A Receita Corrente Líquida (RCL) do Rio Grande do
Norte cresceu 14% nos meses de setembro e outubro deste ano, mas o percentual
de investimentos do estado segue pressionado por um alto comprometimento com
despesas, que cresceram no mesmo ritmo. Em números absolutos, o valor
registrado como receitas correntes foi de R$ 19 bilhões no 5º bimestre de 2025,
enquanto que no mesmo período do ano passado o total foi de R$ 16,7 bilhões. Em
comparação com outros estados da região Nordeste, o aumento foi o segundo maior
no período.
O estado potiguar também registrou um aumento de 14%
na despesa corrente, que chegou a R$ 17,5 bilhões no 5º bimestre deste ano. No
mesmo período do ano passado, o valor foi de R$ 15,4 bilhões. Os dados são do
Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO) em Foco, realizado pela
Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e pelo Ministério da Fazenda, e se referem
ao valor líquido arrecadado pelo estado após a dedução de repasses obrigatórios
e outras parcelas que não são de livre uso pelo poder público. Em outras
palavras, trata-se da receita bruta, menos os recursos destinados aos repasses
constitucionais e legais.
Na região Nordeste, o crescimento na RCL do Rio
Grande do Norte perdeu apenas para o registrado por Sergipe (16%). De acordo
com o economista Thales Penha, professor na Universidade Federal do Rio Grande
do Norte (UFRN), os valores do relatório ainda não estão corrigidos pela
inflação. Isso significa que tanto a receita quanto a despesa corrente líquida
diminuiriam na mesma proporção do ponto de vista relacional. Ele pondera ainda
que os números positivos na arrecadação foram acompanhados pelo aquecimento da
economia potiguar, com a melhora nos índices de desemprego.
“Isso tem um efeito na arrecadação tributária do Rio
Grande do Norte. No relatório, vemos que as receitas da arrecadação dos
tributos estaduais, como ICMS, IPVA e outras cotas, mas principalmente do ICMS,
que é responsável por cerca de 92% da arrecadação tributária estadual, é maior
do que as transferências correntes. Então o estado está arrecadando mais por
arrecadação própria do que recebendo transferências da União”, explica Thales
Penha.
O economista Ricardo Valério, superintendente do
Conselho Regional de Economia do Estado (Corecon/RN), reconhece a participação
da máquina tributária no resultado obtido pelo estado, mas lembra que os meses
de outubro a março são tradicionalmente positivos para a arrecadação, e o
mercado varejista também vem registrando crescimento acima da média nacional.
“O Estado recebeu repasses federais expressivos que
contribuíram com uma maior liquidez e saldos disponíveis, sem deixarmos de
considerar que a inflação ajuda a inflar a base de arrecadação. Além disso, o
quinto bimestre é tradicionalmente um período de melhora da arrecadação em
todas as unidades do País. Essa tendência de aumento na base da arrecadação
estadual segue até março de 2026”, completa o superintendente.
De acordo com o levantamento da Secretaria do
Tesouro Nacional, o resultado orçamentário do RN (receitas realizadas menos
despesas liquidadas em relação à RCL proporcional até o 5º bimestre) foi de R$
1 bilhão, o que representa 6% em relação a RCL. O dado corresponde a uma queda
em comparação com o mesmo período do ano passado, quando o resultado
orçamentário foi R$ 1,05 Bi, ou seja, 8% em relação à receita corrente.
Segundo Thales Penha, a oscilação nas margens
refletem a situação crítica em que as contas públicas do Estado se encontram há
muito tempo. Isso porque o orçamento está pressionado tanto pela folha de
pessoal quanto pelos gastos tributários. O resultado disso é a baixa capacidade
de investimentos e a maior dependência de transferências federais e
investimentos privados.
Já Ricardo Valério chama atenção para o fato da base
tributária ser pouco diversificada e dependente do setor de comércios e
serviços. Na avaliação dele, a resolução do problema não é de curto prazo e
passa pelo fortalecimento da economia potiguar por meio do poder de geração de
energia limpa e renovável como fator diferencial do estado.
O RREO em Foco aponta que no Rio Grande do Norte as
despesas com pessoal respondem por 73% das despesas liquidadas em relação à
receita total até o 5º bimestre deste ano. Já os investimentos correspondem a
3%, valor maior apenas que os serviços da dívida (2%), enquanto as despesas de
custeio são responsáveis por 17%.
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE procurou a
Secretaria da Fazenda do Estado (Sefaz/RN) para discutir, dentre outros pontos,
o que motivou o aumento da receita no 5º bimestre, o baixo percentual de
investimentos e quais foram as medidas da pasta para conter as despesas. O
órgão afirmou que não conseguiria responder aos questionamentos.
Folha de pessoal compromete orçamento
A Secretaria de Administração do Estado (Sead/RN)
disse que atualmente os pisos constitucionais, o aumento do salário mínimo e o
crescimento no fluxo de servidores da ativa para a inatividade, com vedação de
reposição, são os principais fatores responsáveis por pressionar a folha de
pagamento no Estado.
