Parque Tecnológico Metrópole Digital compreende trechos de cinco bairros ao redor do Instituto Metrópole Digital - prédio vermelho ao centro. — Foto: Arthur Varela
Conhecida como noiva do sol e vocacionada para o
Turismo, Natal quer se tornar polo de outro mercado: o da Tecnologia da
Informação (TI). Os primeiros passos foram dados há dois anos, com a criação do
Parque Tecnológico Metrópole Digital, em agosto de 2017. Desde então, a
iniciativa atraiu 46 empresas da área, que englobam aproximadamente 740
empregos. Para os vários envolvidos, os resultados ainda são pequenos, porém
chegaram muito antes do previsto.
"A gente fez um estudo que evidenciou que os
parques que têm na faixa de 30 a 60 empresas são parques com pelo menos seis
anos de maturidade. É um número espetacular. Mesmo alguns que hoje são
conhecidos mundialmente no segundo ano estavam tateando com cinco ou seis
empresas", comemora o professor Anderson Cruz, diretor do Parque Metrópole
Digital.
A iniciativa foi da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte (UFRN), através do Instituto Metrópole Digital (IMD), junto com a
prefeitura da capital potiguar, além do próprio setor privado. Ela compreende
uma área geográfica com raio de dois quilômetros ao redor do campus e abrange
partes de cinco bairros da cidade, onde as empresas que queiram participar
devem estar instaladas.
As empresas sediadas nessa região e credenciadas ao
parque podem ter acesso a benefícios fiscais, com redução de até 75% no IPTU,
de 30% no ITIV, 60% no ICMS, isenção da taxa de licença de localização e
redução para 2% no ISS. Os incentivos são previstos em lei municipal aprovada
em julho de 2017, sancionada após um trabalho do IMD junto com o Executivo e a
Câmara de Vereadores da capital potiguar.
Além disso, as organizações podem usufruir de serviços
de capacitação e de infraestrutura, inclusive com acesso às estruturas físicas
e tecnológicas do Metrópole Digital, como o centro de processamento de dados
(datacenter). O instituto também colabora com a formação de pessoas para
trabalhar no setor. São cursos que vão do nível técnico, passando pela
graduação e especializações, até o doutorado. Toda a estrutura abriga 3.500
estudantes. Vantagem também para eles, que têm maiores oportunidades.
Entre as empresas ligadas ao projeto, existem aquelas
que foram incubadas no próprio Metrópole Digital, as que já passaram pelo
processo de incubação e foram "graduadas", bem como outras novas, que
abriram após a iniciativa e decidiram se instalar dentro da área. Também há
empresas mais antigas, que já estavam dentro da área geográfica ou mudaram-se
após a abertura do parque. Agora o parque também busca atrair investidores de
fora do estado.
Segundo o diretor, o objetivo é criar um polo de TI em
Natal, que gere "simbiose" entre os setores público, acadêmico e
privado. Além de incentivar o setor tecnológico, ele defende que o impacto
recai sobre a economia de modo geral, já que as soluções criadas na área
costumam ser incorporadas tanto na indústria como no comércio. Outra vantagem é
a manutenção dos talentos formados pela UFRN no estado, bem como a importação
de outros.
"Acaba que as empresas lucram mais, geram mais
renda, mais impostos para o setor público e empregos qualificados. A
universidade ganha com novas fontes de recursos, com projetos, e a formação
continuada dos seus talentos, já diminui a exportação que havia. Eles continuam
aqui. Do total de empregos, 60% exigem pelo menos ensino técnico. É um jogo de
ganha-ganha", defende o diretor do instituto. Somente no ano passado, o
parque atraiu investimentos de R$ 3 milhões em editais.
O foco é nas empresas de desenvolvimento de softwares,
hardwares e capacitação de alta complexidade. Embora pareça um nicho limitado,
os produtos desenvolvidos ao longo de dois anos, são os mais variados, segundo
Anderson Cruz.
Há empresas que geram soluções de TI para gestão da
educação pública e hospitais, outras de comunicação em fibra ótica, que criam
infraestrutura e infovias para o desenvolvimento da cidade; educação em
robótica; coleira para cachorros cegos; empresas que ajudam empresários a
acharem seus clientes e outras que auxiliam o paciente na marcação de médico de
forma online, sem fila. Enfim, uma variedade de soluções que não se limitam ao
mercado local, mas já alcançam outros estados e até outros países.
Questionado se o objetivo seria criar um Vale do
Silício brasileiro - em referência à região da Califórnia, nos Estados Unidos,
onde estão reunidas algumas das principais empresas de tecnologia do mundo - o
professor diz que sim, ressalvando as proporções.
"O Vale do Silício é o parque tecnológico urbano
mais emblemático do mundo, a menina dos olhos de qualquer polo tecnológico. Em
outras palavras é isso. Queremos ser um vale do silício potiguar, ou
papa-jerimum", diz.
