É comum pessoas se dizerem “mais leves” ao saírem de
algum programa de exercícios físicos. É algo que o corpo e sobretudo a mente
também sentem, confirmando vários estudos que associam os benefícios das
atividades físicas à saúde mental. Quadros de ansiedade e depressão, geralmente
tratados com medicação, também podem ter os exercícios físicos como aliados em
forma de terapia complementar. As vantagens físicas também são emocionais e
cognitivas, fortalecendo a saúde geral do paciente.
O exercício físico é amplamente reconhecido como um
modulador eficaz do circuito responsável pela regulação das emoções e pela
redução do estresse crônico, afirma a bióloga Nicole Galvão, professora do
departamento de fisiologia e comportamento da UFRN. “Durante a prática de
atividades físicas há a liberação de importantes moléculas, hormônios como a
endorfina, e neurotransmissores como serotonina e dopamina”, diz.
Nicole ressalta que os agentes hormonais e
moleculares liberados pelas atividades físicas desempenham papéis cruciais na
promoção do bem-estar, contribuindo diretamente para a redução dos níveis de
estresse e para o equilíbrio emocional, o que auxilia na melhora, por exemplo,
do sono – que é frequentemente prejudicado em quadros de ansiedade e depressão.
A bióloga foi orientadora de uma pesquisa de
doutorado que investigou, durante dois anos, o papel do exercício físico como
um tratamento adicional para sintomas depressivos. Participaram estudantes e
servidores da universidade diagnosticados com transtorno depressivo maior.
A pesquisa, que fez parte do trabalho de doutorado
de Deuel Tavares, também integra um programa mais amplo chamado “Enfrentamento
à Tristeza”, que busca tratar pacientes com depressão por meio de diferentes
abordagens de terapias complementares, incluindo yoga e meditação, além de
comparar essas abordagens com o tratamento farmacológico exclusivo.
O estudo conduzido pelo programa de Psicobiologia da
UFRN mostrou que as atividades físicas podem ser aliadas dos medicamentos,
sendo eficaz para a melhoria do sistema cardiorrespiratório e contribuindo com
os efeitos dos remédios. Os exercícios também tiveram boa adesão dos
participantes, colaborando com a medicação para melhorar seus quadros físico e
mental. Segundo Deuel, quando o medicamento não é suficiente para aliviar os
sintomas depressivos, os exercícios entram para ajustar mecanismos
fisiológicos, comportamentais e emocionais.
Segundo Nicole, a pesquisa confirmou que o exercício
físico também é eficaz na redução dos sintomas depressivos em pacientes que
estão sob “monoterapia”, ou seja, aqueles com depressão leve, cujo único
tratamento é a prática regular de exercícios físicos, sem o uso de
antidepressivos. “Essa abordagem pode evitar os efeitos colaterais das
medicações e, quando há boa aderência ao protocolo, os resultados costumam ser
significativos e satisfatórios”, diz ela.
Por outro lado, em casos mais graves, ressalta a
bióloga, o exercício físico deve ser utilizado como terapia complementar,
atuando de forma adjunta ao tratamento farmacológico. “Nossos estudos também
evidenciam que essa combinação não apenas intensifica a resposta
antidepressiva, mas traz benefícios adicionais, como melhora na qualidade do
sono, redução de processos inflamatórios relacionados à depressão, e diminuição
dos níveis do hormônio do estresse (cortisol)”, afirma.
Um ponto que Nicole Galvão destaca, tem a ver com os
tipos de exercício. “Estudos têm demonstrado que tanto os exercícios aeróbicos
quanto os de força desempenham um papel importante na regulação do humor e,
consequentemente, na redução dos sintomas depressivos. No entanto, um desafio
significativo no tratamento da depressão por meio do exercício físico é a
aderência ao programa”, explica.
A anedonia, um dos sintomas da depressão, é
caracterizado pela perda do prazer em atividades antes consideradas agradáveis.
Esse é o sintoma que mais costuma dificultar a adesão de pacientes depressivos
a atividades físicas. “Portanto, mais do que determinar qual tipo de exercício
é mais eficaz, o verdadeiro desafio reside em garantir que o paciente consiga
manter uma rotina regular de exercícios”, enfatiza.
Quanto à freqüência, apesar da recomendação sobre
bons resultados indicarem 150 minutos semanais de exercícios, a bióloga afirma
que o mais importante, inicialmente, é que o paciente saia do sedentarismo.
“Isso significa que não é necessário atingir imediatamente essa meta semanal.
No estudo citado, o protocolo tinha 120 minutos semanais”, completa.
Em muitos casos, é mais eficaz começar com
protocolos menos exigentes, que demandem menos esforço físico e psicológico do
paciente, especialmente quando se trata de alguém com uma condição de saúde
debilitada. O aspecto mais relevante nesse estágio inicial, segundo Nicole, é
garantir que haja aderência ao programa de exercícios, permitindo que o
paciente desenvolva gradualmente uma rotina consistente e sustentável.
Evidências de estudos também conduzidos na UFRN
mostram que, para pacientes com depressão, um fator que pode se sobrepor à
importância do tempo total de exercício semanal é o quanto o paciente gosta de
realizar aquela atividade física. “Ou seja, não se trata apenas de alcançar um
número específico de minutos, mas de construir uma relação positiva e afetiva
com o exercício”, ressaltou a professora.
O exercício físico, portanto, atua como um
tratamento holístico, indo muito além da simples redução dos sintomas
depressivos. Por promover a saúde geral do paciente, diz Nicole, a
implementação nos protocolos de tratamento da depressão deve ser considerada
não apenas como uma recomendação adicional, mas como uma ferramenta terapêutica
essencial.
Segundo a bióloga e professora, os resultados da
pesquisa realizada no programa de pós graduação em Psicobiologia da UFRN, vêm
sendo publicados ao longo de 2024. Ainda há dados em fase final de análise,
como os relacionados à redução de processos inflamatórios e à regulação do
hormônio do estresse, o cortisol.
Até o momento, quase 300 pacientes já foram triados,
agendaram consultas e acessaram o aplicativo “Enfrentamento à Tristeza”,
desenvolvido em colaboração com a empresa de telemedicina Upsaúde.
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