Com o envelhecimento da população, os casos de perda
de visão causados por degeneração macular relacionada à idade (DMRI) poderão
triplicar nas próximas décadas, projeta um novo estudo publicado na revista
científica The Lancet Global Health. Os pesquisadores estimam que o número de
pessoas afetadas pela doença no mundo saltará de 8 milhões para 21,3 milhões até
2050.
A DMRI é uma condição progressiva que danifica a
mácula, área da retina responsável pela visão central (aquilo que enxergamos à
nossa frente, diferentemente da visão periférica). Esse comprometimento
acontece principalmente em pessoas mais velhas e, em casos graves, pode levar à
perda total da visão.
Analisando o problema, os pesquisadores descobriram
que o número de pessoas com o quadro mais do que dobrou entre 1990 e 2021.
Segundo os cientistas, o aumento se deve,
provavelmente, ao envelhecimento e ao crescimento populacional. Por essa razão,
mesmo com a quantidade absoluta de casos subindo, a taxa proporcional da doença
na população teve uma pequena redução: caiu 5,5% nesse mesmo período.
A melhora na estatísticas, dizem os autores, está
relacionada principalmente à redução do tabagismo, uma das principais causas
evitáveis da doença. Aliás, se o tabagismo fosse eliminado, os números
projetados para 2050 poderiam cair de 21,3 milhões de pessoas afetadas para
cerca de 19,3 milhões, de acordo com as simulações do estudo.
O que é a DMRI?
Embora as causas para a redução da visão com o
passar dos anos sejam diversas, a pesquisa mostra que a DMRI merece destaque.
Ela é a principal responsável pela cegueira irreversível após os 50 anos nos
países desenvolvidos.
Além disso, dados apresentados pelo Ministério da
Saúde, baseados em uma metanálise com números internacionais, sugerem que haja
uma prevalência de DMRI no Brasil de 2,2% na faixa etária de 70 a 79 anos e de
até 10,3% em indivíduos com 80 anos ou mais.
“A DMRI é um processo degenerativo que afeta a
mácula dos dois olhos de forma progressiva, geralmente a partir dos 50 anos”,
explica o oftalmologista Mauro Goldbaum, diretor do Conselho Brasileiro de
Oftalmologia (CBO) e da Sociedade Brasileira de Retina e Vítreo (SBRV).
A mácula é uma pequena área localizada no centro da
retina, no fundo do olho. Essa região abriga células sensíveis à luz que captam
informações do ambiente e enviam sinais ao cérebro. Ela é responsável pela
visão de detalhes e percepção de cores.
Com a degeneração progressiva dessa estrutura, fica
mais difícil fazer tarefas como ler um livro, reconhecer faces ou outras
atividades que exigem uma visão mais detalhada.
Quais os tipos de degeneração macular?
“A doença pode apresentar duas formas: a seca (ou
não exsudativa) e a úmida (ou exsudativa), e a avaliação dessas duas formas
geralmente envolve exames específicos da retina”, diz Goldbaum.
A degeneração dita “seca” começa com o surgimento de
drusas, pequenos depósitos de proteínas e gorduras que se acumulam sob a
retina. Elas indicam que o “sistema de limpeza” da retina, que deveria
removê-las, não está funcionando direito.
Com o tempo, esse acúmulo pode levar à degeneração
dos fotorreceptores, as células que captam a luz, o que causa uma atrofia
progressiva da mácula. Na maioria dos casos, essa forma evolui devagar e,
embora cause perdas visuais, não leva à cegueira.
Em alguns pacientes, no entanto, a DMRI seca pode
evoluir para a forma úmida, que é mais grave. Nela, vasos sanguíneos anormais
crescem sob a mácula. Eles são frágeis e podem vazar sangue ou líquido – daí o
nome “úmida” –, danificando rapidamente os fotorreceptores e causando queda
súbita e acentuada da visão.
Quais são os sintomas?
As fases iniciais da degeneração são assintomáticas.
Depois, como explica Michel Farah, oftalmologista do H.Olhos, unidade Centro
Oftalmológico São Paulo, os sintomas mais comuns são a perda da nitidez, com
baixa visão de detalhes, e a distorção da imagem (metamorfopsia).
