A efetivação da troca de comando nos Correios, mais
de dois meses após o pedido de demissão do atual presidente, deflagrou a
elaboração de um plano para socorrer a companhia, que deve envolver a
renegociação de um empréstimo já contratado e a injeção de dinheiro novo por
meio de um aporte do Tesouro Nacional.
Um integrante do Ministério da Fazenda ouvido pela
Folha reconhece a possibilidade de os Correios receberem recursos da União,
embora ainda não haja definição de quando isso acontecerá, nem quanto será
repassado à empresa, que está em situação financeira bastante frágil.
A mera sinalização de que o aporte ocorrerá, no
entanto, é premissa importante para o avanço de outros pontos do plano que dará
sustentação à nova gestão. Na terça-feira (16), o governo de Luiz Inácio Lula
da Silva (PT) bateu o martelo e escolheu Emmanoel Schmidt Rondon, funcionário
de carreira do Banco do Brasil, como novo presidente.
O principal e mais urgente desses pontos é a
renegociação de um empréstimo de R$ 1,8 bilhão contratado pelos Correios neste
ano junto a um sindicato de bancos formado por BTG Pactual, Citibank e ABC
Brasil. O objetivo da operação era dar fôlego ao caixa já debilitado da
empresa.
O pagamento foi programado em seis parcelas mensais
a partir de junho de 2026, mas o contrato possui cláusulas restritivas
(chamadas de covenants) cujo descumprimento pode disparar a cobrança antecipada
dos valores —entre elas, uma relacionada à ocorrência de eventos com impactos
jurídicos ou judiciais.
Segundo três pessoas a par da situação da empresa, o
forte aumento do custo com sentenças judiciais registrado no segundo trimestre
de 2025 criou as condições para que a cláusula seja acionada. O estoque de
obrigações com precatórios, que era de R$ 940,6 milhões no início de abril, saltou
a R$ 2,1 bilhões no fim de junho.
O eventual acionamento dos covenants criaria uma
situação dramática para os Correios, uma vez que o contrato autoriza os bancos
a reterem valores que a empresa tem a receber para quitar as parcelas
antecipadas. Isso poderia ocorrer já nos próximos dias, segundo os relatos, e
deixaria a companhia sem dinheiro em caixa para honrar obrigações correntes.
Nesse cenário, ela precisaria recorrer ao Tesouro de
qualquer maneira, mas as consequências seriam ainda mais graves para a União,
pois ficaria caracterizada a situação de dependência. Os gastos da empresa
teriam de ser incluídos no Orçamento Federal, ocupando o espaço de outras
políticas públicas.
Dada a urgência da questão, o secretário-executivo
da Fazenda, Dario Durigan, recebeu na terça-feira (16) representantes do BTG
Pactual e do Citibank, os dois bancos que lideram a operação, para discutir uma
renegociação do contrato.
Os termos ainda estão em discussão, mas a
sinalização do governo de que fará algum aporte é tida como essencial para que
os bancos possam ter conforto em abrir mão do acionamento da cláusula e da
retenção dos valores neste primeiro momento, até que a renegociação seja
concluída.
Um integrante da equipe econômica afirma que a
antecipação das cobranças é pouco provável diante da percepção de que o governo
“está tomando conta da situação” e atuará para resolver o impasse. Dentro da
companhia, a avaliação é a de que o Executivo entendeu a necessidade de ajudar
financeiramente a empresa após um momento de resistência inicial a essa opção.
Além do encontro da Fazenda com os bancos, o governo
realizou outras reuniões nos últimos dias envolvendo a Casa Civil e o
Ministério da Gestão, pasta responsável pela gestão e governança das estatais.
A Folha procurou os três ministérios, que
direcionaram os questionamentos à Secom (Secretaria de Comunicação Social) da
Presidência. Em nota, o órgão confirmou a indicação de Rondon para a
presidência dos Correios, a quem descreveu como “profissional com ampla
experiência e perfil técnico adequado” para assumir o posto.
“Após a posse, o novo presidente realizará um
diagnóstico detalhado da situação da empresa e apresentará um plano de ação
voltado à reestruturação da estatal. Dessa forma, não é possível avançar com
mais informações neste momento”, disse.
Os Correios, formalmente ainda sob a gestão de
Fabiano Silva dos Santos (que pediu demissão em 4 de julho), informaram que
estão implementando um conjunto de ações voltadas ao reequilíbrio econômico e à
sustentabilidade de longo prazo.
“Nesse contexto, foi instituído um Comitê Executivo
de Contingência, que é responsável por coordenar as iniciativas para a
recomposição da liquidez imediata e a execução do programa de reestruturação da
empresa”, disse.
A empresa elencou como prioridades o aumento de
receitas por meio da diversificação de serviços, a redução de custos e os
ganhos de produtividade, mas a nota cita apenas medidas já anunciadas, como o
lançamento de um marketplace.
Questionada sobre novas iniciativas, incluindo o
pedido de aporte da União, a companhia disse que “as ações de reequilíbrio
econômico-financeiro da empresa, o que inclui análise de capital, estão
contempladas no plano mencionado” e acrescentou que “tais medidas são
classificadas como sigilosas”.
O Citibank não quis se manifestar. O ABC Brasil
informou que não comenta casos específicos. O BTG Pactual não respondeu.
Além dos temas financeiros, o governo também mapeia
possíveis ações em outras frentes que possam ajudar os Correios. Segundo um
integrante da equipe econômica, a Caixa Econômica Federal entrou nas conversas
para avaliar uma possível aquisição de imóveis que hoje pertencem aos Correios.
As duas empresas são controladas pela União.
O banco estatal também prometeu avaliar outras
sinergias. Procurada, a Caixa não quis se manifestar.
Folha de S.Paulo
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