O governo Lula (PT) será cobrado pelo MST (Movimento
dos Trabalhadores Rurais sem Teto) durante as ações do chamado Abril Vermelho
em razão da lentidão na reforma agrária.
Estará também na mira da bancada ruralista, que se
articula no Congresso para tentar reverter oito atos (decretos e portarias, por
exemplo) da gestão petista em resposta ao movimento.
O cenário se desenha semanas após Lula realizar a
primeira visita a um assentamento do MST em seu atual mandato e o coloca
novamente entre a pressão do movimento —importante base social da esquerda e
que o apoiou nas eleições de 2022— e do agro —em grande parte avesso ao atual
presidente e que pode lhe impor mais uma derrota no Congresso.
A Folha questionou o Ministério do Desenvolvimento
Agrário e o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) sobre
quantas famílias foram assentadas desde 2023 até agora e sobre qual o objetivo
do conjunto de medidas editadas desde o início da gestão petista.
O ministério afirmou que questões de reforma agrária
são de competência do Incra —que é subordinado à pasta. O órgão, por sua vez,
não respondeu.
Tradicionalmente, em abril o MST intensifica não só
invasões, mas bloqueios de rodovias, protestos, mutirões de cadastramento de
famílias e outras ações —o que deve se repetir em 2025.
O mês foi escolhido porque, em 17 de abril de 1996,
ocorreu o massacre de Eldorado do Carajás, no Pará, quando a Polícia Militar
assassinou 19 militantes do movimento e deixou outros 69 feridos durante um
protesto —até hoje, apenas 2 policiais, de 155 envolvidos, acabaram condenados.
Para 2025, o lema escolhido foi “ocupar para o
Brasil alimentar”. Há previsão de ações nos 26 estados e no Distrito Federal,
com foco em terras propícias à produção de alimentos.
As manifestações acontecem em meio ao
descontentamento do movimento com o terceiro mandato de Lula e com o andamento
da reforma agrária.
Segundo o MST, quando o petista assumiu a
Presidência, cerca de 65 mil famílias do movimento cadastradas pelo Incra
aguardavam em acampamentos para serem assentadas.
“O andamento está muito aquém da demanda acumulada
nos últimos dez anos, desde o impeachment da [ex-presidente] Dilma Rousseff,
passando pelo governo Temer e pelo período de Bolsonaro”, diz José Damasceno,
da direção nacional do MST.
No terceiro ano do mandato, esse passivo cresceu,
segundo ele, para cerca de 100 mil. Se considerados outros grupos que atuam na
causa, a projeção subiria para 140 mil.
“A reforma agrária precisa sair da UTI. Há um
descontentamento da nossa base, por questões óbvias: o processo não tem
avançando. Há famílias acampadas faz 30 anos que continuam esperando a tão
sonhada reforma agrária”, diz.
Segundo ele, o movimento também busca ampliar as
formas de financiamento para a agricultura familiar e sustentável, visando a
produção de alimentos para o combate à fome no país por meio do Plano Safra, do
Programa de Aquisição de Alimentos e do Programa Nacional de Alimentação
Escolar, por exemplo.
Já a bancada ruralista quer retaliar derrubando no
Congresso normas criadas no governo Lula e que, na opinião do grupo, servem
para beneficiar invasões de terra e reduzir a segurança jurídica no campo.
Um dos objetivos é revogar o programa Terra da
Gente, lançado pelo próprio Lula no Palácio do Planalto durante o Abril
Vermelho de 2024, em um aceno do petista ao MST.
Na época, o MST realizava ações em 11 estados
brasileiros, com mais de 20 mil famílias mobilizadas, e conseguiu forçar a
exoneração do primo do então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que
chefiava o Incra em Alagoas.
O grupo critica o programa por dar poder demais ao
Executivo na destinação de terras. Também quer derrubar um decreto de março que
permite ao governo desapropriar propriedades para uso no Terra da Gente, sem
edital e incluindo imóveis da categoria médios —quando o mecanismo deveria ser
utilizado para pequenos.
“[São] problemas sérios que a gente encontrou […]
medidas que o governo tem adotado para passar por cima da legislação, com
decretos, divisão de atribuição de ministérios, transferências de
responsabilidades e financiamento de movimentos. Conseguimos puxar o fio todo”,
diz o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Pedro Lupion (PP-PR).
O objetivo é incluir a revogação de todas essas
medidas em um projeto sobre regularização fundiária já em andamento na Câmara
dos Deputados, relatado por Lupion.
Folha de São Paulo
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