domingo, 10 de agosto de 2025

Opinião do Estadão: O Brics é uma miragem

 

O Brics é uma miragem

A reação nula à ofensiva tarifária de Trump rasga a fantasia de Lula a respeito do Brics, que em seu primeiro grande teste como bloco econômico mostrou que, na prática, é cada um por si

A mais recente investida tarifária de Donald Trump contra Brasil e Índia – ambos atingidos com sobretaxas de 50% – foi o primeiro teste real da capacidade do Brics de agir como bloco. O resultado foi desolador: silêncio, hesitação e, por fim, declarações vagas que não ousaram sequer mencionar o agressor. Se o Brics já parecia um clube retórico, sob a presidência brasileira provou-se irrelevante.

O contraste entre o tamanho da retórica e a inércia prática revela muito sobre a política externa do governo Lula. Desde o início do terceiro mandato, o presidente apostou no Brics como vitrine de liderança global e contraponto à “hegemonia” americana. Essa aposta, como se vê agora, foi um grosseiro erro de cálculo: a China, real centro de gravidade do grupo, move-se segundo seus próprios interesses; a Índia busca equilibrar-se entre Moscou e Washington; e os autocratas agregados à mesa pouco ou nada podem oferecer além do ressentimento diante da política de força dos Estados Unidos.

O episódio também expôs o isolamento estratégico do Brasil. Em vez de preparar terreno para negociações diretas com Washington – algo que um estadista faria mesmo diante de antagonismos pessoais –, Lula preferiu acionar um foro incapaz de oferecer respostas concretas. Essa escolha tem menos a ver com pragmatismo e mais com a esclerosada “doutrina Amorim”, inspirada pelo chanceler de facto Celso Amorim: antiamericanismo como princípio, aproximação automática com China e Rússia como meio, e, como fim, a crença de que um tal “Sul Global” coeso existe e aguarda ansiosamente a liderança de Lula.

A realidade é bem menos romântica. O Brics, criado como plataforma para grandes economias emergentes ampliarem sua voz em instituições multilaterais, degenerou em arena de disputa sino-indiana e instrumento de projeção geopolítica de Pequim. A ampliação recente, patrocinada por China e Rússia com a complacência de Lula, diluiu a influência brasileira e reforçou o caráter autoritário do clube. Na prática, servimos como figurantes para causas alheias – e, agora, como alvo fácil para um governo americano disposto a punir quem flerta com rivais estratégicos.

Trump, ao substituir as regras de Bretton Woods por negociações transacionais e confrontos bilaterais, reposicionou o tabuleiro global. Nesse jogo, países como o Brasil não são protagonistas: são peças a serem descartadas ou usadas como exemplo. A reação brasileira – consultar parceiros para “avaliar impactos” – não impressiona nem adversários nem aliados. Ao contrário: sinaliza fraqueza e confirma a percepção de que Brasília não dispõe de estratégia para ir além de declarações protocolares.

O custo dessa imprudência já é visível – e salgado. Exportadores perdem acesso ao maior mercado do mundo; setores inteiros, do agronegócio à indústria, enfrentam incertezas; e a margem de manobra diplomática encolhe a olhos vistos. Enquanto isso, o Planalto insiste em discursos sobre a substituição do dólar, acenos públicos a regimes autoritários e gestos de alinhamento a Pequim – provocações gratuitas que apenas agravam o quadro.

Não há nada de inevitável nesse enredo. A tradição diplomática brasileira sempre foi de não alinhamento pragmático: cultivar relações com todos, preservar autonomia e evitar ser arrastado para disputas alheias. Essa tradição, que historicamente permitiu ao Brasil atuar como interlocutor confiável, está sendo corroída por escolhas ideológicas e pelas ambições pessoais de Lula, que sacrificam o capital diplomático do País em nome de uma narrativa terceiro-mundista.

O episódio deveria servir de lição. A independência não se constrói com bravatas contra Washington nem com subserviência a Pequim, mas com credibilidade, diversificação de parcerias e defesa consistente dos próprios interesses. Enquanto Lula insistir em transformar a política externa em palanque ideológico, o Brasil continuará pagando a conta – e, no teatro geopolítico, seguirá confinado ao papel de coadjuvante descartável, assistindo de fora às decisões que moldam a ordem internacional.

Opinião do Estadão

 

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