Facções criminosas têm assumido o controle
clandestino do fornecimento de internet em comunidades de diferentes estados
brasileiros, expulsando pequenos provedores legais e transformando o serviço em
uma das fontes mais lucrativas para o crime organizado.
De acordo com autoridades, os grupos atuam com
ameaças, extorsões e violência para eliminar a concorrência de empresas
autorizadas. No Rio de Janeiro, no Pará e no Ceará, foram registrados diversos
casos de ataques a veículos, destruição de lojas e intimidação de técnicos.
Somente no Rio, a Polícia Civil já instaurou mais de 120 investigações desde o
ano passado para apurar a atuação de redes ilegais e obstrução à atividade
empresarial regular.
"Internet é a nova boca de fumo", afirmou
o delegado Pedro Brasil, ao destacar o grau de controle territorial exercido
pelas facções. Em áreas dominadas pelo Terceiro Comando Puro (TCP), liderado
por Álvaro Malaquias Santa Rosa, o “Peixão” — considerado o criminoso mais
procurado do estado —, provedores relataram ameaças diretas a suas equipes.
“Quem manda aqui é o Peixão. Vou te matar se não sair daqui”, diz um dos áudios
obtidos pela reportagem.
Um provedor do norte fluminense, que preferiu não se
identificar, revelou que decidiu encerrar as operações após sucessivos
episódios de coação. “O que chateia mais é o cara dizer que, se você não
atender aos desejos dele, o seu funcionário vai descer do poste na bala”,
contou.
Além das ameaças presenciais, os criminosos impõem
regras via aplicativos de mensagens. Em um dos áudios encaminhados a clientes,
um integrante do grupo afirma: “Peço a colaboração de todos, entendeu? Pra não
passar por cima da nossa ordem. Ordem de forças maiores.”
O avanço dessas redes ilegais não se restringe ao
Sudeste. No Pará, o Comando Vermelho é apontado como responsável por ameaças a
empresas de internet. Em Ananindeua, na Região Metropolitana de Belém, um carro
de provedor foi incendiado em janeiro. Já no Ceará, ao menos 13 ataques foram
registrados em seis semanas. Técnicos foram expulsos, lojas destruídas e cerca
de 16 mil moradores da cidade de Caridade ficaram sem serviço. No total, 15
empresas encerraram suas atividades no estado.
Autoridades alertam que a expansão do domínio
criminoso sobre a infraestrutura de internet representa um grave risco à
segurança digital. Sem qualquer regulação, essas redes clandestinas
possibilitam acesso irrestrito a dados, o que pode facilitar golpes, espionagem
e disseminação de malwares.
“A gente tem medo que isso escale para o Brasil
inteiro, por não ter um retorno rápido da segurança pública. Estamos falando de
segurança nacional”, declarou Mauricélio Oliveira, presidente da Associação
Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint).
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)
estima que o país conta com mais de 20 mil pequenos e médios provedores.
Juntas, essas empresas investiram cerca de R$ 18 bilhões em infraestrutura nos
últimos dois anos. A agência informou estar à disposição das forças de
segurança para colaborar tecnicamente na identificação das redes ilegais.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Rio de
Janeiro afirmou estar em contato com a Anatel e já ter mapeado áreas de atuação
das facções. No Ceará, segundo o governo estadual, 48 pessoas foram presas sob
suspeita de envolvimento nos ataques. A secretaria também informou que
fiscaliza o comércio irregular de provedores nas regiões onde o serviço foi
interrompido.
Portal 96
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