Depois de quatro décadas de profissão, aprendi a
reconhecer situações graves. A história do ministro Alexandre de Moraes com o
Banco Master não é grave. É gravíssima.
Gravíssima a ponto de ser escandalosa.
Reiteradamente, o ministro procurou o presidente do Banco Central, Gabriel
Galípolo, para pressionar em favor da venda do Banco Master para o BRB, de
acordo com a jornalista Malu Gaspar.
Foram, pelo menos, quatro contatos: três telefônicos
e um presencial. Moraes convocou Galípolo para conversar sobre o tema que não
lhe deveria dizer respeito. Na reunião, o ministro afirmou que gostava de
Daniel Vorcaro e repetiu o argumento do “banqueiro” de que o Master incomodava
por estar ocupando espaço dos grandes bancos.
Já seria suficientemente grave um ministro do STF
pressionar o presidente do BC em favor de qualquer banco. Mas o Master não é
qualquer banco. É cliente do escritório de advocacia da mulher de Moraes.
A recapitulação é forçosa porque esclarecedora.
A doutora Viviane Barci de Moraes é um fenômeno da
advocacia nacional. No início de 2024, ela assinou um contrato fabuloso com o
Banco Master, no valor de cerca de R$ 130 milhões de reais, a ser pago em
mensalidades de R$ 3,6 milhões.
Honorários dessa magnitude são inéditos para escopo
bastante genérico: acompanhar o que fosse do interesse do cliente em todas as
instâncias de poder em Brasília, inclusive no BC.
Apesar do valor do contrato, não há notícia de que
as instituições citadas no documento tenham recebido pedidos de reunião ou
petições da parte do escritório da doutora Barci de Moraes, como publicou Malu
Gaspar. Até prova em contrário, o dinheiro embolsado foi ganho sem maior
esforço.
Estranhamente, a ausência de trabalho não incomodava
Daniel Vorcaro. Pelo contrário, ele priorizava os pagamentos mensais à advogada
que contratou a peso de muito ouro. Para se ter ideia da dimensão do pote no
final do arco-íris, o patrimônio pessoal da doutora pulou de R$ 24 milhões, em
2023, para R$ 79,7 milhões, em 2024, graças aos dividendos proporcionados pelo
Barco Master, segundo o jornalista Lauro Jardim.
Agora se sabe, porém, que durante a vigência do
contrato, com as mensalidades caindo pontualmente na conta do escritório da
doutora Barci de Moraes, o ministro Alexandre pressionou o presidente do BC em
favor do cliente da sua mulher.
Nem a advogada milionária, nem o ministro do STF se
dignaram até o momento a explicar a invulgar ligação contratual dela com Daniel
Vorcaro e a deferência especialíssima que Moraes demonstrou ter pelo
“banqueiro”.
A única manifestação pública foi uma nota divulgada
hoje pelo ministro, que não explica nada, apenas sai pela tangente. A nota diz
que ele se reuniu com o presidente do Banco Central e outros dirigentes de
bancos para tratar da Lei Magnitsky, da qual Moraes deixou de ser alvo há
poucos dias. Nenhuma palavra sobre o Master.
O máximo que se tem é um advérbio: o ministro teria
tratado “exclusivamente” sobre as consequências da lei americana com os seus
interlocutores. A nota do BC, por sua vez, não traz o advérbio ao confirmar que
o banco manteve reuniões com o ministro para discutir os efeitos da Magnitsky.
Os telefonemas citados por Malu Gaspar foram ignorados por ambos os lados.
Compreende-se a dificuldade do casal Moraes: é mesmo
difícil encontrar explicação a respeito do que já veio à tona, afora aquela que
se encontra no campo do inadmissível.
A doutora Viviane Barci de Moraes vai dizer o quê?
Que o marido Alexandre não sabia do contrato espetacular firmado com o Banco
Master?
O ministro será capaz de afirmar que, ao pressionar
o presidente do Banco Central, ignorava que estava servindo aos interesses de
um cliente que vinha pagando uma fortuna à sua mulher?
Não há justificativa que possa cancelar a gravidade
da conduta de Alexandre de Moraes. Todo mundo está consciente disso,
principalmente os seus pares no STF. Se a história vier a morrer sem
consequência drástica, a democracia brasileira assinará o seu próprio atestado
de óbito.
Mario Sabino - Metrópoles

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