Embora tenha frisado que os indicadores utilizados
para a avaliação da saúde financeira e fiscal do Estado não são do RREO, mas
sim o do Relatório de Gestão Fiscal (RGF), de periodicidade quadrimestral, a
pasta reconheceu que a estrutura atual não é adequada e atribuiu o cenário às
decisões tomadas no passado, especialmente com a nomeação de “dezenas de
milhares de servidores” até a década de 1980.
“Não há solução instantânea para a folha e quem faz
essa afirmação não conhece a estrutura de pessoal do Estado. A resolução será
natural e gradual, ocorrendo à medida que os vínculos forem sendo encerrados ou
substituídos. Em paralelo, é necessário que o governo administre a gestão da
folha, de modo que o gasto de pessoal não cresça mais que a variação da receita
corrente líquida”, afirmou.
O economista Thales Penha explica que atualmente a
taxa de despesa com pessoal tem crescido de forma mais acelerada em relação à
receita. Na avaliação do economista, isso acontece porque o estado não
apresenta uma lógica de estruturação de carreiras, o que desencadeia uma série
de conflitos entre diferentes categorias trabalhistas por maior valorização.
“Sobre isso, existem outros problemas, como o nosso
federalismo fiscal esquizofrênico, em que um deputado lá de Brasília, de um
outro Estado, define, por exemplo, um piso que um determinado município ou
estado tem que aplicar sem saber sua capacidade orçamentária”, argumenta o
economista.
Uma visão semelhante é apresentada por Ricardo Valério.
Para ele, a adoção do piso salarial para algumas categorias, além de algumas
promoções voltadas aos militares, contribuíram para a saída do limite
prudencial do estado com folha de pessoal. “Isto pressiona, sem dúvidas, o
equilíbrio orçamentário e limita os recursos disponíveis para investimentos,
que se situam em um percentual muito baixo para atendimento das demandas da
população”, completa.
Segundo dados da Sead/RN, a folha bruta atual é de
R$ 933 milhões, dos quais R$ 445 milhões são destinados ao pagamento de
servidores ativos e R$ 487 milhões ao pagamento de aposentados e pensionistas.
A pasta afirma que há uma perspectiva de redução gradual do gasto
previdenciário devido ao perfil demográfico do quadro de servidores. A
expectativa, de acordo com estudos do Governo, é que o comprometimento do gasto
com pessoal em relação à receita corrente líquida fique abaixo de 49% em 2030.
Uma solução para a situação dos gastos com pessoal
no médio e longo prazos, na avaliação de Thales Penha, seria acomodar a despesa
por meio da criação de alguns mecanismos. É o caso de vincular o aumento das
contratações e reajustes salariais ao desempenho das receitas. “Isso não vai
reduzir de hoje para amanhã, pois é um processo de longo prazo. Mas na
economia, melhor do que você fazer um ajuste radical, é melhorar o horizonte
temporal”, destaca.
A Sead/RN afirma que está estudando algumas medidas
para aliviar a pressão na folha em 2026. É o caso das políticas de RH, para
manter o servidor público na atividade por mais tempo e a adoção de uma
política uniforme de recomposição das carreiras, para aliviar a pressão na
folha.
RN apresenta déficit na previdência
Fora o comprometimento da folha com pessoal, a
situação previdenciária do Governo também é desafiadora. De acordo com o
levantamento da Secretaria do Tesouro Nacional, o Regime Próprio de Previdência
Social (RPPS) do estado apresentou um déficit de -11% em relação à receita
corrente líquida. Em números absolutos, o valor do fundo em capitalização foi
de -1,7 milhões até o quinto bimestre deste ano, representando um aumento em
relação a 2024, quando o total foi de -1,4 milhões.
De acordo com a Sead/RN, o gasto previdenciário
representa “um peso estrutural” na despesa com pessoal do Poder Executivo, uma
vez que 51% dos recursos são para aposentados e pensionistas, enquanto 49% é
destinado para os servidores ativos. O cenário, na visão da pasta, é resultado
do ingresso expressivo de servidores entre as décadas de 1970 e 1980, que
passaram a se aposentar em larga escala a partir de 2010.
Em 2010, de acordo com dados da pasta, o estado
possuía 63 mil servidores ativos e 33 mil aposentados e pensionistas. Neste ano,
o quadro se inverteu: são 45 mil ativos e 62 mil aposentados e pensionistas.
Para a Sead/RN, o problema precisa ser discutido com soluções a longo prazo e
não imediatas.
Ricardo Valério também avalia que o problema foi
herdado de gestões passadas e exige uma nova reforma da previdência.
“Independente de quem sejam os próximos governantes no Brasil e do Estado,
teremos que ter uma nova reforma da nossa previdência, pois a tendência é o
agravamento da situação”, argumenta.
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE procurou o
Instituto de Previdência dos Servidores Estaduais (Ipern) para uma avaliação
sobre o aprofundamento do déficit previdenciário e quais medidas estão sendo
tomadas em relação ao cenário atual. Em resposta, o Órgão respondeu que
concederia entrevistas somente a partir da próxima semana.

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