O Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do
Norte determinou nesta semana uma série de medidas que buscam evitar um quadro
de "falência" do sistema do pagamento de aposentadorias de servidores
estaduais.
Segundo o órgão, o déficit atuarial do Regime
Próprio de Previdência Social (RPPS) do RN atingiu a marca de R$ 54,3 bilhões.
O valor representa a diferença entre o que o Estado tem de recursos e o deveria
ter para pagar em aposentadorias e pensões no futuro.
De acordo com o tribunal, os dados apontam que não
haverá dinheiro suficiente para honrar todos os compromissos.
Os conselheiros também constataram o saque irregular
de dinheiro do fundo previdenciário para cobrir o pagamento de aposentadorias
atuais. O recursos deveria ser utilizado para garantir pagamentos futuros.
Determinações
Diante da gravidade do quadro, os conselheiros
determinaram que o Instituto de Previdência do Estado (Ipern) deixe de realizar
novos saques das aplicações financeiras do Fundo Previdenciário e elabore,
junto com o Governo do Estado, um plano de ação com medidas para o reequilíbrio
das contas, a ser apresentado no prazo de 60 dias úteis.
Procurados pela Inter TV Cabugi, o governo e o Ipern
informaram que não vão se pronunciar enquanto não foram notificados da decisão.
O plano de ação deve mostrar de forma clara como
será feito o ajuste das contas da Previdência, reduzindo o déficit financeiro e
equilibrando os recursos existentes com as despesas futuras de aposentadorias e
pensões.
As medidas precisam incluir um novo estudo atuarial,
a elaboração de um projeto de lei a ser enviado à Assembleia Legislativa e a
criação de estratégias que garantam a formação de reservas financeiras
suficientes para sustentar os pagamentos no longo prazo.
As determinações foram impostas dentro do processo
nº 3136/2024-TC, durante julgamento na quarta-feira (17). Os conselheiros
aprovaram à unanimidade o voto-vista relatado pelo conselheiro Antonio Ed Souza
Santana.
Déficit triplicou em 10 anos
Segundo o voto apresentado pelo conselheiro Ed
Santana, os dados demonstram um crescimento exponencial do déficit. A projeção
leva em consideração o total de obrigações previdenciárias do Estado com os
servidores públicos estaduais e os ativos disponíveis no Fundo Previdenciário,
que correspondiam, ao final de 2023, a apenas R$ 142 milhões, o equivalente a
0,29% dos compromissos previdenciários totais.
Em 2024, o saldo negativo nas contas da Previdência
chegou a R$ 1,83 bilhão — o que corresponde a mais de 10% de toda a receita do
Estado. Dez anos antes, esse valor era de R$ 543 milhões. Ou seja, o déficit
anual mais que triplicou no período.
Ainda conforme o voto, o agravamento do quadro está
relacionado à extinção do Fundo Previdenciário, com a transferência de seus
recursos para o fundo financeiro, sem a devolução das reservas sacadas nem a
devida compensação atuarial.
Como consequência, o patrimônio acumulado foi
rapidamente exaurido, o que compromete a sustentabilidade do regime, baseado em
repartição simples, sem reservas garantidoras suficientes.
Uso indevido de recursos
Segundo a representação que originou o processo,
produzida pela Diretoria de Controle de Pessoal (DCP), o Ipern vinha usando,
desde 2023, os rendimentos e até parte dos recursos aplicados em fundos de
investimento para bancar o pagamento mensal de aposentados e pensionistas.
O uso seria irregular porque os recursos do fundo
deveriam ser acumulados e aplicados (investidos) para garantir pagamento de
aposentadorias futuras. A ideia é que o retorno dos investimentos fosse
utilizado para pagar as aposentadorias futuramente. Esses recursos são chamados
de ativos garantidores.
"A utilização precoce dos recursos
previdenciários para cobertura da insuficiência financeira do RPPS prejudica a
finalidade pela qual foi instituído o plano, inviabilizando a constituição dos
pretendidos ativos garantidores, oferecendo assim, elevado risco à sustentabilidade
fiscal dos entes patrocinadores, com consequências diretas no equilíbrio das
contas públicas, pois serão necessários maiores esforços no futuro para
formação de ativos garantidores não constituídos, especialmente diante de um
cenário de despesas previdenciárias crescentes", diz o parecer da equipe
de fiscalização do TCE.
“O risco não é apenas o colapso das contas públicas,
mas também a perda de credibilidade fiscal e de capacidade de investimento do
Estado”, alertou o conselheiro Antonio Ed Souza Santana.
Além das medidas já citadas, o TCE também determinou
que o Estado cubra com recursos próprios eventuais insuficiências para
pagamento de benefícios; preveja, nos próximos orçamentos, valores suficientes
para honrar os compromissos; e se abstenha de utilizar os recursos
previdenciários de forma incompatível com sua finalidade original.
Risco de perder recursos federais
O TCE também alertou para outro problema grave: a
possibilidade de o Estado perder o Certificado de Regularidade Previdenciária
(CRP), exigido pelo governo federal para transferências voluntárias e
contratação de empréstimos.
Somente entre 2023 e 2024, o Rio Grande do Norte
recebeu mais de R$ 400 milhões em recursos que dependiam desse certificado. Se
o CRP for suspenso, esses repasses ficam bloqueados.
O conselheiro acrescentou que, no último dia 7 de
agosto de 2025, transitou em julgado a decisão do STF que legitimou a
possibilidade de imposição de sanções pela União aos entes federativos que
descumprirem as normas gerais de organização e funcionamento dos regimes
próprios de previdência social.
Decisões
As principais determinações aprovadas pelo Tribunal
de Contas do Estado são:
- Ao
Ipern: Deve deixar de utilizar
recursos aplicados em investimentos de médio e longo prazo, assim como
seus rendimentos, para cobrir o déficit mensal da previdência. O
descumprimento resultará em multa de R$ 10 mil por ocorrência.
- Ao
Governo do Estado: Tem a obrigação de
garantir, com recursos do Tesouro Estadual, a cobertura completa do regime
próprio de previdência sempre que as contribuições normais e
extraordinárias não forem suficientes para o pagamento dos benefícios. O
não cumprimento também acarretará multa de R$ 10 mil por ato.
- Ao
Governo do Estado e Ipern: Devem apresentar,
em até 60 dias úteis, um plano de ação com medidas para amortizar o
déficit atuarial e reequilibrar a relação entre as reservas disponíveis e
os benefícios concedidos. O plano deve incluir:
- Estudo atuarial atualizado
- Proposta de projeto de lei a ser enviada à Assembleia Legislativa
- Estratégias de capitalização de reservas
As estratégias contemplam a destinação de imóveis
para o fundo, implantação de contribuições e aportes suplementares, instituição
de nova segregação de massas, além de outras alternativas previstas na
legislação. Embora o plano deva ser entregue em 60 dias, as medidas nele
previstas têm até 35 anos para serem concretizadas.
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