A Confederação Brasileira dos Trabalhadores de Pesca
e Aquicultura (CBPA) não tem funcionário registrado e, mesmo assim, registrou
“aumento exponencial no número de filiados” após celebração de convênio com o
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A entidade, presidida pelo potiguar
Abraão Lincoln, é suspeita de realizar descontos indevidos na aposentadoria de
dezenas de milhares de segurados.
A informação consta em relatório da
Controladoria-Geral da União (CGU) utilizado para abertura de processo de
responsabilização contra a CBPA. O órgão entendeu que a entidade não tem
estrutura para atender ao contingente de filiados e, portanto, desconfia de
fraude.
Os detalhes do relatório foram divulgados pelo
colunista Tácio Lorran, do portal Metrópoles.
Essa mesma desconfiança já tinha sido apontada pela
Polícia Federal. A entidade não tinha um associado em 2022, quando firmou seu
acordo de cooperação técnica (ACT) com o INSS para efetuar descontos de
mensalidade sobre aposentadorias.
Um ano depois, já em 2023, o número chegou a mais de
340 mil associados, resultando em arrecadação anual de R$ 57,8 milhões. No
primeiro trimestre de 2024, auge da farra dos descontos indevidos, o número de
filiados chegou a 445 mil, e o faturamento bateu R$ 41,2 milhões no período.
“Em janeiro de 2024, a associação contava com
408.514 descontos associativos vigentes no INSS. Além do total de descontos,
chama a atenção o crescimento vertiginoso do volume de contribuições
associativas entre junho e julho de 2023. Em junho de 2023, do total de
descontos autorizados era de 34.964. Já em julho de 2023, esse total era de
222.511. Isto é, foram adicionados 187.547 descontos associativos”, escreveu a
CGU no relatório.
Dessa forma, o órgão suspeita que a confederação
tenha contratado uma empresa de telemarketing para buscar as filiações, o que é
vedado, conforme os termos do acordo de cooperação técnica (ACT) com o INSS.
“Considerando o mês com 22 dias úteis e 8 horas de
jornada de trabalho diário, a CBPA teria adicionado 8.524,86 descontos
associativos por dia útil, isto é, 17,76 descontos por minuto.”
Segundo relatório do Conselho de Controle de
Atividades Financeiras (Coaf), em 1 ano, a entidade de Abraão Lincoln
associativa transferiu cerca de R$ 5 milhões para a Prospect Consultoria e R$
1,7 milhão à Acca Consultoria, empresas pertencentes a Antônio Carlos Camilo
Antunes –conhecido como Careca do INSS. O empresário é apontado pelas
investigações como uma peça-chave do esquema de desvios no pagamento de
aposentadorias do INSS. As companhias seriam, segundo a PF, intermediárias no
organograma de fraudes.
A CBPA foi fundada no início de 2020. Afirma em seu
site que conta com mais de 1 milhão de filiados e que está presente em 21
Estados. O Coaf considerou a movimentação de R$ 100 milhões entre dezembro de
2023 e maio de 2025 “incompatível” com o patrimônio e a capacidade financeira
da confederação. Em uma perspectiva “macro”, o relatório fala em movimentações
“atípicas e suspeitas”.
Solto após fiança
Nesta terça-feira 4, Abraão Lincoln foi solto após
pagar fiança de R$ 5 mil. Ele havia sido preso horas antes, ainda na madrugada,
por determinação do presidente da CPMI do INSS, senador Carlos Viana
(Podemos-MG).
Abraão teria mentido ao afirmar que não conhecia o
tesoureiro da CBPA, Gabriel Negreiros, que é padrinho de um de seus netos. O
presidente da CPMI apresentou uma foto do batizado da criança e afirmou ainda
que Abraão depositou R$ 5 milhões em uma conta de Negreiros.
Após ser pressionado pelo deputado Alfredo Gaspar
(União-AL), Abraão Lincoln disse que se confundiu. “Eu quero pedir perdão,
porque, na minha ignorância, não disse, mas ele é meu compadre. Estou pedindo
desculpa, porque eu pensei que fosse questão de ser filho, algum parentesco
dessa natureza”, tentou se explicar Abraão, mas sem convencer os membros da
CPMI.
Solicitações de inclusão de descontos de pessoas
mortas
Ainda segundo o colunista do Metrópoles, a CGU
identificou que a entidade de Abraão Lincoln solicitou, mais de 40 mil vezes, a
inclusão de descontos em benefícios de pessoas mortas. “Em levantamento
realizado, identificou-se que, em ao menos 40.054 oportunidades, a entidade
tentou incluir descontos em benefícios que, no momento da solicitação, já
estavam encerrados em decorrência do óbito do beneficiário.”
As regras do convênio estabeleciam que, em caso de
óbito, era obrigação da CBPA comunicar imediatamente o fato ao INSS e restituir
eventuais valores recebidos indevidamente. Nesse sentido, a CGU identificou a
tentativa de inclusão de desconto, pela CBPA, de uma filiada em dezembro de
2023. A mulher, no entanto, tinha falecido em 2016.

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