Um relatório da Controladoria-Geral da União (CGU)
aponta que a União Brasileira dos Aposentados e Pensionistas (Unibap)
apresentou fichas de filiação com carteiras de habilitação vencidas para
justificar descontos indevidos em benefícios previdenciários de aposentados e
pensionistas.
Segundo o órgão, os documentos usados pela entidade
contêm indícios de “fraude, vício de consentimento ou uso indevido de dados
pessoais” para descontos indevidos. A defesa da entidade nega irregularidades e
diz que “jamais houve motivo para a associação desconfiar de falsidade” (leia
mais ao final da reportagem).
O suposto uso de CNHs vencidas foi uma das razões
para que a Controladoria decidisse abrir um Processo Administrativo de
Responsabilização contra a entidade, conforme mostrou a coluna no início
setembro.
A apuração que levou aos documentos teve origem em
um processo de fiscalização conduzido pelo INSS e analisado posteriormente pela
CGU. O procedimento foi aberto após um aumento expressivo de filiações e uma
série de reclamações de beneficiários que afirmaram não reconhecer os descontos
feitos em seus proventos.
Em dezembro de 2023, a Diretoria de Benefícios e
Relacionamento com o Cidadão (DIRBEN) solicitou à Unibap a apresentação de 86
fichas de filiação, a fim de verificar a regularidade das autorizações de
desconto de mensalidades associativas.
A medida foi tomada após o registro de 97
reclamações na plataforma Fala.BR e 559 no site Reclame Aqui — muitas delas
denunciando descontos não autorizados. De acordo com o relatório, em 30 dos 97
casos analisados no Fala.BR, os aposentados responderam “não” à pergunta sobre
se haviam autorizado os descontos.
Além disso, o sistema do INSS identificou mais de 8
mil pedidos de exclusão de mensalidades associativas supostamente não
consentidas.
Após ser notificada, a Unibap apresentou defesa e
encaminhou as fichas solicitadas e o processo foi arquivado com o endosso do
então diretor de benefícios do órgão André Fidélis que está atualmente sob
suspeita da Polícia Federal (PF) por suposto envolvimento na “farra do INSS”,
revelada pelo Metrópoles.
No entanto, a análise da CGU constatou que diversas
fichas continham CNHs vencidas, algumas expiradas desde 2019, embora as
supostas adesões tenham ocorrido somente a partir de 2021.
“Constatou-se a recorrente apresentação de fichas de
filiação contendo, como documento de identificação, Carteiras Nacionais de
Habilitação (CNHs) com validade expirada. Em diversos casos, tais documentos
encontravam-se vencidos desde o ano de 2019, ao passo que as supostas datas de
filiação ocorreram ao menos a partir de 2021, ou seja, com um lapso temporal
superior a dois anos entre o vencimento do documento e o ato de filiação”, diz
o documento.
Para o órgão de controle, isso levantou indícios de
que a entidade de maneira sistemática e reiterada autorizações de descontos
contendo “elementos de inidoneidade material”.
Um dos exemplos citados mostra que um beneficiário
teria sido filiado em 14 de junho de 2022, com o primeiro desconto efetuado em
julho. Menos de 30 dias depois, o aposentado registrou reclamação no Fala.BR
alegando não ter autorizado o vínculo — situação considerada incompatível com
uma “filiação voluntária”.
“Sob a ótica do cidadão médio, não é crível que um
filiado espontâneo questione sua própria adesão em prazo tão curto. Tal fato
indica fortes indícios de fraude, vício de consentimento ou uso indevido de
dados pessoais para descontos indevidos”, ressalta.
O relatório ressalta ainda que, no contexto da
Operação Sem Desconto, que apura o suposto esquema de descontos irregulares de
aposentados do INSS, o uso de documentos antigos e vencidos, associado às
negativas espontâneas dos associados reforça a suspeita de autorizações
fraudulentas.
“Tal cenário indica, com razoável grau de
probabilidade, a possível obtenção ilícita de dados pessoais e o preenchimento
fraudulento das fichas de filiação, comprometendo a legalidade, a veracidade e
a integridade dos documentos apresentados”, conclui a CGU.
Defesa
A coluna entrou em contato com a defesa da Unibap,
que disse se percebe uma “politização” de um procedimento investigativo por
parte da CGU, “onde restou inviabilizada a defesa da associação sob argumento
de sigilo das investigações”.
O advogado Daniel Gerber afirma que o órgão
“distorce a relação da associação com o próprio INSS, pois esta autarquia
fiscalizou diretamente a associação e, inclusive, destacou que era uma das
únicas que estava em ordem, com crescimento orgânico e adequado ao tempo de
existência, sede etc”, afirma.
O advogado ressalta, por fim, que a entidade “sempre
manteve uma política de minimização de problemas aos seus associados, eis que
não era ela a responsável pelo procedimento de adesão”. Tal tarefa, segundo
ele, era realizada por correspondentes bancários que atuam nacionalmente não
apenas para a associação, mas para bancos, seguradoras, dentre outras
instituições.
“Em síntese, jamais houve motivo para a associação
desconfiar de falsidade, mas sempre que acionada por qualquer um dos seus
canais, resolvia imediatamente a reclamação de seus associados; jamais houve,
também, ausência de respostas às entidades investigativas, ainda que seja
insista em dizer ao contrário. Todo o legado aqui encontra supedâneo em
petições devidamente protocoladas perante os órgãos competentes, assim com
despachos dos próprios órgãos”, concluiu.
Fábio Serapião - Metrópoles
Nenhum comentário:
Postar um comentário