Mão de obra qualificada em casa
Uma cidade que ofereça boas oportunidades de trabalho,
boa moradia e oportunidades de lazer é a ideal para manter e atrair talentos na
área de tecnologia, na concepção do diretor do parque tecnológico, Anderson
Cruz.
Essa também é a ideia do empresário potiguar Gleydson
Lima, diretor da empresa Esig Software e Consultoria, que se considera um
"bairrista". A empresa foi a primeira graduada da incubadora da
universidade e hoje emprega quase 150 pessoas, em um prédio bem próximo ao IMD.
Os cerca de 80 clientes, principalmente universidades, institutos públicos e
secretarias de educação, estão espalhados em 22 estados brasileiros.
"Eu sou natalense e quero desenvolver aqui. Se
qualquer cidadão tiver condição de ter um emprego qualificado igual ao de fora,
prefere ficar aqui ou sair? A grande maioria prefere ficar junto da família, da
sua história. O problema é esse termo: emprego qualificado. Como o mercado de
tecnologia permite que você fique em um local e venda para fora, preste
serviços remotos, é mais fácil criar empregos qualificados.
Agora há alta
demanda por mão de obra qualificada. Tem que ter um conhecimento
razoável", reforça, lembrando a importância da universidade nesse
processo.
Ele também defende outros parques tecnológicos que já
existem no país contam com os mesmos incentivos fiscais, portanto, a iniciativa
dá, pelo menos, a condição de igualdade de competição. Porém, ressalta, que
muito mais que um benefício para o setor, um parque tecnológico pode trazer
incentivos para a cidade como um todo.
"Você tem casos interessantes como Florianópolis,
que vivenciou durante 20 anos uma transformação econômica. Ela vivia do turismo
e hoje em dia o PIB de tecnologia é quase o dobro do de turismo. Eles
conseguiram dar a virada. O turismo é importante, mas não é uma indústria de
valor agregado. Você depende do visitante, não exporta.
Florianópolis mudou
isso. Isso pode ser um caminho para o Rio Grande do Norte. Iniciativas têm
surgido. Essa é a ideia do Metrópole Digital, mas é preciso ter o pé no
chão", pondera.
Empreendedores e empreendimentos variados
Embora a tecnologia seja muito associada aos novos
empreendedores e as startups, até mesmo empresários mais experientes estão de
olho no futuro que se abre. Entre os sócios da Inovanet, uma empresa que
trabalha com linhas de fibra ópticas e é responsável pela construção e
manutenção da infovia potiguar, que vai ligar Natal a João Câmara, há
empreendedor com mais de 70 anos. A empresa é outra que se credenciou ao
parque, se instalando no bairro de Capim Macio.
"Não existe idade quado você é uma pessoa que
pensa fora da caixa, está antenado, buscando desenvolvimento", afirma o
diretor executivo da empresa, James Dhean Lima, de 44 anos, que ressalta a
relação com a universidade na busca pela inovação. "Hoje ninguém faz nada
sozinho. Por isso a gente precisa estar sempre em contato", reforça.
"A gente chega a um momento que vê que as
soluções que nós temos hoje não têm mais como se expandir. A experiência que
você tem gera uma insatisfação, em busca de algo que seja disruptivo",
comenta outro sócio dele, o diretor de planejamento da empresa, Carlos
Alexandre. Segundo ele, que trabalhou por mais de 25 anos no setor público, a
empresa também quer desenvolver soluções para o poder público, que ele acredita
ser o mais atrasado, quando o assunto é implementação de tecnologia no
atendimento à população.
Só depois de morar 15 anos na França, Andressa Matias
também resolveu desenvolver sua própria startup, que está em fase final de
incubação na Inova Metrópole - a incubadora do instituto - já credenciada no
parque. A equipe do Instituto Gepetta, que desenvolve vídeos animados para
empresas principalmente da área de TI, é composta por 15 pessoas. 70% dos
clientes são internacionais e em 4 anos, mais de 300 vídeos, cujos médios
variam entre R$ 8 mil e R$ 9 mil, já foram produzidos.
Soluções criativas não faltam. Quem pensaria em criar
uma plataforma que reuniria apenas fotografias de surfe para serem colocadas à
venda? Victor Hugo Fernandes, ceo da Surfmapper, não apenas pensou como colocou
a ideia em prática. A empresa é outra que já está no parque tecnológico, mesmo
ainda estando incubada.
A plataforma reúne 5 milhões de fotos em 25 países,
interligando 2,5 mil fotógrafos a 80 mil surfistas. Nos últimos três anos,
foram vendidas mais de 60 mil fotos - uma movimentação de mais R$ 1 milhão. A
equipe é formada por profissionais locais, além de outros que trabalham
remotamente, até do Caribe. A empresa está em fase de captação de
investimentos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário