De um lado, o presidente Lula finalmente se
pronuncia verbalmente sobre a megaoperação que fulminou cerca de 120 homens no
Rio de Janeiro. Considerou uma “matança” e “desastrada”.
De outro, temos a mesma ação majoritariamente
aprovada pelos brasileiros. E com índices que se aproximam de 90% nos locais
mais afetados pelo tráfico, as favelas da capital fluminense. E, por fim, uma
imagem que vale por mil palavras.
No último domingo, ao comparecer à missa matinal, o
governador Cláudio Castro foi aplaudido de maneira veemente pelos fiéis – que
provavelmente não se lembraram do versículo de Mateus sobre amar até os
inimigos (5:44).
Se, em breve, os traficantes conseguirem se recompor
e voltar a dominar toda a região conflagrada no Rio, Lula pode até ter razão do
ponto de vista dos fatos. Teria sido uma matança inútil, que não abalou de
maneira profunda o comércio de venda de drogas na região, nem mesmo o controle
de território pelas facções. Isso logo saberemos.
Na prática, o que temos visto são os criminosos
seguirem a enfrentar o Estado depois dessas operações que deixam um rastro de
sangue nas ruas.
Também conta toda a ideologia do presidente Lula,
que não vê o criminoso como alguém apenas dotado de uma psicologia
intrinsicamente perversa. Mas uma espécie de vítima (nas palavras dele) de um
sistema muito maior, que envolve usuários dispostos a pagar uma fortuna pela
droga, uma polícia truculenta, uma sociedade desigual que o oprime e não lhe
oferece saídas. A visão clássica da esquerda sobre a bandidagem.
O que Lula pode não ter percebido (ou tem
consciência disso, mesmo assim enfrentou a opinião pública) é que os atos
policiais violentos no Rio de Janeiro são fortemente aprovados não pela sua
racionalidade, mas pelo grau de catarse envolvido. No sentido de que a
megaoperação ajudou a liberar uma série de emoções reprimidas por tantos.
A fúria descarregada sobre quem, em tese, ameaça a
nossa vida diariamente. O presidente, nas eleições, por causa de frases como a
de hoje, terá que dar explicações. Mais uma vez será acuado pelos adversários
como “protetor de bandidos”.
É ultrajante criminosos ocuparem territórios,
extorquirem moradores de comunidades pobres, imporem toques de recolher, lei do
silêncio. Uma espécie de regime totalitário dentro de tantas comunidades aceito
passivamente por parcela de extratos privilegiados da sociedade. Cria-se todo
um caldo que se desdobra em revolta surda por quem está envolvido ou se sente
acuado.
Aplaudir a matança, no final das contas, tem mais a
ver com o desespero de perceber todo esse absurdo ocorrer e finalmente o Estado
agir. Acordou e se moveu, executando, contra quem consideram bandidos.
Exaltar tantos assassinatos pode ser, ao mesmo
tempo, inaceitável do ponto de vista de preceitos éticos abstratos (um filósofo
como Kant ficaria horrorizado) e compreensível quando se leva em conta o mundo
real. É uma reação humana, demasiada humana. Contraditória, muitas vezes
inevitável, e necessariamente violenta.
Fabiano Lana - Estadão
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