Gabriela Liberato
Repórter
A depressão é uma doença que com o passar dos anos
vem atingindo números cada dia maiores. Mas o que pouco se fala é sobre o
quanto a doença vem atingindo a população idosa. Segundo o IBGE, entre 2013 e
2023 a incidência da doença aumentou 48% entre idosos de 75 anos ou mais. Após
a campanha Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio, e aliado ao Dia do
Idoso, celebrado no dia 1º de outubro, torna-se necessário o alerta sobre como
a doença impacta essa fração da população, e quais os sinais que as famílias
devem buscar para saber quando procurar ajuda médica.
A depressão é comumente caracterizada pelos sintomas
de apatia, isolamento e tristeza, mas em idosos o quadro pode ser apresentado
de formas diferentes, sendo as principais alterações as mudanças no apetite e
no sono, podendo se manifestar com aumento ou redução de ambos, é o que explica
a geriatra Natália Guedes. “As mudanças do sono podem ser apresentadas tanto
através de uma maior sonolência, como também na ausência, com episódios de
insônia”, explica.
Por essas mudanças, outro fator importante que deve
ser observado em idosos é a mudança no seu peso, uma vez que perda ou ganho
repentino de peso também podem ser indicativos de alterações comportamentais em
idosos. Natália também explica que outra alteração de comportamento pode ser o
prurido, ou coceira, que, quando investigada enquanto fator clínico, e
associada a outros comportamentos, percebe-se que seja um indicativo do quadro
depressivo em idosos.
A crescente do número de casos de depressão em
idosos aumenta a preocupação com a doença, levantando também os questionamentos
acerca das causas do mesmo. A geriatra Natália explica que o quadro surge na
terceira idade pelo momento de vida comum aos idosos, uma vez que, após a
aposentadoria, a perda da rotina faz com que muitos idosos se vejam diante do
sentimento de invalidez e impotência, sem a oportunidade de realizar atividades
que antes lhes traziam sentimento de completude.
“Não podemos esquecer que é também na terceira idade
que acontecem maiores perdas familiares, com a morte de parentes e amigos,
reduzindo ainda mais o ciclo social do idoso. E muitas vezes também é um
momento de uma redução da renda familiar, devido à aposentadoria e aumento de
gastos médicos decorrentes da idade”, completa Natália.
Diante da maior longevidade populacional, a médica
enfatiza a necessidade de existir um maior debate sobre o envelhecer,
destacando as necessidades desta parcela da população, para que todos saibam
como lidar com as questões que surgem com a idade. “É muito provável que muitos
de nós cheguemos a essa faixa etária, então precisamos nos preparar para esse
momento da vida”, reflete.
Natália também destaca que além da necessidade de
maior preparo financeiro prévio para o período da vida, é importante também a
preocupação com os fatores sociais e físicos que permeiam o dia a dia dos
idosos, alertando para a necessidade de envolvimento social do idoso, a partir
da participação em atividades e grupos para que exista o estímulo comunicativo,
e destaca também a importância da atividade física para a manutenção da saúde
mental, bem como também da saúde física, alertando que o cuidado com
comorbidades como hipertensão e diabetes também são formas de evitar quadros de
depressão.
“Manter-se sempre ativo faz com que nos tornemos
funcionais por mais tempo, consequentemente tendo maior percepção de ser útil
para os outros, e assim nós conseguimos reduzir a probabilidade de
comprometimento do humor nas idades mais prolongadas”, explica a geriatra.
Depressão versus demência
A geriatra Natália Guedes também alerta para a relação
entre a depressão e a demência, comum à terceira idade. Pela similaridade dos
quadros, ambos podem ser confundidos, e muitas vezes o atraso do diagnóstico
aumenta a probabilidade de uma piora nos quadros, que são caracterizados por
mudanças de comportamento como apatia e desinteresse em atividades comuns ao
cotidiano.
“O início do quadro da demência, que chamamos de pródromo, pode ser associada à
depressão, e vice-versa, pois a depressão quando não tratada pode influenciar
no desenvolvimento da demência de uma forma precoce também”, explica Natália.
Pela fácil associação dos quadros de depressão e
demência, a geriatra enfatiza que as formas de prevenção de ambos os quadros
também são as mesmas. Com destaque para a sociabilidade enquanto fator de
prevenção dos quadros, a geriatra explica que o déficit auditivo é um problema
que pode afetar a inclusão social do idoso, e que, quando permitido o
tratamento, facilita a participação social do idoso nos ambientes sociais.
