segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Opinião do Estadão: Ninguém leva a meta fiscal a sério

 


E ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, revelou que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva avalia retirar uma parte dos gastos com segurança pública do arcabouço fiscal. Segundo ele, o Executivo estuda dar à área o mesmo privilégio que o Congresso conferiu à Defesa e o governo sancionou, ao permitir que R$ 30 bilhões em despesas para modernização das Forças Armadas sejam excluídos do limite de gastos e da meta fiscal nos próximos seis anos. Uma alternativa, de acordo com o ministro, seria fixar na Constituição um valor mínimo de gastos com segurança pública, a exemplo dos pisos da Saúde e da Educação, vinculados às receitas. Ou seja, mais engessamento orçamentário.

De acordo com Lewandowski, o combate ao crime organizado requer um volume de recursos incompatível com as regras fiscais. “Não se resolve o problema sem investimento”, afirmou Lewandowski, em entrevista ao portal Jota. O presidente Lula, segundo o ministro, estaria “convencido” de que a segurança pública merece tratamento especial.

Graças à disputa política sobre o projeto de lei antifacção na Câmara e às trapalhadas do relator, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), as declarações de Lewandowski não receberam tanta atenção. Mas deveriam: impressiona a tranquilidade com que o ministro disse o que disse sem qualquer constrangimento, boicotando o arcabouço fiscal que foi elaborado e proposto pelo próprio governo Lula para substituir o teto de gastos.

Procurado para se manifestar sobre o posicionamento de Lewandowski, o Ministério da Fazenda, segundo o jornal O Globo, respondeu que “não houve discussão sobre o tema” até o momento, o que, na prática, não quer dizer rigorosamente nada. Logo se saberá se a equipe econômica foi realmente excluída desse debate ou se apenas quis manter as aparências enquanto o martelo não foi batido.

Este é o tipo de proposta que, convenhamos, é a cara do governo Lula. Diante de qualquer problema, a saída é sempre gastar mais, e muitas vezes nem importa exatamente a razão. Quando o gasto não cabe no Orçamento, em vez de remanejar recursos, apostar em planejamento e investir em boas políticas públicas, algo que dá trabalho e gera desgaste político, basta excluir a despesa das amarras fiscais.

Reportagem publicada pelo Estadão já mostrou que, de 2023 a 2026, ao menos R$ 387,8 bilhões em gastos não serão contabilizados na meta fiscal. Entre eles estão a recomposição do Orçamento por meio da emenda constitucional da transição, o calote dos precatórios na administração de Jair Bolsonaro, a ajuda ao setor cultural no pós-pandemia, o ressarcimento por descontos ilegais em aposentadorias e pensões e o apoio a exportadores prejudicados pelo tarifaço imposto pelos Estados Unidos, entre outros.

Como se vê, essa prática está longe de ser uma exceção ou mesmo uma novidade. Em seu segundo mandato, Lula dizia que investimento não era gasto e usou essa justificativa para excluir da meta os gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e das grandes estatais.

Sem respostas fáceis para a complexa crise na segurança pública – temática que deve dominar a disputa eleitoral de 2026 e na qual os petistas não costumam se sair bem –, não será surpresa alguma se Lula assumir o aumento dos gastos na área e sua exclusão da meta como solução.

A verdade é que, se dependesse apenas de Lula, todo e qualquer gasto ficaria fora das regras fiscais e o governo gastaria sem qualquer limite. O problema dessa tese é que ela ignora o fato de que os recursos públicos são finitos e que financiar o que falta não sai de graça. Ademais, despejar essa dinheirama na economia eleva a inflação – não por acaso acima do centro da meta – e requer juros elevados.

O resultado é um arcabouço fiscal que já não atinge seu principal objetivo, pois o cumprimento da meta é incapaz de conter o aumento da dívida pública. Meritórios ou injustificados, gastos são sempre gastos, e todos eles, sem exceção, deveriam ser contabilizados dentro das regras fiscais. Abrir exceções é o maior estímulo para que todas as áreas busquem obter o mesmo status. Se Lula não leva o dispositivo a sério, não serão os ministros que o farão.

Opinião do Estadão

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Zeza dos Teclados participa de apresentação com Zezo Potiguar após convite do ídolo

  O encontro entre Zeza dos Teclados e Zezo durante o FestBerro, em Tauá, viralizou nas redes após os dois cantarem juntos no palco. Zeza, n...