favela. Na ocasião, ela e a irmã, Renata Moja Cunha, mataram a
facadas uma mulher que dormia na casa do ex-namorado de Renata, também
agredido.
“Alessandra Moja Cunha, no dia, hora e local
descritos nos autos, agindo com intenção de matar, impelida por motivo fútil,
com emprego de meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima, matou
Claudice Terra Rufino mediante golpes de faca, provocando-lhe os ferimentos
descritos no laudo necroscópico, que foram a causa direta de sua morte”, diz
trecho da denúncia.
“Consta, ainda, que, nas mesmas circunstâncias,
tentou matar Everton da Silva, provocando-lhe os ferimentos descritos no laudo
de lesão corporal”, prossegue o documento.
Por esse crime, Alessandra ficou presa no Centro de
Progressão Penitenciária do Butantã entre agosto de 2018 e novembro de 2019.
Defensoria: ONG não é ligado ao PCC e
não guardava drogas
A Associação da Comunidade do Moinho foi procurada
por e-mail e mensagem no Instagram, mas ainda não respondeu. O espaço segue
aberto.
Na última sexta-feira, a Defensoria Pública do
Estado de São Paulo enviou um ofício à coluna pedido o direito de resposta à
primeira reportagem sobre o assunto, em julho. No ofício, a defensoria
argumenta que a sede da ONG não era usada para guardar drogas, e que a menção
ao endereço se deve ao fato de se tratar de um “endereço unificado”.
“Toda e qualquer correspondência das pessoas
residentes na comunidade ou registro de endereço junto à órgãos públicos,
inclusive Boletins de Ocorrência lavrados pela Polícia Civil, é feita no
endereço da Rua Doutor Elias Chaves, n. 20 ou s/n; embaixo do viaduto, por se
tratar de
uma comunidade que não passou por um processo de regularização fundiária”, diz
um trecho.
A defensoria também argumenta que a ONG e os
moradores “não possuem qualquer vínculo com organizações criminosas e se
dedicam a lutar pelo direito à moradia, à integridade pessoal e à segurança
pública de todas as famílias residentes da favela durante e após o processo de
cessão do terreno”.
Macêdo: reunião tratou apenas de
habitação
À época da primeira reportagem da coluna sobre o
assunto, em junho, o ministro Márcio Macêdo afirmou que o encontro com a
associação teve como única pauta a solução habitacional para as famílias do
Moinho.
“O diálogo ocorreu com moradores da comunidade,
inicialmente para construir o acordo que previa a saída pacífica da área e a
destinação adequada das famílias, e posteriormente, na véspera do ato com o
presidente Lula, para preparar a visita”, disse por meio da assessoria.
Segundo ele, “o diálogo com lideranças comunitárias
é parte fundamental da atuação de qualquer governo comprometido com políticas
de inclusão social, habitação e valorização da cidadania”.
A Secretaria de Comunicação (Secom) e o Gabinete de
Segurança Institucional (GSI) também foram questionados sobre riscos à
segurança de Lula e da comitiva.
A Secom afirmou que a segurança foi conduzida “de
forma rigorosa pelos órgãos competentes, conforme o protocolo adotado em
qualquer agenda presidencial, não tendo sido identificado risco à integridade
das autoridades”.
A pasta acrescentou que “a interlocução com
representantes comunitários é prática essencial de qualquer governo que atue
com políticas públicas voltadas à inclusão, moradia e promoção da dignidade.
Associações locais são formadas e escolhidas pelos próprios moradores e
constituem pontos naturais de contato com o poder público”.
“No caso da visita, a interlocução com o presidente
se deu por meio de Flavia Maria da Silva, liderança designada pela comunidade
como porta-voz, com trajetória reconhecida e idônea”, concluiu.
Leia abaixo a íntegra da manifestação de
Márcio Macêdo:
“A agenda na Favela do Moinho teve como
única pauta a apresentação da solução habitacional para as 900 famílias que
residem naquela localidade.
O acordo de solução habitacional para a
Favela do Moinho foi construído entre o governo federal e o governo do Estado
de São Paulo.
O diálogo se deu com moradores da
comunidade, primeiro para a construção do acordo que tinha como objetivo a
saída pacífica da favela e a destinação adequada das famílias, e depois, na
véspera do ato com o presidente Lula, para a preparação da visita em si.
O diálogo com lideranças comunitárias é
parte fundamental da atuação de qualquer governo comprometido com políticas de
inclusão social, habitação e valorização da cidadania.
A visita à Favela ocorreu de maneira
tranquila, sem incidentes, de forma transparente, inclusive com o
acompanhamento da imprensa.
O acordo, além da solução habitacional,
também incluiu a autorização para a continuidade da cessão do terreno
pertencente à União, para o governo do Estado fazer um parque. Para isso, foram
estabelecidas condicionantes vinculadas à solução habitacional, evitando
situações de conflito e violência”.
Leia abaixo a íntegra da nota da Secom
“A agenda do Presidente da República na
Favela do Moinho, em São Paulo, teve caráter institucional e público, voltado à
escuta da comunidade e ao anúncio de políticas públicas em uma das regiões mais
vulneráveis da cidade.
A interlocução com representantes
comunitários é uma prática essencial de qualquer governo que atue com políticas
públicas voltadas à inclusão, à moradia e à promoção da dignidade. Associações
locais são formadas e escolhidas pelos próprios moradores e constituem pontos
naturais de contato com o poder público.
Neste caso em específico, a interlocução
com o presidente se deu por meio de Flavia Maria da Silva, liderança designada
pela comunidade como porta-voz, com trajetória reconhecida e idônea.
A agenda do presidente consistiu em um
ato na quadra poliesportiva da comunidade, uma visita à escola local, onde foi
recebido por um coral de crianças, e a uma visita de cortesia à residência de
Flavia da Silva.
A segurança do presidente, da
primeira-dama e de toda a comitiva foi conduzida de forma rigorosa pelos órgãos
competentes, conforme o protocolo adotado em qualquer agenda presidencial, não
tendo sido identificado qualquer risco à integridade das autoridades presentes.
O governo federal reforça que atua com
responsabilidade institucional, respeito às normas de segurança e compromisso
com a promoção de políticas públicas voltadas à inclusão social e à melhoria
das condições de vida da população.”
Metrópoles
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