“Para a devida prevenção, de ambos os casos, é
necessário que a população faça um acompanhamento corriqueiro junto à equipe
médica, para que possa existir um rastreamento e diagnóstico, até mais precoce,
dos quadros de depressão e demência”, destaca.
Tratamento no SUS é desafio
Vivenciando as lutas do sistema público de saúde, a
geriatra Luciana Maranhão destaca que o ponto fundamental para a eficácia do
tratamento da depressão em idosos é o preparo profissional para o atendimento
dessa parcela da população, e explica que hoje em dia já ocorre a capacitação
dos profissionais em atendimento primário, para que seja maior a probabilidade
de diagnóstico do quadro da doença desde o atendimento básico. “Deve ser rotina
do médico enxergar o idoso por completo, e não apenas diante da especialidade”,
conta.
Por razão das dificuldades de atendimentos na rede
pública, a médica explica que, no atendimento primário, os profissionais da
rede pública seguem sendo capacitados para que seja iniciado o tratamento antes
que seja encaminhado para o atendimento especializado, assim sendo possível
reduzir o atraso no acompanhamento daquele paciente. Assim sendo, Luciana
explica que assim o paciente só será encaminhado ao especialista, seja geriatra
ou psiquiatra, quando o quadro não apresentar melhora no tratamento primário.
“É preciso ser analisado, desde o atendimento
primário, todo o quadro do paciente. Pois, além da possibilidade de haver outra
doença mascarando a depressão, ou até mesmo a depressão mascarando outra
doença, há também a possibilidade do quadro depressivo estar sendo causado por
algum medicamento que o paciente esteja fazendo uso. Por isso a necessidade do
paciente ser enxergado como um todo, e não apenas diante da especialidade
médica”, explica Luciana.
Entretanto, nem sempre há a possibilidade de ser
realizado esse atendimento primário, uma vez que não é certeza o idoso ter
suporte familiar e/ou condições física ou mental, para ser diretamente
direcionado para o atendimento médico. Nessas situações, a geriatra Luciana
destaca a importância dos agentes comunitários de saúde, que realizam visitas
aos domicílios dos idosos, e têm conhecimento do comportamento de seus
pacientes, o suficiente para notar possíveis mudanças.
Visando a maior visibilidade do idoso, a geriatra
conta que nas Unidades Básicas de Saúde existe a avaliação multidimensional da
pessoa idosa, que visa a avaliação clínica, psicológica e funcional. “É através
dessa avaliação, realizada por qualquer agente de saúde, que nós temos como
suspeitar de possíveis quadros de depressão naquele idoso. É por isso que é
necessário o atendimento recorrente”, explica Luciana.
Aumento da taxa de suicídio entre idosos
A taxa de suicídio em idosos cresceu nos últimos
anos, preocupando órgãos de saúde. Segundo o Ministério da Saúde, entre 2010 e
2023 o número de idosos que tiraram a própria vida aumentou de 6,8 para 7,8 a
cada 100 mil habitantes. O número preocupa especialistas, que explicam que o
aumento pode se dar tanto à maior expectativa de vida, como ao maior número de
idosos atingidos por diferentes problemas nos últimos anos.
“Temos um número maior de idosos na população e, sem
um devido acompanhamento e tratamento e, principalmente, sem perspectiva de
melhora do agravo que ele apresenta, o idoso opta por tirar a própria vida”,
explica a geriatra Luciana, acrescentando também que, dos casos de suicídio,
75% dos pacientes visitaram o consultório médico no mês anterior, e não
apresentavam os sinais que dão indícios de sentimentos suicídas.
Com relação ao aumento da taxa de suicídio, a
geriatra Natália Guedes explica que se dá pela maior efetividade da realização
do suicídio no idoso, do que em outras faixas etárias. Natália também associa o
aumento do agravo em idosos ao maior isolamento dos tempos atuais, seja após a
pandemia do Covid-19, ou até mesmo aos tempos de redes sociais e interações
virtuais.“O maior conhecimento, e também a busca ativa, eleva o número de
diagnósticos de depressão nos últimos anos”, explica Natália.
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