O número de casos de câncer em pessoas de até 50
anos aumentou 284% no Brasil entre 2013 e 2024. Dados do painel DataSUS,
reunidos pelo g1, mostram que os diagnósticos passaram de 45.506 para 174.938
nesse período. Os tumores de mama, colorretal e fígado estão entre os que mais
crescem na faixa etária.
O câncer de mama lidera os registros, com alta de
45% desde 2013 e mais de 22 mil novos diagnósticos anuais de mulheres de até 50
anos no Sistema Único de Saúde (SUS). A maioria dos casos é identificada na
rede pública, que concentra os atendimentos de 75% da população.
Especialistas afirmam, porém, que o cenário pode ser
ainda mais grave. “Toda política de saúde depende de dados, e hoje eles são
frágeis”, diz Stephen Stefani, oncologista do grupo Oncoclínicas e da Americas
Health Foundation. “Na saúde suplementar, a notificação não é compulsória.
Então o país subestima a real dimensão do problema.”
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
informou que não é possível medir a incidência de câncer na rede privada, que
cobre cerca de 25% da população, porque uma decisão judicial de 2010 impede o
uso da Classificação Internacional de Doenças (CID) nas bases de dados das
operadoras. O Ministério da Saúde também não dispõe de números consolidados
sobre o sistema privado, apenas estimativas trienais.
Entre os tipos de câncer mais frequentes em adultos
de até 50 anos, o de mama soma 219.449 casos entre 2013 e 2024, seguido por
colo do útero (105.269), colorretal (45.706), estômago (38.574) e fígado
(26.080).
O câncer colorretal é um dos que mais crescem no
grupo. Os diagnósticos saltaram de 1.947 em 2013 para 5.064 em 2024 — alta de
160%. “É uma doença de estilo de vida. Só 5% dos casos são hereditários; mais
de 90% têm relação com alimentação, sedentarismo e obesidade”, explica Samuel
Aguiar, líder do Centro de Referência de Tumores Colorretais do A.C.Camargo
Cancer Center.
Segundo ele, o aumento ocorre entre gerações
expostas desde cedo a dietas industrializadas, excesso de gordura corporal e
pouca atividade física. “Muitos pacientes jovens são diagnosticados em estágios
avançados porque os sintomas são confundidos com hemorroidas ou alterações
intestinais leves. Falta cultura de prevenção nessa faixa etária”, afirma
Aguiar.
Os médicos também observam mudanças no perfil dos
pacientes. “Os pacientes chegam ao consultório jovens, ativos, cuidando dos
filhos, e de repente descobrem um câncer avançado. É um choque, não se viam no
grupo de risco”, relata Stefani.
A médica nuclear Sumara Abdo, do Instituto Nacional
do Câncer (INCA), diz que os protocolos de rastreamento não acompanham essa
mudança. “Os protocolos ainda são voltados para pessoas acima dos 50 anos. Já
temos evidências de que tumores como o de mama e o colorretal vêm aumentando
muito antes dessa idade”, afirma.
Entre as medidas preventivas, ela cita manter
alimentação rica em fibras, frutas e vegetais; reduzir o consumo de
ultraprocessados e álcool; praticar atividades físicas regularmente; e realizar
exames conforme orientação médica.
Mesmo com a ampliação da mamografia a partir dos 40
anos no SUS, anunciada em 2025, o sistema ainda enfrenta lentidão. “A demora
entre diagnóstico e início do tratamento segue um desafio. Muitos não começam
dentro dos 60 dias previstos por lei”, diz a oncologista Isabella Drummond,
integrante das sociedades Americana e Europeia de Oncologia.
Ela aponta que terapias baseadas em testes genéticos
e diagnóstico molecular avançam na rede privada, mas continuam inacessíveis à
maioria dos pacientes do SUS. “Sem políticas públicas de rastreamento e
diagnóstico molecular, a desigualdade em câncer só vai aumentar”, afirma.
O aumento dos casos em pessoas jovens é uma
tendência global. Um estudo publicado na revista Nature Medicine em
2022 mostra crescimento da incidência de câncer em menores de 50 anos em todos
os continentes, principalmente em países urbanizados. “O fenômeno é global, mas
no Brasil ele é agravado por desigualdade e diagnóstico tardio”, diz Stefani.
A publicação alerta que, sem políticas integradas de
prevenção e acesso, o Brasil pode seguir o padrão de países como Estados Unidos
e Reino Unido, onde os casos precoces já representam até 20% dos novos
diagnósticos anuais.
“O câncer diagnosticado cedo tem mais de 90% de
chance de cura”, reforça Isabella Drummond. “Mas para isso, o paciente precisa
ser ouvido e ter acesso rápido ao exame certo.”
*com informações do g1
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