“A pessoa olha uma linha reta e vê ondulada, mesmo
sabendo que é reta (vertical ou horizontal). Então, é uma distorção da imagem
real”, exemplifica.
O médico também cita sintomas como embaçamento da
visão e dificuldade em diferenciar cores, o que é considerado um efeito mais
tardio.
De forma geral, Farah recomenda atenção às
diferenças entre a visão de cada olho. ”Normalmente, a visão dos dois olhos
deve ser semelhante. Quando há uma diferença mais significativa entre os dois,
deve-se verificar o porquê de isso estar acontecendo", diz. Para fazer
essa comparação, basta tampar um olho com a palma da mão e depois o outro.
Por que acontece?
Os mecanismos que levam ao desenvolvimento da DMRI
ainda não são totalmente compreendidos. No entanto, alguns fatores podem ajudar
a explicar a doença, como o aumento na produção de radicais livres — moléculas
que danificam as células e cujo acúmulo é comum com o envelhecimento — e
alterações na circulação da coroide, camada do olho responsável por levar oxigênio
e nutrientes à retina.
Sabe-se também que a doença aparece por uma
combinação de diversos fatores de risco. Os principais são a idade, com
ocorrências geralmente a partir dos 50 anos, mas principalmente depois dos 70
anos, e predisposição genética.
O estilo de vida também pode induzir o quadro, o que
é chamado de “fatores de risco modificáveis”. O principal deles é o tabagismo.
“A fumaça do cigarro é rica em agentes oxidantes, então o fumo pode piorar o
risco”, diz Farah. Outros aspectos são a hipertensão arterial, obesidade e
dieta rica em gordura.
“Além disso, há fatores étnicos: é muito mais comum
em caucasianos do que em negros ou orientais”, afirma.
É possível evitar?
“É possível diminuir a chance de desenvolver a DMRI
controlando os fatores de risco que chamamos de modificáveis e que são
relacionados ao estilo de vida”, explica Goldbaum.
Aliás, mesmo em pacientes que já desenvolveram a
doença, o controle desses aspectos é importante, pois pode reduzir a gravidade
do quadro.
Farah destaca ainda que a utilização de medicamentos
antioxidantes e vitaminas ajuda na prevenção da condição. São substâncias como
luteína, zeaxantina, zinco e vitamina C, mas que devem ser administradas em
dosagens específicas, sob orientação médica.
“Na dose correta, em pacientes com drusas, que são
aqueles restos celulares do metabolismo, é possível utilizar essas vitaminas e
antioxidantes para fazer uma prevenção, diminuindo em 25% o risco de perda
visual grave ao longo do tempo”, diz.
Os especialistas destacam ainda a importância do
check-up periódico com oftalmologista, já que o diagnóstico precoce da doença
possibilita um melhor tratamento e maior chance de manter uma boa visão.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico é feito por meio do exame do fundo do
olho, biomicroscopia do fundo do olho e, se necessário, tomografia de coerência
óptica e outros exames complementares.
Qual o tratamento da DMRI?
O tratamento da degeneração macular relacionada à
idade varia conforme o tipo da doença. Na forma seca, o controle costuma
incluir uma combinação específica de vitaminas e sais minerais, além do uso de
uma tela quadriculada (chamada de grade de Amsler) para autoavaliação em casa.
“Infelizmente, esses tratamentos não diminuem muito
a progressão da forma seca, mas são importantes para evitar ou diagnosticar
precocemente a forma úmida, que é a mais grave”, diz Goldbaum.
Na forma úmida, o principal tratamento são as
injeções intraoculares de medicamentos antiangiogênicos. Eles agem bloqueando o
crescimento de vasos sanguíneos anormais e o acúmulo de líquido na mácula. Com
isso, é possível preservar a visão em grande parte dos casos.
Por fim, o diretor do CBO alerta: pacientes com a
doença que apresentarem distorção ou embaçamento súbito da visão devem procurar
um oftalmologista imediatamente.
Estadão
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