E ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, revelou
que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva avalia retirar uma parte dos gastos
com segurança pública do arcabouço fiscal. Segundo ele, o Executivo estuda dar
à área o mesmo privilégio que o Congresso conferiu à Defesa e o governo
sancionou, ao permitir que R$ 30 bilhões em despesas para modernização das
Forças Armadas sejam excluídos do limite de gastos e da meta fiscal nos
próximos seis anos. Uma alternativa, de acordo com o ministro, seria fixar na
Constituição um valor mínimo de gastos com segurança pública, a exemplo dos
pisos da Saúde e da Educação, vinculados às receitas. Ou seja, mais
engessamento orçamentário.
De acordo com Lewandowski, o combate ao crime
organizado requer um volume de recursos incompatível com as regras fiscais.
“Não se resolve o problema sem investimento”, afirmou Lewandowski, em
entrevista ao portal Jota. O presidente Lula, segundo o ministro, estaria
“convencido” de que a segurança pública merece tratamento especial.
Graças à disputa política sobre o projeto de lei antifacção
na Câmara e às trapalhadas do relator, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), as
declarações de Lewandowski não receberam tanta atenção. Mas deveriam:
impressiona a tranquilidade com que o ministro disse o que disse sem qualquer
constrangimento, boicotando o arcabouço fiscal que foi elaborado e proposto
pelo próprio governo Lula para substituir o teto de gastos.
Procurado para se manifestar sobre o posicionamento
de Lewandowski, o Ministério da Fazenda, segundo o jornal O Globo, respondeu
que “não houve discussão sobre o tema” até o momento, o que, na prática, não
quer dizer rigorosamente nada. Logo se saberá se a equipe econômica foi
realmente excluída desse debate ou se apenas quis manter as aparências enquanto
o martelo não foi batido.
Este é o tipo de proposta que, convenhamos, é a cara
do governo Lula. Diante de qualquer problema, a saída é sempre gastar mais, e
muitas vezes nem importa exatamente a razão. Quando o gasto não cabe no
Orçamento, em vez de remanejar recursos, apostar em planejamento e investir em
boas políticas públicas, algo que dá trabalho e gera desgaste político, basta
excluir a despesa das amarras fiscais.
Reportagem publicada pelo Estadão já
mostrou que, de 2023 a 2026, ao menos R$ 387,8 bilhões em gastos não serão
contabilizados na meta fiscal. Entre eles estão a recomposição do Orçamento por
meio da emenda constitucional da transição, o calote dos precatórios na
administração de Jair Bolsonaro, a ajuda ao setor cultural no pós-pandemia, o
ressarcimento por descontos ilegais em aposentadorias e pensões e o apoio a
exportadores prejudicados pelo tarifaço imposto pelos Estados Unidos, entre
outros.
Como se vê, essa prática está longe de ser uma
exceção ou mesmo uma novidade. Em seu segundo mandato, Lula dizia que
investimento não era gasto e usou essa justificativa para excluir da meta os
gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e das grandes estatais.
Sem respostas fáceis para a complexa crise na
segurança pública – temática que deve dominar a disputa eleitoral de 2026 e na
qual os petistas não costumam se sair bem –, não será surpresa alguma se Lula
assumir o aumento dos gastos na área e sua exclusão da meta como solução.
A verdade é que, se dependesse apenas de Lula, todo
e qualquer gasto ficaria fora das regras fiscais e o governo gastaria sem
qualquer limite. O problema dessa tese é que ela ignora o fato de que os
recursos públicos são finitos e que financiar o que falta não sai de graça.
Ademais, despejar essa dinheirama na economia eleva a inflação – não por acaso
acima do centro da meta – e requer juros elevados.
O resultado é um arcabouço fiscal que já não atinge
seu principal objetivo, pois o cumprimento da meta é incapaz de conter o
aumento da dívida pública. Meritórios ou injustificados, gastos são sempre
gastos, e todos eles, sem exceção, deveriam ser contabilizados dentro das
regras fiscais. Abrir exceções é o maior estímulo para que todas as áreas
busquem obter o mesmo status. Se Lula não leva o dispositivo a sério, não serão
os ministros que o farão.
Opinião do Estadão

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